HENDRIX: A HISTÓRIA DA VIDA!

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Hendrix deixou mais de mil horas gravadas com suas músicas. Temendo o roubo dessas preciosas fitas, após a sua morte elas foram trsnferidas para um lugar seguro, à prova de pirataria. Muito som ainda vai rolar... 

Uma história da vida de Jimi Hendrix
(Mário Pazcheco)

 Além de atordoar as platéias, Hendrix parecia cada vez mais atordoado pelo mundo absurdo em que se locomovia. Excursionando pela Suécia, em janeiro de 1968, Hendrix brigou com os companheiros do Experience, particularmente Noel Redding, quebrando todo o quarto do Hotel Opelan, em Gotemburgo e o caso foi parar na polícia. No dia 4 de janeiro, noticiou-se que ele havia sido detido pela polícia por 12 horas, depois de “danificar seu quarto de hotel”. Fotografias mostravam Jimi de cabeça abaixada, escoltado por dois policiais. Seu passaporte foi apreendido e Jimi passou a noite na cadeia. Mencionou-se que ele estava bêbado. Quando acordou, Jimi se desculpou e para aliviar a barra, concordou em pagar os estragos ($475 libras). Os jornais diziam que ele “estava tocando bateria no quarto, e então quebrou as janelas, espelhos e cadeiras”. Durante a noite, hóspedes e funcionários do hotel ouviram gritos vindos do seu quarto. A polícia afirma que só prendeu Hendrix depois que três de seus colegas tentaram acalmá-lo.
 Quando Chas Chandler foi vê-lo na cadeia, Jimi contou-lhe que não se lembrava de nada do que havia acontecido. Ele foi solto, mas teve de pagar uma multa: o total de seus ganhos na turnê sueca.
 Outros incidentes se seguiram: um distúrbio feio durante sua apresentação em Cleveland, em nova turnê americana; o rompimento com Chas Chandler após desentendimentos durante a gravação do álbum duplo Eletric Ladyland; uma apresentação infeliz no Albert Hall de Londres, no começo de 1969; a ruptura do Jimi Hendrix Experience, que se despediu numa excursão americana em março de 1969.
 E a detenção de Hendrix no aeroporto internacional de Toronto, Canadá em maio de 1969. Acusado de porte de drogas. Jimi alegou que o pacote de heroína fora na verdade plantado em sua mala pela própria polícia para permitir um flagrante. Os canadenses estariam querendo usá-lo como um exemplo para afugentar os hippies e desertores americanos que atravessavam a fronteira em número cada vez maior. Ele foi solto sob uma fiança de 10.000 dólares, ainda em tempo para o concerto no Maple Leaf Garden. O processo se estendeu até 15 de dezembro. Depois de oito horas e meia de reunião, o tribunal do júri declarou-o inocente da posse de haxixe e heroína.

