Black Sabbath, a missa negra das almas vendidas
(Mário Pacheco*)



     Foto: Bob Gruen

Bill Ward, Ozzy Osbourne, Tony Iommi e Geezer Butler adoração juvenil versus ódio da crítica


     “O que é isso na minha frente? Uma figura de preto apontando pra mim? Viro depressa e começo a correr. Descubro que sou o escolhido. Oh! Não”.
      Black Sabbath, a canção.


     Inglaterra dos Beatles. Durante a adolescência, John Michael Osbourne trabalha em um matadouro, sendo que os gritos agonizantes dos animais são seus pesadelos noturnos.
    Um certo jovem, Anthony Frank Iommi; nascido em Birmingham, a 19 de fevereiro de 1948, desde cedo exercita-se na guitarra e desenvolve um estilo pessoal, devido a um defeito na ponta de um do dedos da mão esquerda. Como todos os jovens daquela década, Tony Iommi sonha em ser rock-star, mas tudo o que ele consegue é “canjar” em algumas faixas do Jethro Tull, isso no final da década de 60.
     Geezer Butler, o mais estranho desse trio que virará um quarteto tenebroso, passa seu tempo nas aulas de teoria musical, estuda contrabaixo com um estilo macabro até então inédito no rock e o resto do tempo que lhe sobra, dedicava-se ao seu “hobby” ou seja, o ocultismo.
     Em outras coordenadas, o demolidor Bill Ward, toca bateria desde garoto e quando não bate nesta, ele quebra os ossos e dentes de alguém em brigas, pois na violenta Birmingham, essa é a única diversão dos jovens.
     Uma força misteriosa e oculta age para que os quatro jovens se unam, essa união ocorre na escola que eles cursam.
     Uma vez reunidos, eles esquecem as brigas e partem para a sua única saída, a música, através da qual eles podem eliminar as brigas, o tédio, o matadouro, evitar a polícia e acima de tudo demonstrarem o seu talento musical e, além disso, existe a vontade maior de sair daquele clima violento para novos horizontes. Pois na agitada, poluída, selvagem e industrial Birmingham precisamente no bairro de Aston, não há espaço suficiente para eles e sua música mística e macabra.
      
     (Fim do 1º Ato)

     Após esse improvável começo, nasce o grupo “Earth”, famoso por sua iluminação à base de velas, caveiras, trajes e túnicas pretas e acima de tudo pelo barulho ensurdecedor e energético de seus blues, que quando apresentados nos pubs, não permite o diálogo dos fregueses e impede o cochilo dos bêbados, com essas credenciais, eles atraem o foco visual e a ira dos vizinhos. Expulsos dos pubs eles vão cantar em noutra freguesia.
     Em 1967, ano do flower-power, do “Sgt. Pepper’s” (Osbourne é grande fã dos Beatles), os quatro músicos pensam que os jovens irão dominar o mundo com sua música, flor e o sonho da paz, mas com o passar dos tempos as pessoas mudaram e tudo foi por água abaixo. “O sonho virou pesadelo”, uma amargura, depressão, um vazio, desapontamento e com todo esse enredo, surge uma nova música o “heavy metal rock”, direto, raivoso e violento assim como os tempos atuais.
     Estamos em 1969, o grupo que só se apresenta em salas escuras em Birmingham, consegue um prestígio, junto à garotada da cidade e o empresário Jim Simpson, descobre os garotos, e este os despacham para a Alemanha, onde o Earth se apresenta no famosíssimo “Star Club”, (Os Beatles possuem algumas gravações lá e o Earth?).
     Notando que já existia uma outra banda chamada Earth, mais famosa, os pobres diabos mudam de nome; optam por Black Sabbath (nome que deu certo e virou disco de sucesso).
     Black Sabbath, era uma canção escrita por eles que continha força e morbidez assustadora assim como seus shows.
O som da “Missa Negra” era “pesada e amarga, igualzinho ao mundo”, disse certa vez Ozzy.
     O Sabbath pioneiro da magia negra e terror lança o som que agita as bruxas, fazendo com que estas entrem em atividade, não é à-toa que o primeiro disco deles traz uma bruxa na capa e um corvo.
     Gravado em 48 horas, custa a bagatela de 600 libras, o disco é pau-puro e a juventude inglesa compra aos milhares, fazendo com que o disco atinja o inacreditável primeiro lugar.
     Enquanto isso os pobres, mas esperançosos diabos, continuam tocando em espeluncas e não acreditando no pesadelo de ter o disco em primeiro lugar e nenhum “puto” no bolso. Já existia salário mínimo naquele tempo?
     Mas o melhor veio com “Paranoid”, o segundo álbum do Sabbath e a primeira excursão americana tudo isso com o grande sucesso de Paranoid que estourou nas paradas do mundo inteiro.
     Nesse meio tempo o empresário Jim Simpson é desativado da “missa”. Pintam convites macabros e a barra pesa, com medo das conseqüências de uma verdadeira “Missa Negra”, os caras do conjunto renunciam o convite e desmentem as suas ligações com atos macabros. Acreditaram nessa?

