Coragem de ser Candy Darling

Coragem de ser Candy Darling
Filme lembra história da transexual protegida de Warhol e reflete sobre veneração de estrelas
Stephen Holden, do The New York Times - O Estado de S.Paulo

candy_darling

Beautiful Darling, um comovente documentário biográfico dirigido por James Rasin sobre Candy Darling, a "superstar" transexual de Andy Warhol, é uma reflexão triste sobre a veneração insana de estrelas de cinema. Jeremiah Newton, que é um produtor do filme e narra a história, foi o amigo mais próximo e antigo colega de quarto de Candy Darling, que o nomeou guardião de seu legado após sua morte, ocorrida em 1974, de câncer, aos 29 anos.


1º mai. / 2011 - Sua reverência a Candy, que apareceu em alguns filmes de Warhol e inspirou canções de Lou Reed, não é diferente de adoração adolescente dela por Kim Novak. Quando Candy Darling ainda era um rapaz chamado James L. Slattery, experimentando o transformismo enquanto crescia em Long Island, ele pediu pelo correio uma foto autografada de Novak. O dia em que a foto chegou foi um dos momentos mais importantes de sua vida, recorda um conhecido.

Vestido como Candy Darling, Slattery não só se parecia com seu ídolo como também imitava seu estilo lânguido e sua voz sensual. Algumas das imagens mais memoráveis do filme são as de Candy representando cenas de filmes de Kim Novak, fazendo as mesmas poses que a atriz.

A contrário de Candy, Jeremiah Newton não quis ser seu próprio objeto de adoração. Ele a admira como um fenômeno, e quando a discute, seu tom é ternamente reverente. Porque ela teve uma vida dura. Uma pária no colegial, rejeitada pelo pai homofóbico, Candy, mesmo no auge da "fama", dormia nos sofás das pessoas.

A narradora da verdade real do filme, a escritora Fran Lebowitz, que passou algum tempo na órbita de Warhol, recorda a era sombria quando se travestir de mulher em NY era contra a lei.

Nos tempos do desenvolvimento de Slattery, recorda Lebowitz, espojar-se em imagens de deuses e deusas intocáveis de revistas de cinema era uma fuga irresistível da rejeição e do escárnio da sociedade heterossexual.

Mesmo depois de se tornar uma "celebutante" (a famosa por ser famosa, no neologismo americano) Candy Darling, que tomava hormônios femininos, resistiu a fazer a cirurgia de mudança de gênero. "Não sou uma mulher genuína. Estou interessada em ser o produto de uma mulher."

Candy, que ingenuamente via Warhol como seu protetor, ficou amargamente desapontada quando ele perdeu interesse em seu triunvirato de "superstars" travestidas, que também incluía Holly Woodlawn e Jackie Curtis.

Beautiful Darling inclui breves excertos de vários filmes de Warhol em que Candy aparecia, além de fragmentos de suas aparições em pequenos teatros experimentais. Seu melhor papel no cinema, em que ela interpreta um talento nascente para a comédia satírica, foi uma versão dela mesma na paródia feminista de Paul Morrissey-Warhol, Women in Revolt. O mais perto que ela chegou do sucesso no show biz convencional foi no início dos anos 1970 na peça de Tennessee Williams Small Craft Warnings, no papel de Violet. Isso não deu em nada.

Excertos do diário de Candy, lidos por Chloë Sevigny, revelam um trágico autoconhecimento que empresta a seu narcisismo uma profunda pungência. "Sinto como se estivesse numa prisão", ela escreveu, depois citou coisas que não podia fazer como nadar, visitar parentes, conseguir um emprego e ter um namorado. Sua vida sexual é motivo de especulações. Houve admiradores, mas até onde esses romances foram não é abordado.

A coragem que foi preciso para ser Candy Darling é ilustrada pelo que ela diz perto do fim do diário lido por Chloë: "Não deixarei de ser eu mesma por causa dos tolos, que fazem julgamentos duros sobre mim. É preciso ser quem se é, seja qual for o preço. É a forma mais alta de moralidade." / TRADUÇÃO DE CELSO PACIORNIK


?


Tópicos: , Cultura, Versão impressa