 “Foi o melhor presente de Natal que Toronto podia ter-me dado”, declarou Hendrix.
Depois de sua apresentação em Woodstock, Hendrix se recolheu à sombra, o músico mais revolucionário de seu tempo, o reinventor da guitarra elétrica, mostrou a toda uma geração as novas possibilidades de seu instrumento, Hendrix foi o artista que mais brilhou em Woodstock. Na verdade sua carreira estava intimamente ligada aos festivais de rock: foi introduzido ao público americano em 1967, em Monterey, e sua última apresentação pública também seria num festival...
A 28 de janeiro de 1970, acontecia no Madison Square Garden, em Nova York, um dos maiores concertos já organizados em prol da paz no Vietnã, O Festival do Inverno para a Paz. Teve sete horas e meia de duração. O baterista, Mitch Mitchell e o baixista Noel Redding, estavam no backstage porque participariam do fim do show fazendo uma jam com a Band of Gypsies, grupo que sucedeu o Experience. Michael Jeffrey, empresário de Hendrix, deu-lhe um ácido, pensando que isso levantaria o astral de Jimi e faria com que o show saísse melhor. Mas o resultado foi o contrário e Jimi pirou em pleno palco, dizendo pra uma garota na platéia: “Você está menstruada? Eu posso ver através das suas bermudas”. O choque de ter dito isso fez com que Hendrix se tocasse. Depois o guitarrista ainda no palco acrescentou: “Nós não estamos legais” e abandonou o palco no meio da segunda música. Hendrix foi o mais ovacionado apesar do curto set. Outros que se apresentaram: Blood, Sweat & Tears, Harry Belafonte, The Rascals e Peter, Paul & Mary.
Na edição do Festival de Wight, em 30 de agosto, Jimi Hendrix voou de Nova York para Londres,  para tomar parte. Jimi sentia que ele e Billy Cox não se entendiam e Buddy Miles o baterista, por sua performance não estar à altura do grupo, foi substituído com o retorno de Mitch Mitchell, o baterista original do Experience. Sob o manto sagrado de um gigantesco pôster de pano com a cara de Jim Morrison, além de abrigar a derradeira e lendária apresentação sua em festivais, Jimi Hendrix, embora não estivesse no melhor de sua forma, proporcionou ao público um pouco da velha chama. “Estava morto de medo, pensei que ninguém mais se lembrava de mim. Me senti abandonado e solitário no palco, por uns instantes. De repente, eles começaram a gritar Purple Haze, Foxy Lady, uma porção de músicas que eu pensava esquecidas. Me senti em casa”. Sua performance foi alegre, mas serena.
“Na minha viagem pude inicialmente constatar a briga milenar do artista com o instrumento – da Grécia à Wight. Desde as primeiras notas notei, era uma guitarra nova, vermelha, que coincidia com a vestimenta de triângulos verdes e vermelhos que usava na ocasião. Senti que ele não estava satisfeito com o aparelho. Chamou alguém e sem parar de tocar, cochichou no ouvido. Certifiquei-me de que, como intuíra mandou apanhar sua ‘Fender’ branca de 12 cordas. Trouxeram. Sem interromper o número, trocou, tocou o instrumento mais à vontade”. Rogério Sganzerla.
O público aplaudiu com entusiasmo, mas sem delírio. A era louca do rock estava terminada, a ilha de Wight era um de seus capítulos finais. Jimi intuía isso, sonhava o futuro ao lado dos sons progressivos que chegavam.
No último ano e meio de vida Hendrix se achava insatisfeito. Sentia-se prisioneiro de sua imagem, de seus empresários e do próprio som que o havia lançado para a fama. A fórmula comercial fora tão bem sucedida que os empresários proibiam qualquer modificação.
Ed Chalpin, foi o primeiro agente de Jimi ainda nos Estados Unidos, e quando Hendrix morreu, Ed Chalpin havia lançado e relançado 14 discos onde Jimi Hendrix atuava como acompanhante de um obscuro cantor, Curtis Knight, e recebia 2% do dinheiro arrecadado pelos três primeiros discos do Experience (Are You Experienced?, Axis: Bold As Love e Eletric Ladyland) e todos os lucros de Band of Gypsies. Para que se tenha uma idéia das ações de Ed Chalpin, basta citar que, em 1969, o empresário Michael Jeffrey fez com Hendrix assinasse um papel isentando-o e indenizando-o por todos os futuros processos que o guitarrista pudesse sofrer na Grã-Bretanha. Em outro contrato de edição assinado em 1966, Jimi ganharia um dólar por cada obra musical sua editada. E um mês após o lançamento do disco, Are You Experienced?, a estréia do Experience, o contrato estava em pleno vigor. Contratos leoninos que Jimi jamais tivera o cuidado de ler e agora, virtualmente, roubavam seu dinheiro.
Para completar, a Yameta Trust Co., firma que se acreditava ter sido criada por Jeffrey, (morto em 1973), para controlar todos os direitos em discos de Jimi, era fachada de algo muito maior e nunca se soube o que havia por trás de tudo, tendo sido especulado até uma conexão com a máfia.
Em Londres, hospedou-se numa luxuosa suíte no Cumberland Hotel, mas passava a maior parte do tempo no apartamento de sua namorada. Na tarde do dia 15 de setembro, Jimi deveria ir a uma reunião importante na sede da gravadora Polydor; em questão, antigos contratos que ainda o prendiam a Curtis Knight, um acordo mal negociado com a Track que lhe dava uma percentagem baixíssima de royalties e os detalhes do lançamento de "First Rays of the New Rising Sun", que Jimi tinha adiado pela terceira vez. Jimi não compareceu.