     Mestres da Realidade

    
Esse é o título do novo álbum datado de 1971, tudo continua a mil, mas eles cansam dos Estados Unidos, onde tudo é levado a sério e voltam para casa perdendo alguns milhares de dólares.
     Nessa altura do campeonato, os ricos diabos descansam das excursões, somam maiores ânimos e energia, quebram o gelo lançando o “Vol: IV” (suas maiores vendas no Brasil), onde o esquema do show business está lá: capa preta Ozzy fazendo posse e pedindo paz ao demo.
     Novamente outro estouro da boiada e a chatérrima Changes, toma conta das rádios e até vira trilha sonora de novela, lógico aqui no Brasil, além de tudo isso Rick Wakeman toca teclados.
     Saturados com o mercado, público e crítica e de saco cheio em “gravar, excursionar e outro disco” eles amadurecem e lançam o mais pesado e tenebroso disco deles: “Sabbath Bloody Sabbath” isso ocorre em 1973.
     Um som sideral e diabólico, sofisticado falando de almas penadas do espaço sideral passando por cemitérios e fantasmas. Socorro! quero a minha cruz!
     E há ainda Mr. Wakeman marcando bons momentos aos teclados e a ótima faixa acústica Fluf.
Com toda essa bagagem os críticos seus maiores inimigos dão uma lambida de saco, dizem: “Black Sabbath, são os maiores bluesmen dos 70”. Concordas ou discordas? A crítica brasileira malha e continua malhando essa bolacha que seria lançada aqui em 1976: “Um grupo que simplifica ao básico a noção de improviso e amplifica ao máximo o conceito de pique e eletricidade”
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     Sabotagens não atirem pedras...

     Em 1973, o Sabbath realiza vários shows na Inglaterra e num desses são registradas as faixas que comporiam o pirata “Live at Last” praticamente todo gravado no Rainbow Theatre. Esse disco seria lançado em 1980 por Simpson com uma excelente qualidade de som.
     As “sabotagens” são denunciadas na capa e nome do disco desse ano. A crítica malha impiedosamente e atiram pedras neles de todos os ângulos. Nova retirada artística.
     Mas em 1975, eles voltam a anunciar uma nova excursão que é um grande sucesso, mas Ozzy sente saudades da família, saturado de tudo e todos, Ozzy vai curtir sua família e malha o último disco dizendo: “Confuso e pesado”.
     As coisas não estão boas, para suprir a ausência deles é lançada a coletânea “Nós Vendemos Nossas Almas Ao Rock’n’Roll”. Um álbum duplo com os maiores sucessos e ilustrado, contendo uma faixa inédita. Outro ano e chegamos a 1977, auge do punk e tempo instável aos grupos pesados, pinta o LP “Technical Ectasy”, um disco com um nome sofisticado “Êxtase Técnico”, uma capa bem-bolada visualmente e altas promoções mas tudo furou. Uma banda para vender não precisa só ter um nome e sim ter garra e foi isso que faltou à eles. A crítica brasileira não perdoa: novamente malha!

 


