“DUCHAMP:
O AUTORTURADO DaDaISTA”
Gerald Thomas - colunista ig.com.br
IMPOSTORES de Renda, cabideiros
de emprego: Marcel DUCHAMP, o URINOL que deixava o artesanato
de pé em seu próprio MIJO!
Está em cartaz no MAM, aqui em São Paulo, uma retrospectiva
de Marcel Duchamp. A simples idéia de uma retrospectiva
pra Duchamp teria sido, no mínimo, algo impensável,
ridículo ou risível, quando ele rompeu com tudo,
com a caretice de tudo, com o Samaritanismo da arte, o chamado
“bonitismo” da arte no início do século
XX. Foi aí que começou o nosso “desastre”.
Duchamp, Freud, e alguns outros são os culpados pelos nossos
fracassos. Mas explico. São os nossos grandes HERÓIS.
Meus grandes, grandes, imensos heróis.
Quem destrói pra construir é aquele que consegue
transformar o mundo num abrir e fechar de olhos, e deixar todo
mundo de pé, plantado em seu próprio mijo, sem ter
o que dizer: claro, e não é à toa que o URINOL
de Duchamp foi um dos primeiros READY MADES (achados prontos)
– um combate contra a arte artesanal, pintura, escultura
tradicional, etc. Sim, deixar o espectador pasmo em pé,
em seu próprio mijo de espanto! Retrospectiva de Duchamp
é muitíssimo estranho. Quando eu era aluno de Ivan
Serpa e Helio Oiticica, eles só me falavam em Duchamp.
Haroldo de Campos foi mais longe, já que era Dos Campos,
um Duchamp também, Du Champos! A Arte de vanguarda fala
em uníssono sempre a mesma coisa, berra sempre a mesma
coisa. Mas uma retrospectiva dela nos traz uma lágrima
de crystal japonês. E porque?Porque quando Duchamp cancelou
sua parceria com Tristan (sem Isolda) Tzara, e deixou Paris, e
virou um NovaYorkino, o movimento em si, de deixar o velho pelo
novo, já tinha um significado. Falo de 1911 ou algo assim.
O Armoury Show.“Achar” objetos prontos na rua e juntá-los,
“casá-los” como se fosse um destino “by
arrangement” no sentido oriental, é um humor que
os americanos não tinham. Só vieram a ter na década
de 60 com Wharol, Andy Wharol.Então, certo dia, Duchamp
cancelou sua expo na Pace Gallery na rua 57 em Manhattan. Falou
“retirem todos os quadros, apareço aí mais
tarde com objetos novos”. E, pra juntar-se ao já
famoso “NU DESCENDO a ESCADA“ (um dos mais escandalosamente
LINDOS tributos à arte desconstrutivista, Duchamp pintou
uma mulher descendo uma escada, nua, EM MOVIMENTO, pode-se dizer
que remota e cremosamente cubista. E…..ao lado do MOEDOR
de CHOCOLATE e ao LARGE GLASS (também chamado de THE BRIDE
STRIPPED BARE BY THE BACHELORS EVEN - algo como: “ a noiva
desnudada pelos solteiros ATÉ!, nessa ordem, escrito nessa
cadência concreta das palavras) somou-se ao seu maior e
mais conhecido piece ou seja, peça, ou seja, marca, ou
seja QUADRO-NÃO-QUADRO, ou seja: o pai e mãe disso
que chamamos hoje de INSTALAÇÃO/manifesto.A RODA
DE BICICLETAEssa roda (objeto de obsessão meu) (o que posso
fazer? nasci torto!), foi assim: nesse mesmo dia em que Duchamp
cancelava sua Expo na Pace, andava pelo Bowery (equivalente a
3ª Avenida, na lower Manhattan) perto da Houston Street,
de um lado da rua tinha uma roda de bicicleta jogada fora. Do
outro lado um desses bancos de mandeira de bar! Ele GRAMPEOU,
tacou a roda em cima do banco e levou o treco pra Pace!