Na noite de 16 de setembro, saiu como Monika e Devon – que estava na cidade enquanto Jagger e os Stones tocavam na Alemanha -–e foi ver Eric Burdon, ex-vocalista dos Animals, com sua nova banda, War. No final do show no Ronnie Scott´s Jazz Club, não resistiu; subiu ao palco e tocou o blues Mother Earth,  um clássico de Memphis Slim:
Não importa quão grande você seja / Não importa o quanto você valha / No fim você volta para a Mãe Terra
Depois, foram todos para a casa de um amigo, encontrar-se com Alan Douglas. Jimi não queria mais trabalhar como Mike Jeffrey e estava descontente, também, com as pressões da gravadora. Alan seria seu novo representante. Jimi assinara um contrato particular com ele, faltavam agora os detalhes finais e o desligamento do escritório de Jeffrey. Ficou acertado que Alan iria no dia seguinte para Nova York tratar disso. Monika voltou para casa. Jimi dormiu com Devon e uma amiga, Stella.
Sentia-se quase feliz, aliviado. E ansioso também. Prometeu a si mesmo não participar tão cedo de reunião alguma de negócios.
Durante todo o dia 17, Jimi e Monika conversaram. Ou melhor, Jimi tagarelou sem parar com Monika, no apartamento dela, em Notting Hill Gate. Parecia ansioso, como quem quer contar muitos planos e segredos mas não tem tempo suficiente. Desenhou nove números nove e explicou que aquele era o Grande Eixo do Universo: sete planetas e dois astros luminosos, lua e sol; nove consciências, do nove para o Universo. Desenhou também uma cruz sobre o planeta Terra e em cada braço da cruz, dois rostos representando o bem e o mal nas quatro raças, branca, negra, amarela e vermelha. Disse a Monika que jamais esquecesse tudo aquilo, mesmo que não entendesse imediatamente o que queria dizer, e que passasse a limpo seus desenhos em quadros bem acabados. Monika era artista gráfica.
À noite, Jimi foi com Devon a rainha das primeiras groupies americanas que com fidelidade de dia e noite atrás dele, supervisionava as sessões de estúdio, cuidando para que nunca faltasse haxixe e pó do bom, ácido do melhor e sua amiga, Stella, a um jantar oferecido por um ricaço. Jimi experimentou um pouco de ácido sunshine, puríssimo, e continuou a falar a noite inteira.
Confessou à Devon, que estava cansando de ácido, cores excessivas, sons excessivos.
Nas primeiras horas daquela sexta-feira dia 18, Jimi Hendrix retornou para o apartamento de Monika Dannemann. Haveria um julgamento de tarde, uma da muitas pendengas legais que assombravam Jimi desde 1968. Ele não queria ir. Queria dormir. – Quanto?, perguntou Monika. O dia todo, e o outro dia também. Dormir e ir embora domingo para Nova York, onde sua Eletric Lady o esperava . Lá come um sanduíche de atum que ela lhe prepara, bebe vinho branco, escreve um poema, e  toma um remédio alemão para dormir, Vesparax, numa dose normal de meia drágea. Monika entrou e o viu remexendo no vidro de pílulas para dormir. “Estou só contando quantas tem”, ele disse. Não conseguia dormir sem elas. Aliás, mesmo com elas, era difícil, e tomou umas quatro extrafortes. Monika dormiu. A luz branca do dia varre o quarto devagar. Os ruídos da manhã. Mais cinco pílulas. Esperar o sono, ao lado de Monika. A luz clara do sol. Monika saiu deixando Jimi dormindo para ir comprar cigarros. Ao voltar meia hora depois, encontra uma “estranha atmosfera de calma” que reinava no quarto, onde a luz estava acesa, apesar de ser dez e meia da manhã. “Tudo estava tão... imóvel. De dia, a luz da lâmpada dava a tudo uma cor irreal. Achei estranho como isso não tinha incomodado Jimi. Ele não vinha dormindo bem”. Monika achou-o muito mal, imóvel na cama, de bruços, exatamente na posição em que adormecera, há quatro horas atrás. “Quando eu saí para comprar cigarros quis acordá-lo pra avisar, mas ele dormia profundamente, respirava bem e tinha uma temperatura normal. Mas quando eu voltei e fui apagar a lâmpada de cabeceira, notei que seu rosto estava arroxeado, os lábios abertos. E havia vômito no nariz e na boca”. Apavorada tentou acordá-lo, não conseguiu. Percebeu que ele tomara remédios para dormir. Sem saber como agir na Inglaterra (Monika era alemã), ela chama uma amiga. Alvenia Bridges, que gritou para ela: “Peça uma ambulância!”. Mas não pediu ligou para Eric Burdon: “Eric, o que eu faço?!”. Eric, aos urros, repetiu a ordem de Alvenia, Eric lhe deu o telefone do hospital mais próximo. O St. Mary´s Abbot Hospital em Kensington. A ambulância chegou quinze minutos depois. “Pegaram em Jimi de qualquer jeito e o puseram sentado, atrás. Pensei se não seria melhor deitá-lo, ou qualquer coisa, para que pudesse respirar. Mas eles me disseram que tudo estava OK”. Apesar de ter vomitado e se afogado durante a viagem para o hospital, os enfermeiros da ambulância não fizeram qualquer tentativa de usar equipamentos de ressuscitação. Às 11h:45m, a ambulância chegou ao hospital. Os médicos tentaram ressuscitação artificial por uma hora. Em vão.
Quando Monika e Alvenia foram chamadas enfim à sala de emergência, Jimi Hendrix estava morto, através de asfixia motivada por inalação de vômito. Causa da morte: intoxicação por ingestão excessiva de barbitúricos. Era o dia 18 de setembro de 1970, uma sexta-feira. Jimi morria em Londres aos 27 anos incompletos. O patologista Gavin Thurston do hospital em que Jimi Hendrix morreu encontrou também no cadáver traços de Seconal, anfetaminas e barbitúricos. Não foram achados sinais de morfina, o que descarta a intoxicação por heroína, os dois pulmões estavam congestionados, e um deles havia entrado em colapso parcial. 