     E o disco naufraga com alguns bons momentos. Ozzy esquece do seu regime, adoece, cansa da magia negra e do Sabbath, toma a decisão de trocar a agitação dos shows pela tranqüilidade do lar e da família, pois essa parece ser a única solução para que Ozzy não pirasse...
     Noticiado e anunciado o fato, Iommi agora líder de verdade, procura um novo vocalista e quem aparece é um tal de Davy Walker, mas como o vento sopra do outro lado, o demônio reaparece exigindo que Ozzy voltasse ao seu trono, seis meses depois, ele retorna ao convívio da “Missa Negra”.
     Assumindo novamente a liderança e os vocais lançam ainda em 1978, o magnífico e excelente “Never Say Die”, pintando aqui no Brasil em 1979. (No caso do Sabbath , sempre demora um ano exato para o lançamento do disco aqui depois da data original).
     “Never Say Die” é um disco sensacional, melhor gravado e com aquele som realmente macabro de antigamente, mas pintou uns improvisos jazzísticos e o Ozzy não gostou, caindo fora para nunca mais voltar e o pior de tudo “levando as influências que fizeram do Sabbath, uma grande banda”.
     Black Sabbath, reduzido a trio, ficou no limbo, parado no tempo e espaço, tudo vira um caos quando o baixista Terry Butler revela a Tony sua intenção de saltar fora, mas com os insistentes pedidos de Iommi este reconsidera sua decisão.
     Mais um ano de descanso, nada de novo... E, em 1980, surge o álbum “Heaven and Hell”, correrias e nós compramos uma quantidade infinita desse álbum. Notamos logo que o vocalista era um certo “Ronnie James Dio”, ninguém conhecia a peça rara, mas alguém lembrou que um certo “Dio”, cantava no Rainbow de Ritchie Blackmore, comparando a voz e as fotos dos álbuns do Rainbow, apagamos nossas dúvidas e alguns fãs disseram “Dio é melhor do que o Ozzy”. Mas o som de “Heaven and Hell” é melodicamente lindo e pesado na hora certa, um novo ânimo, energia, e horizonte ao esclerosado Sabbath de anos atrás.
     Excursões de promoção do novo álbum, discos piratas ao vivo e uma grande expectativa para o novo disco que sairia aqui em 1982, com o título de “Mob Rules”.
     Novas e novas correrias, novidade o baterista é Vinnie Appice, irmão de Carmine Appice (que toca com Rod Stewart) o garoto é um dos melhores bateristas que tivemos o prazer de ouvir, sendo mais técnico que Bill Ward.
     “Mob Rules” foi produzido pelo genial Martin Birch, menos pesado que o anterior este é mal recebido pela crítica e como o público sempre acompanha a crítica, Ronnie James Dio promete que os próximos serão mais pesados, retornando o estilo do início do Sabbath.
Nova excursão pelos Estados Unidos e Europa, otimistas com a recepção do público anunciam o lançamento de um álbum ao vivo.
     Depois de alguns meses, somos brindados com o álbum duplo “Live Evil”, contendo todos os sucessos do grupo passando por Black Sabbath, Paranoid até Voodoo, neste disco uma parte foi gravada no Texas e a outra em Washington.
     Sendo que o baterista Vinnie Appice, participa, como “convidado especial”, o disco traz algumas fotos; este disco permanecerá inédito entre nós até quando? Por enquanto só nas importadoras e na mão de quem é "barão"...
     Depois dessa excursão e no meio de uma gravação do novo álbum Ronnie e Appice deixam o Sabbath, relatos do incidente: “Sempre que o Sabbath completava as gravações de dia, à noite Ronnie ‘visitava’ o estúdio e mixava as gravações dando um colorido à sua voz e colocando os músicos e melodias como apoio. Tudo isso para que sua carreira como vocalista, seguisse com certo destaque e encobrindo o grupo”.
    O engenheiro de som, viu-se em apuro e revelou o fato a Iommi e Butler que despediram Ronnie James Dio: “Não tenho culpa se sou forte e eles, incompetentes”. O cantor saiu e formou uma nova banda com o baterista Vinnie Appice e demais músicos que já estão gravando um álbum, da Dio Band. No Brasil, fala-se que Dio voltará ao Sabbath, mas tudo é boato. Sendo também que existe o boato de que Ian Gillan assumirá os vocais, sendo esse o mais provável.
     E a formação da Bible Black?, ouvi boatos de que Bill Ward e alguns músicos do Rainbow estariam nessa banda. A única coisa certa é que o Sabbath não acabou e vem aí um novo time. Lá fora eles cobrem mais a disputa entre Iommi e Osbourne. Tommy: “Uma das razões (muitas) do Sabbath nada ter gravado ao vivo com Ozzy nos vocais é que ele tinha dificuldades em se lembra das letras no palco. O que não ocorre com Ronnie impecável em cena por isso Iron Man e Paranoid estão no álbum”. E o “Live Evil”, acaba de ser lançado aqui! Quanto às declarações de Iommi, algumas são inegáveis... outras pura merda!


     * Texto originalmente publicado no fanzine, "Jornal do Rock" nº 6 - 12 jun. / 1983. Tempos heroícos: resenhas escritas em alemão que não sabemos e discos importados. O Fã-clube ainda durou, outras 6 edições até setembro de 1985. Ganhou a adesão do tradutor: Antonio Carlos L. Costa e do paulista Guilherme "Iommi", um dos maiores fãs brasileiros do Black Sabbath que preencheu as edições com informações apaixonadas e inéditas no Brasil, assim como fotos.    

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