Então, esse foi o MAIOR REVOLUCIONÁRIO de todos
os tempos, em qualquer contexto, em qualquer arte (porque sem
ele não teríamos John Cage na música ou Merce
Cunningham na dança (aliás, a Fabi estuda com o
Merce Cunningham em Westbeth até hoje).
A arte está morta? Rose Selavy? Como ironizava seu próprio
personagem feminino com uma estrela escupida em seu CABELO, ou
os cubinhos de mármore dentro de uma gailola (: porque
não espirrar Rose Selavy?:) ou …
Chega de descrever Duchamp !!!
A melhor maneira e a mais triste de representar uma RETROSPECTIVA
foi desenhada por Saul Steinberg. O Cartum é assim: um
Coelho olhando pro Oeste está sentado em cima de uma Tartaruga
que caminha lentamente para o Leste.
Duchamp foi um dos primeiros ENORMES iconoclastas. Com humor.
Quebrou o vidro? Deixa lá, quebrado. O acaso é otimo!
O movimento dadaísta (não os surrealistas caretas
e marqueteiros que só eles!), o iconoclástico, desconstrutivista,
atonal, dodecafônico, serialista, abstrato, abstrato expressionista,
minimalista, enfim, tudo isso visa uma só coisa:
- colocar a arte debaixo da lente do microscópio, autopsiá-la;
ver, dissecar se as verdades e mentiras dos séculos anteriores
de música e pintura e iluminismo e jacobeanismo e Renascentismo,
e ismo, ismo de anos e anos de arrotismo de tantos e tantos Rembrants,
Velasquez, Beethovens, Monteverdis, Wagners, Lord Humes e Hegels
e Kants, e os tantos Goethes, faziam realmente sentido na era
pós Freud, na era pós industrializada numa América
ainda a ser desvendada pelos bachelors de toda a humanidade enclausurada
em suas culturas pré-guerra, fugindo pra lá, digo
pro novo mundo, fugindo das emboscadas culturais da pequenina
Europa, onde à cada 16 km o teu sotaque te colocaria num
campo, num Duchamp de concentração!
E no que deu? Estamos na mesma. Aliás, estamo mais CARETAS.
Estamos numa era PRÉ DUCHAMP, porque hoje olhamos Duchamp
como se ele estivesse no nosso passado e, toda essa porcaria pseudo
inovadora (salvo alguns, óbvio, como Kiefer, Josef Beyus,
Nuno Ramos, Tunga, Warhol, Damien Hirst e outros POUCOS) ainda
estão naquela era de DECORAR a sala de estar da madame
porque – já que voltamos aquela era do GOLD RUSH,
à corrida pelo petroléo e à plantação
de cana – nada mais óbvio mesmo do que declarar um
ESTADO de DIREITO, e colocar um estatuto logo de uma vez:
O que vale aqui é o muralista Siqueiros, ou o medíocre
Portinari, ou o idota do Henry Moore, ou a Hepworth.
E o povo, ignorante como sempre, se concentra ali na estátua
dos retirantes no Ibirapuera, a metros, meio quilometro da RETRO
de Duchamp, sem sequer saber o que foi tudo aquilo, ou se o ovo
de Colombo ficou em pé ou não, porque, afinal de
contas: não foi Pedro Alvares Cabral que descobriu as AMERiKas
de Kakfa?
A Arte está MORTA sim. E faz anos que fazemos teatrinho
de representação infantil em torno de seu enterro
pra não perdermos emprego. Não passamos é
de canastrões de última categoria, com a azeitona
na ponta do esôfago, segura ali por algum Nexium, Plexium,
Sexium ou Mylanta, Maalox, ou anti-ácido.
Afinal, antigamente as pessoas tomavam ácido.
HOJE: só tomam anti-ácido
Gerald Thomas, sábado, 19 Julho de 2008