Monika Dannemann, ilustradora e instrutora de esqui, a namorada alemã que Hendrix conhecera em Düsseldorf e que presenciou que Jimi Hendix ainda estava vivo quando a ambulância chegou ao apartamento, lançou o livro The inner World of Jimi Hendrix, contando a verdadeira história da morte de Hendrix, que, segundo ela, não usava e era contra drogas, não curtia o lance de atear fogo às guitarras, e não morreu de overdose. Tudo não passou de conspiração da polícia ideológica. “Os médicos disseram que ele estava bem e o puseram sentado na ambulância. Não deviam ter feito isso. Jimi não conseguia respirar, com a cabeça baixa. Morreu sufocado no próprio vômito”.
Um mês antes de morrer, Jimi Hendrix confessou em sua última entrevista: “Sabe, a onda das drogas chegou ao fim. Estava botando grilos na cuca das pessoas, dando a elas coisas que não podiam controlar. Bem, a música pode fazer isso - dar uma abertura - e você não precisa de droga nenhuma”.
Hendrix se voltava para a nova mentalidade ecológica e propunha a “curtição natural” (natural highs) através da música: “Posso explicar tudo melhor através da música, hipnotizar as pessoas, e elas voltam ao seu estado natural que é puro e positivo - como na infância, quando se vive a curtição natural das coisas”. O cantor e tecladista de blues inglês, John Mayall - que dedicou a Hendrix uma canção Accidental Suicide, condenou os exageros do acid-rock, associados, segundo ele, “à falta de disciplina, a um volume enorme de som, bloqueador, e, naturalmente, a públicos orientados pela droga. Nunca entrei nessa. O cenário do LSD repousa sobre um terreno movediço porque atrai pessoas instáveis e esquizofrênicas. Quando escolhi um volume baixo para minha música, fiz disso uma tese. Os músicos que vinham trabalhar comigo depois de anos nas máquinas-de-barulho quase sempre diziam: ‘Que alívio poder ouvir de novo o que você está fazendo’”.
Em 21 de setembro, o cantor Eric Burdon apareceu diante das câmeras da BBC com o poema, A História da Vida, nas mãos, apresentando-o como uma nota de suicídio. O laudo policial considerou que as provas eram insuficientes para determinar que Hendrix teria cometido suicídio, deixando o veredicto “em aberto”.
Foi nesse ponto que entrou a questão das drogas. A imagem que ficou de Jimi como um super-drogado é mais um dos falsos mitos que nasceram nos anos inquietos da década de 60. A imprensa em geral queria fazer de Hendrix um espantalho para “tragédia das drogas”. Os decretadores oficiais de overdoses, pressionaram o médico que o autopsiou para contar uma história de dose excessiva de heroína. O médico não cedeu. “Hendrix não tinha marcas nos braços ou em qualquer outra parte do corpo. O remédio que o matou está à venda em qualquer farmácia”.
Pessoas que o conheceram de perto dizem que Jimi Hendrix nunca usou drogas pesadas, injetadas na veia. Admitia recorrer com freqüência ao LSD, para “abrir a experiência” durante as gravações de "Axis: Bold As Love", o segundo disco. Jimi tomava ácido todo dia, sem que Chas soubesse - sempre presente de Cathy, a namorada ou dos fãs/amigos/tietes que estavam eternamente em sua companhia e, - preso à engrenagem implacável do showbiz o Star System de Hollywood era brincadeira de criança comparado ao Superstar System do rock - apelava para uma quantidade de excitantes e tranquilizantes que, misturados com a bebida, formavam uma combinação explosiva.
Em 1970, Hendrix se encontrou várias vezes com Eva Sundquist, filha de um cantor de ópera de Estocolmo. Meses depois, ela anunciou a Hendrix que ia ter um bebê. Ninguém sabe se Jimi aceitou bem a notícia – ele morreu sem conhecer o filho – mas o Tribunal de Recursos de Estocolmo reconheceu os direitos legítimos do menino ao nome e à fortuna de Hendrix. Seis anos depois da morte de Hendrix, a corte sueca deu a Eva ganho de causa pelo exame de sangue e a parecença. Então ela viajou para os Estados Unidos, com seu advogado, para discutir a posse de milhões de dólares para o garoto. Que também se chama Jimi, um garotinho sorridente, de cabelos um tanto encaracolados demais para um sueco, além do nariz sentado, herdou uma pequena fortuna: 200 mil dólares só em direitos autorais.
Monika Danemann se matou em 1996 e sua morte também foi envolvida em mistério, pois Eric Burdon, Mitch Mitchell e a ex-namorada de Hendrix, Cathy Etchinghan, desconfiavam da história de Monika.
Vinte e três anos depois, a polícia inglesa chegou a uma conclusão – Hendrix morreu sufocado pelo seu próprio vômito.
E mesmo agora seus dias finais  continuam a perseguir a história de Hendrix, seu álbum "First Rays Of The New Rising Sun", o último projeto tocado pessoalmente por Hendrix, foi finalmente editado. Vinte e cinco anos depois o legado de Hendrix voltou para casa. Sua família venceu o lítigio contra Alan Douglas e assinou um contrato com a MCA Records/Universal Music com reedição dos discos oficiais e material inédito suficiente para a próxima década.
Oh, a história de Jesus / É a minha história e a sua também / Não faz sentido sentir-se só / Eu quero me libertar / A história da vida é mais curta / que um piscar de olhos / a história do amor / é alô e adeus / e até que voltemos a nos encontrar

