Tom Zé vá tomar no monossílabo!

Tom Zé
Tom Zé fotografado por Cirillo Charros em 2007


Crônica - Sábado, 06/12/2008

Souvesman começa a arrumar o AP e espirra por conta de sua rinite alérgica. Coloca sua cerveja barata para gelar e volta ao rito de limpeza. Bota um som no computer, começa a cantarolar eu sou o primeiro e como sempre estou inteiro, se a polícia chegar jogo tudo no banheiro, inspirado vai para o banheiro. De calças baixas lembra e vai até a sala acender o incenso Aroma da Floresta, tem preferência pelo de acácias, porém o outro é mais forte e abrangente. Volta ao banheiro e o telefone toca, percebe a tempo que tem de pegar um rolo de papel.

E aê Souves, vamos tomar todas na casa do Dudu!

E aê Dean, está onde?

No pistão norte, chego lá daqui a pouco.

Porra, e depois? Ainda vou cortar o cabelo e almoçar, acho que não dará tempo, o Dudu vai para Orizona City com esposa e The Boys.

Então quando chegar em Taguá York City dê o papo.

Podes crer, vou ligar.

A música do Plantet Hemp continua e Souvesman nota que o incenso queimou bem pouco, volta ao banheiro com apetrechos e rolo de 60m de papel. O CD é bom, o papel higiênico é bom, a cerva está quase gelada e o isqueiro é aceso, ae Gushtavo tem gente dizendo ai que o Planet Hemp faish apologia àsh drogash, é mentira, tchu tchu, é mentira, então suinga suinga! O aroma da sala está legal, o ilegal saiu pela janela do banheiro. Termino a metade da faxina e vou cortar cabelo com o famoso e ótimo corte réco do exército, quatro em cima e um atrás, piada abjeta para os safados de plantão, porém, o cabeleireiro é muito sério, sem essa de viadagens caros leitores. Tudo preparado, rasgo para Taguá City, Dean e cônjuge estão na SHIS aguardando.

Hoje é aniversário do Dean!

Olha só, parabéns infame, lhe dei parabéns no orkut dia 04, o primeirão!

É eu vi, e ai, vamos tomar umas e ir no show mais tarde?

Não sei, não comprei ingresso e esgotou, vamos tomar umas ai. Tudo bem contigo Ângela?

Beleza, vocês tem de ir em Uruaçu nos visitar, nunca sai de Brasília.

Pois é, mas quando saio vou sempre lá, logo, não é falta de visita, é falta de viagem mesmo, viajar é muito longe, sacumé.

Fomos para o Plano Piloto e visitamos o teatro da Caixa Econômica Federal, no setor bancário sul, local do show de hoje, às 20:30. Exposição, mostra de fotos e pinturas, a lamentação de não ter uma cerva na mão, o ócio de que está passeando, Dean exalta:

Olha ai o nosso querido Tom Zé!

Oi minha gente, tudo bem? Tudo certo para o show mais tarde?

Acabou o ingresso Tom Zé, valeu a atenção.

Não, fiquem aqui que tem sim, se dirige a ruiva de cabelos curtos e sotaque gaúcho, vê para eles ai tá bom? Gente fica aqui que a gente da um jeito.

Valeu Tom Zé!

Na hora certa e no lugar, grande satisfação ser saudado por um gênio nacional, um artista de verdade, arte no que faz. Somos chamados para adentrar o teatro e assistimos palestra de 50 minutos com o super artista, Tom Zé fala sobre a necessidade da idéia como matéria prima da criação, anotar as idéias, não duvidar da idéia, tentar e notar se vale a pena: os americanos e europeus são mais evoluídos pois contam com capital para bancar uma idéia, aqui temos de lutar para que seja reconhecida e usada, não querem mudança, querem as idéias de fora, vocês candangos... As idéias e verborragia fluem, Tom Zé não é só músico, é amplo, nas palavras de Marcelus Manolo para quem é raso o Tom Zé é um oceano. Termina a palestra, saímos e junto está o Maldito Popular Brasiliense Gerson de Veras, cumprimento o cara e vou na cola do ingresso, Tom Zé me convenceu a assistir o show. Compro uma cortesia, sobrou cortesia e não ingresso para o público, casa cheia nos três dias é ótimo para o artista, mas talvez ele já estivesse preparado para meia casa, afinal, sem mídia e publicidade vasta, nada é garantido, parabéns aos fãs de Mr. Zé, mais brasileiro impossível. Valeu Tom Zé, valeu mulher de cabelo vermelho e sotaque gaúcho.