Relíquias
A guitarra Fender, modelo Stratocaster, favorita de Jimi Hendrix usada em Woodstock, foi leiloada em 25 de abril de 1990, em Londres, pelas casas Sotheby’s e Christie’s. A mesma aparece na capa do álbum Rainbow Bridge. Ao ser leiloada a guitarra estava em ótimo estado de conservação, apesar de possuir uma rachadura acima do diapasão. Hendrix a havia dado de presente a seu baterista, Mitch Mitchell.
Em dezembro vários itens que pertenceram a Jimi Hendrix novamente foram leiloados. Roupas, desenhos e letras de músicas manuscritas, entre elas rascunhos de Purple Haze (12 mil dólares era o lance) e Axis Bold As Love (pouco menos de sete mil dólares).
Segundo o jornal americano USA Today, um autógrafo de Hendrix está valendo mil dólares.

MUSIC

Alan Douglas, Who Mined Hendrix Archive, Dies at 82

By BRUCE WEBERJUNE 14, 2014 - http://www.nytimes.com/2014/06/15/arts/music/alan-douglas-who-mined-hendrix-archive-dies-at-82.html?_r=0

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Alan Douglas, a music producer and packager who worked with jazz greats like Duke Ellington, recorded the prerap stylings of the Last Poets and published a book of monologues by Lenny Bruce — but who is best known as a controversial steward of the legacy of Jimi Hendrix — died on June 7 at his home in Paris. He was 82.

The cause was complications after a fall, his daughter Kirby Veevers said.

A jazz fan from boyhood with an ear for the new, Mr. Douglas spent his career trying to keep his favorite sounds in circulation and the musicians who made them part of the pop culture discourse. His taste was sophisticated though not necessarily avant-garde, and though he strove to push musicians to do their most imaginative work, he wasn’t interested so much in challenging listeners as he was in attracting more of them.

As a producer primarily for United Artists Records in the early 1960s and later for his own label, Douglas Records, Mr. Douglas ushered into the world a number of notable records, among them “Money Jungle” (1963), a studio collaboration of Ellington, the bassist Charles Mingus and the drummer Max Roach; two early albums by the influential jazz-rock guitarist John McLaughlin; and the first two albums by the Last Poets, a group of street chanters whose rhythmic incantations and angry political verses anticipated hip-hop.

“He and I had our differences and ups and downs; however, he took a chance on us when no one else would,” Umar Bin Hassan, an original member of the Last Poets, said in a statement about Mr. Douglas after his death, adding, “Whether you liked him or didn’t, you had to admit he was one of the giants in what he did, and that was to put out responsible, intelligent and remarkable music.”

Hendrix, who died in 1970, had a brief friendship with Mr. Douglas, who was later hired to go through the many hours of unreleased recordings the guitarist left behind. The anger Mr. Douglas stirred in many Hendrix fans began in 1975, when he released two albums, “Crash Landing” and “Midnight Lightning,” culled from these tapes; most critics found them, or at least parts of them, worthwhile, but trouble erupted with the revelation that in remixing the originals, Mr. Douglas had replaced tracks backing Hendrix’s guitar with newly recorded music by other players.

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 Mr. Douglas is best known as a controversial steward of the legacy of Jimi Hendrix. Credit Reprise

 In the wake of the outcry, his explanation was always that he wanted Hendrix’s music to find its way to a new audience at a time when his star had begun to fade; the playing behind him on the tapes was, by Mr. Douglas’s lights, substandard, and failed to showcase Hendrix to the best advantage. But among rock critics and fans, the debate lingered for years.

 “If you take this work at face value, without the baggage of what ‘producer’ Alan Douglas did to the tapes,” Joe Viglione wrote in a review on the website AllMusic that also disparaged a co-producer, Tony Bongiovi, “it’s still Hendrix. Maybe God allowed the series of albums to happen so the world could see Hendrix’s work could survive doctoring and musicians jamming with his art after the fact.”

 In Mr. Douglas’s defense, the rock journalist and critic John Masouri wrote a long piece in 2011 on the website densesignals.com, calling Mr. Douglas “one of our last great musical visionaries.” Of the Hendrix kerfuffle, he wrote that Mr. Douglas’s decision to improve the original tracks was the right one.

 “Wisely, he’d also edited out passages where Jimi had toyed with a riff repeatedly, searching for just the right phrase,” Mr. Masouri wrote. “All things considered, it’s highly unlikely that Hendrix would have sanctioned the release of poorly executed material, yet the die was cast, and the producer has been branded a controversial figure ever since.”

 Alan Douglas Rubenstein was born in Chelsea, Mass., on July 20, 1931, to William Rubenstein and the former Rose Silbert. His father was a junk seller who eventually started a successful mattress manufacturing business. Alan graduated from a local high school and played football briefly in college — at Colby in Maine and the University of Miami — though he never graduated. He received a medical discharge from the Army after an abbreviated period of service.

 He worked for Roulette Records in New York and Barclay Records in Paris before becoming head of the jazz department at United Artists, where he worked with the singer Betty Carter, the flutist Herbie Mann and others. Later, at the short-lived FM Records, he recorded two albums by the celebrated avant-garde saxophonist Eric Dolphy.

 When FM dissolved, he started his own company. His first acquisition was the rights to Lenny Bruce’s written monologues and tapes, which were then published as “The Essential Lenny Bruce.” He also published work by Timothy Leary. In 1969, after seeing the Last Poets on television, he tracked them down performing on a run-down basketball court in Harlem and brought them right to the recording studio.

 Mr. Douglas met Hendrix in 1969; they encountered each other at the Woodstock festival and also through the intervention of Stella Benabou, Mr. Douglas’s wife at the time, who owned a clothing store in Manhattan where Hendrix liked to shop. Mr. Douglas arranged several recording sessions with him and other musicians, some of which appear on the album Nine to the Universe, released in 1980.

 In 1995, a court settlement took the rights to the Hendrix archive from Mr. Douglas and awarded them to Hendrix’s father, Al. Years of legal wrangling ensued, and Mr. Douglas was eventually able to retain the right to compile Hendrix’s writings into a book and to make a documentary film about him. Both are titled Starting at Zero. The book was published last fall; the film has yet to be released.

Mr. Douglas was married four times. In addition to Ms. Veevers, he is survived by his wife, Lucia Solazzi; a brother, Jerry Douglas; a sister, Beverly Shuman; another daughter, Solo Douglas; a stepson, Darnell Greene; and three grandsons.

A version of this article appears in print on June 17, 2014, on page A22 of the New York edition with the headline: Alan Douglas, Producer Who Mined Jimi Hendrix Archive, Is Dead at 82.  

 

TRECHO: “Starting At Zero: His Own Story: Jimi Hendrix”/Jimi Hendrix Por Ele Mesmo

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Editora Zahar

Capítulo um

(Novembro de 1942 – Julho de 1962)

VOODOO CHILD

Well, the night I was born
Lord, I swear the moon turned a fire red.
Well, my poor mother cried out
“Lord, the gypsy was right”
And I see’d her fell down right dead…*

* De “Voodoo Chile”: “Olha, na noite em que nasci/ Senhor, eu juro que a lua ficou vermelha como o fogo. / Olha, minha pobre mãe gritou:/ ‘Senhor, a cigana estava certa’/ E eu vi ela cair morta no chão...”

Nasci em Seattle, Washington, EUA, em 27 de novembro de 1942, com zero ano de idade.

Lembro que uma enfermeira me pôs uma fralda e quase me espetou. Eu devia estar doente no hospital, devia estar com alguma doença, porque lembro que não me sentia muito bem. Depois, ela me tirou do berço e me ergueu diante da janela para me mostrar alguma coisa no céu. Eram fogos. Devia ser 4 de Julho. Aquela enfermeira me deixou ligado, eu estava viajando na penicilina que ela me deu e olhava para cima e o céu estava tão…

SsschuusssSchush
É nossa primeira viagem!
Lembro também de quando eu era tão pequeno que cabia num cesto de roupas. E de quando tinha só quatro anos e fiz xixi na calça e fiquei horas lá fora na chuva até ficar todo molhado, para que mamãe não descobrisse.

Mas ela descobriu.
Papai era muito rígido e centrado, já mamãe gostava de se vestir bem e de se divertir. Ela bebia muito e não se cuidava, mas era uma mãe fantástica.
O casamento deles era problemático. Estavam sempre se separando, e, quando isso acontecia, meu irmão e eu íamos para casas diferentes. Na maioria das vezes, eu ficava na casa da minha tia e da minha avó. Era preciso estar sempre preparado para me mandar para o Canadá.

Minha avó é índia, tem sangue cherokee. Muita gente em Seattle tem sangue indígena. É apenas mais uma parte da família, só isso.
Eu passava muito tempo na reserva dela em Vancouver, na Colúmbia Britânica. Tem um montão deles lá, cara, era uma coisa terrível. Todas as casas são iguais, e nem são bem casas, são mais cabanas. É uma cena triste. Metade deles fica jogada na sarjeta, bebendo, completamente fora de si. E eles ficam lá sem fazer nada. Aquilo me deixava tão perturbado que eu nem… nem ligava mais quando um professor dizia que os índios não prestavam! Quer dizer, em outras palavras: “Nenhum índio presta, todos têm gonorreia!”
Hoje minha avó mora num apartamento incrível em Vancouver. Tem televisão, rádio e tudo o mais. Mas ela continua com os longos cabelos brancos.
Quando eu era pequeno, ela me contava histórias bonitas de índios, e meus colegas de escola riam quando eu usava aqueles xales e ponchos que ela fazia. Aquela velha história triste, sabe? Ela me deu um casaquinho mexicano com borlas. O casaco era realmente bom, e eu o usava todos os dias na escola, sem me importar com o que os outros pudessem pensar, só porque gostava dele. Eu gostava de ser diferente.

[Al e Lucille Hendrix se divorciaram em dezembro de 1950. Jimmy e seu irmão mais novo, Leon, ficaram com o pai. Jimmy viu a mãe pela última vez em janeiro de 1958. Ela morreu no mês seguinte.]

Quando era bem pequenininho, sonhei que minha mãe estava sendo levada embora por camelos. Era uma grande caravana, e dava para ver as sombras das folhas passando pelo rosto dela. Você já viu como o sol brilha por entre as árvores? Bom, as sombras eram verdes e amarelas. E ela estava me dizendo: “Olha, não vou mais estar tanto tempo com você, sabe? Então, até logo.”