Sem rumo, começo a preparação, bolar é um trabalho de paciência, Dean é mestre na arte, mas está dirigindo, com hombridade e lentidão bolo o finão, eixo sul, eixo norte, eixo monumental, início da L2 sul, 403 sul, sentamos no bar da esquina, brahmas extra please! Bate papo geral, faço breve relato sobre a desavença de Tom Zé e Caetano Veloso, à volta sob a benção de David Byrne, falta de consideração do público, em vez de notarem a arte notam um palhaço, velho louco, lama. Cinco garrafas depois vamos até ao ex-lar de Dean, casamento, cidade natal, esposa afinada com o jeito do maridão, harmonia exposta. Bebo mais, converso mais, faço outros finos, aviso que chegou a hora.

Chegamos com 10 minutos de atraso e fico em pé, eles me localizam e acenam, quase caio no escuro. Tom Zé e banda avisam: a cognição começará a ser trabalhada. Didaticamente explica o contexto de cada canção, humildade de artista, em vez de estrangeiros do tipo Bob Fucking Dylan que manifesta desapreço pelo público, nosso Tom Zé tenta ser entendido e saudado em vida, a necrofilia da arte não é interessante. As duas canções antigas manifesta “agora é uma velha”. Teoriza, critica, faz jingle... nessa hora Dean manifesta murrinha da porra, o véi não vai sortear nenhum... aquilo foi como uma volta à realidade que vivemos, o artista prepara toda um estado de atenção e espírito e outro lamenta a falta do brinde... com um certo descontrole de risadas, o casal ao lado se incomodou, continuei rindo e Dean calma Mario Pacheco, o casal não conhecem nenhuma música, antes tarde do que nunca, penso.

Banquinho no centro do palco, luzes apagadas, um braço de violão fincado serve de suposta penteadeira e espelho, de forma teatral Mr. Zé canta de forma intimista Brigite Bardot, música que inspirou um certo Marcelo Rubens Paiva a sentir maior liberdade na composição, músicas abrobrinhescas, porém, legais, registrado em seu famoso Feliz Ano Velho; o público fica rindo ao invés de notar a teatralidade e boa música, penso que talvez seja mais cômodo rir, esse Tom Zé é doido né?!, diz o cara em frente, sorriem do suposto palhaço no palco. O cantor continua, será que algum rapaz de vinte anos vai telefonar na hora exata em que ela estiver com vontade de se suicidaAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAHHHHHHHHHHHHHHHHH, toda a banda grita e as luzes se acendem geral, os risonhos se assustam, Dean pergunta onde está Mário Pacheco? Realmente ele perdeu, talvez prefira os locais ermos e públicos menores.

Ao fim, fico na rodoviária, espero uma hora pelo ônibus e chego debaixo de chuva... ainda assim, o show valeu a pena, não foi um simples show, foi uma experiência de vida. Imagino o porre que deva ser o show da banda inglesa Oasis, sem nenhuma interação com a platéia, escárnio, desapreço pela platéia, pose de macho mal educado... nosso nacional artista se importa e exige interação, afinal já faz muito tempo que a burrice está na mesa em vários sabores. Vida longa a esse senhor de 72 anos.

Rodrigo Souves

 

Nota: Rodrigo Souves, merece um analista e às vezes escreve essas coisas desarrumadas....