Uns dois anos depois ela morreu. Vou me lembrar daquele sonho parasempre. Nunca me esqueci. Tem sonhos que a gente nunca esquece.
Papai era quem cuidava de mim na maior parte do tempo. Ele era religioso e eu frequentava a escola dominical. Ele me ensinou a sempre respeitar os mais velhos. Eu só podia falar se os adultos falassem comigo primeiro. Então, sempre fui muito calado. Mas eu via muita coisa. Em boca fechada não entra mosca.
Papai era jardineiro e já tinha sido eletricista também. Não éramos muito ricos! No inverno, quando não havia grama para aparar, a coisa ficava feia. Ele cortava meu cabelo igual a uma galinha depenada, e todos os meus amigos me chamavam de “cuca lisa”.
Eu era muito solitário. Toda noite trazia um vira-lata para casa, até que meu pai me deixou ficar com um. E foi o mais feio de todos. Seu nome na verdade era “Prince Hendrix”, mas o chamávamos mesmo de cachorro!
Também tive gatos. Adoro animais. Os mais bonitos são os cervos e os cavalos. Eu via muitos cervos nos arredores de Seattle. Um dia, vi um cervo e, por um segundo, senti algo estranho. Era como se eu já o tivesse visto antes. Quer dizer, foi como se, por uma fração de segundo, eu tivesse estabelecido uma relação muito profunda com ele. Eu disse “Espera aí!”, e então a sensação passou.
Fui à escola em Seattle e, depois, em Vancouver, na Colúmbia Britânica, de onde veio minha família. Depois, voltei a Seattle, onde estudei na Garfield High School. No geral, minha escola não era muito rígida. Tínhamos chineses, japoneses, porto-riquenhos, filipinos… Ganhávamos todos os jogos de futebol americano!
Na escola eu escrevia um bocado de poesia, e isso me deixava muito feliz. A maioria dos meus poemas falava de flores, da natureza e de gente vestida com mantos. Eu queria ser ator ou pintor. Gostava, em especial, de pintar cenas de outros planetas – Tarde de verão em Vênus e coisas do gênero.

O que mais me empolgava era a ideia das viagens espaciais. A professoradizia “Pintem três cenas”, e eu pintava quadros abstratos, como Pôr do sol em Marte, sem brincadeira! Ela me perguntava “Como você está se sentindo?”, e eu dava alguma resposta viajante, como: “Bem, depende de como os caras lá em Marte estão se sentindo.” Eu simplesmente não sabia o que mais poderia dizer. Já não aguentava mais falar: “Bem, obrigado.”
Ela me disse: “Muito bem, por essa você vai ter que vir aqui para a frente.”
E eu tinha que ficar lá no canto, como numa motocicleta da Gestapo – o piloto se senta na moto e o comandante no carrinho ao lado. Eu nunca pude me sentar com o resto da turma. Na terceira série, a professora sentava-se ao meu lado e dizia “Que isso sirva de exemplo!”, e, ao mesmo tempo, tocava meus joelhos por baixo da mesa.
Diziam que eu estava sempre atrasado, mas eu só tirava boas notas. O verdadeiro motivo era que eu tinha uma namorada na aula de artes e nós vivíamos o tempo todo de mãos dadas. A professora de artes não engolia isso. Era muito preconceituosa.
Ela disse: “Senhor Hendrix, vejo você no vestiário em três segundos.” No vestiário ela perguntou: “O que você pretende falando assim com aquela branca?” Eu respondi: “Qual o problema, a senhora está com ciúmes?” Ela começou a chorar e eu fui posto para fora. É fácil me fazer chorar.

[Jimmy abandonou a Garfield High School em outubro de 1960, aos dezessete anos.]

Lembro de quando, com delicadeza, me botaram para fora da escola. Disseram que coisa boa eu não era… Fiquei tão orgulhoso que gritei bem alto: “Vá pro inferno, escola ultrapassada!”
A gente espera e espera, e nada nos salva desse destino aborrecido de viver como anjos. Fazendo tudo certo, sem nunca ter que brigar, sem nunca sentir a ânsia de dar o primeiro passo para além da esquina.
Saí da escola cedo. Ela não significava nada para mim. Eu queria que algo me acontecesse. Meu pai me disse para procurar um emprego. E foi o que fiz por algumas semanas. Eu trabalhava pro meu pai. Tinha que trabalhar duro. Carregávamos pedra e cimento o dia inteiro, e a grana ia toda para o bolso dele. Ele não me pagava nada. Simplesmente ficava com todo o dinheiro. Eu não queria trabalhar tanto por tão pouco, então comecei a andar por aí com os garotos.
Às vezes, eu e meus amigos acertávamos um policial, e meia hora depois estávamos metidos numa briga dos infernos. Às vezes, íamos parar na cadeia, mas comíamos muito bem. A maioria dos policiais não valia nada, mas havia uns muito legais. Eles eram mais humanos – não batiam com tanta força, e, então, conseguíamos comer melhor. Mas tudo isso ficou chato demais depois de um tempo.
Para muitos garotos as coisas não são fáceis. Jesus! A vida lá em casa estava insuportável. Fugi mais de uma vez de tão infeliz que estava. Uma dessas vezes foi depois de uma briga feia com meu pai. Ele bateu na minha cara e eu fugi. Quando ele percebeu que eu tinha ido embora, ficou louco de preocupação. Mas eu não me importava com os sentimentos dos outros.

Voltei para casa quando vi que meu pai estava incomodado. Não que me importasse, mas, bem, ele era meu pai. Acho que ele nunca imaginou que eu daria certo. Eu era o garoto que fazia tudo errado.

Tears burning me
Tears burning me in my eyes
Way down, way down in my soul.
Tears burning me in my soul…
Well, I gotta leave this town
Gonna be a voodoo chile
And try to be a magic boy.

Come back and buy this town
Come back and buy this town
And put it all in my shoe
Might even give a piece to you! *
* De “Hear My Train A Comin’ (Get My Heart Back Together)”: “As lágrimas me queimam/ As lágrimas me queimam os olhos/ Lá no fundo, bem no fundo da minha alma./ As lágrimas me queimam a alma…// Olha, tenho que sair dessa cidade/ Vou ser uma criança vudu/ Vou tentar ser um menino mágico./ Depois volto e compro a cidade/ Volto e compro a cidade/ Para guardar toda no meu sapato/ E quem sabe dar um pedaço pra você!”

Enquanto eu estava no andar de cima, os adultos davam festas. Escutavam Muddy Waters, Elmore James, Howlin’ Wolf e Ray Charles. Aquele som não era nada maligno, só um pouco mais pesado. Depois, eu descia escondido para comer restos de batatas e fumar guimbas de cigarro. No rádio, escutava o Grand Ol’ Opry. Eles tinham uns caras bons, uns guitarristas da pesada.
O primeiro guitarrista de que tomei conhecimento foi Muddy Waters.
Ouvi um disco dele quando era pequeno e fiquei aterrorizado com todos aqueles sons. Uau! O que era aquilo? Era incrível. Eu gostava de Muddy Waters quando ele só usava duas guitarras, uma harmônica e um bumbo.
Eu gostava era de coisas como “Rollin’ and Tumblin’” – aquele som de guitarra verdadeiro e primitivo.
Meu pai dançava e tocava colheres. Meu primeiro instrumento foi uma harmônica, que ganhei quando tinha uns quatro anos, acho. O segundo foi um violino. Sempre curti instrumentos de cordas e pianos, mas queria algo que eu pudesse levar para qualquer lugar, e não dava para trazer um piano para casa.
Depois, comecei a me interessar por violões. Parece que todo mundo tinha um em casa. Uma noite, um amigo do meu pai ficou chapado e me vendeu o violão dele por cinco dólares. Eu não sabia que, por ser canhoto,  precisava inverter as cordas, mas sentia que alguma coisa não estava certa.
Lembro de pensar: “Tem alguma coisa errada aqui.”
Tentei inverter as cordas, mas o violão ficou completamente desafinado.
Eu não entendia nada de afinação, por isso fui até a loja e corri os dedos pelas cordas de um violão que eles tinham lá. Depois, consegui afinar o meu.
Eu tinha uns quatorze ou quinze anos quando comecei a tocar violão.
Tocava no quintal de casa, e os garotos se juntavam em volta e elogiavam.
Depois, me cansei do instrumento e o deixei de lado. Mas ouvir Chuck Berry fez renascer meu interesse.
Aprendi todos os riffs que pude. Nunca fiz nenhuma aula. Aprendi a tocar com os discos e o rádio. Cara, eu amava minha música. Lá em Seattle, ia para a varanda dos fundos, porque não queria ficar o tempo todo dentro de casa, e tocava acompanhando um disco de Muddy Waters. Sabe, nada mais me interessava, só a música. Eu estava tentando tocar como Chuck Berry e Muddy Waters. Queria aprender tudo e mais alguma coisa.
Aos dezessete anos, formei uma banda com alguns outros caras, mas o som deles abafava o meu. No início, eu não entendia o que estava acontecendo. Só depois de uns três meses entendi que precisava de uma guitarra elétrica. Minha primeira foi uma Danelectro, comprada por meu pai. Eu já devia ter acabado com ele há muito tempo, mas, primeiro, tinha que mostrar a ele que sabia tocar. Naquela época, acho que eu gostava mesmo era de rock’n’roll. Tocávamos coisas de gente como o Coasters. Seja como for, todo mundo tinha que fazer as mesmas coisas antes de entrar numa banda. Inclusive repetir os mesmos passos. Comecei a procurar lugares para tocar. Lembro que minha primeira apresentação foi num depósito de
armas da Guarda Nacional. Cada um dos músicos ganhou 35 centavos e três hambúrgueres.
No começo as coisas não foram nada fáceis para mim. Eu só sabia umas três músicas, e, na hora de subir ao palco, tremia tanto que tinha de tocar  atrás das cortinas. Simplesmente não conseguia ir lá para a frente. A gente se sente tão inseguro. Eu escutava todas aquelas bandas, e os guitarristas sempre pareciam tão melhores do que eu.
É nesse ponto que a maioria desiste. Mas é melhor não parar. Temos que continuar, que seguir em frente. Às vezes, a frustração é tanta que ficamos com ódio da guitarra, mas isso tudo faz parte do aprendizado.
Quem persiste é recompensado. Você precisa ser muito teimoso para conseguir o que quer.
Nos meus sonhos, eu via os números um, nove, seis e seis. Tinha a estranha sensação de que havia algum motivo para estar aqui e de que teria a oportunidade de ser ouvido. Me dei bem com a guitarra porque ela era tudo o que eu tinha. Olha, pai, um dia eu vou ser grande, vou ser famoso.
Vou chegar lá, cara!

A little boy inside a dream
Just the other day
His mind fell out of his face
And the wind blew it away.

A hand came out from heaven
And pinned a badge on his chest
And said, get out
There, man,
And do your best.*

[Em maio de 1961, Jimmy foi preso dirigindo um carro roubado. Recebeu uma pena de dois anos com suspensão condicional depois que o defensor público disse ao juiz que ele pretendia se alistar nas forças armadas.]

* De “Astro Man”: “Um menininho dentro de um sonho/ Um dia desses/ Deixou
a mente cair da cara/ E ser levada pelo vento. / Uma mão veio do céu,/ pregou um
distintivo em seu peito/ e disse, vai/ Lá, cara,/ e dê o seu melhor.”