"The
Beatles", mais conhecido como o álbum branco,
foi lançado na Grã-Bretanha em 22 de novembro
de 1968. É considerado o começo do fim dos Beatles
porque já não demonstravam a mesma união
de antigamente. John, Paul e George trabalharam várias
canções sozinhos e os três usavam os demais
como se fossem músicos de estúdio. O álbum
branco tem 13 músicas de John, 11 de Paul, quatro de
George, uma de Lennon e McCartney e uma de Ringo. Em
fevereiro, os quatro Beatles foram a Rishikesh, na Índia,
para o centro de meditação do guru Maharishi
Mahesh Yogi, que tinham conhecido no ano anterior durante
um período de meditação no País
de Gales em agosto. Concentrados lá com seus violões,
eles compuseram adoidado e John até brincou que Ringo
tinha composto sua primeira canção, "Don't
pass me by", graças às vibrações
inspiradoras da meditação. Ainda na Índia
eles gravaram demos acústicas da maioria das canções.
As gravações começaram
dia 30 de maio em Abbey Road com “Revolution 1”,
de John Lennon, e terminaram dia 13 de outubro com "Julia",
do mesmo Lennon. Eles também gravaram nos Trident Studios
onde havia uma máquina de oito canais e, antes de acabarem,
“Abbey Road” também ganhou oito canais.
A idéia era fazer um disco de rock não rebuscado
como o anterior ''Sgt Pepper's Lonely Hearts Club Band'',
com os instrumentos usados pela própria banda. A
capa toda branca é um contraponto à de Sgt Pepper's,
excessivamente rebuscada, com mil elementos visuais. A simplicidade
não vingou totalmente porque o álbum duplo trazia
encartado um grande poster com colagens na frente e as letras
atrás e um retrato de cada um dos quatro. O nome da
banda estava impresso em alto relevo na frente, também
em branco, e as primeiras edições tinham o número
de cada cópia. Na segunda capa havia os nomes das músicas
e, na terceira capa, fotos individuais em preto e branco.
1968 foi um ano de grandes acontecimentos.
A guerra encarniçada no Vietnam e a revolta se espalhando
pelas universidades americanas. O maio de 1968 na França
(foto), o endurecimento da ditadura no Brasil e a primavera
de Praga sufocada pelos tanques soviéticos em agosto.
Um ano de grandes discos: "John Wesley Harding"
(Bob Dylan), "We're only in it for the money" (Frank
Zappa and the Mothers of Invention), "A saucerful fo
secrets" (Pink Floyd), "Beggar's banquet" (The
Rolling Stones) e "Electric Ladyland" (Jimi Hendrix
Experience), entre outros. E filmes marcantes como "Z"
(Costa Gavras), "Teorema" (Pier Paolo Pasolini),
"O bebê de Rosemary" (Roman Polanski). Nos
livros destaque para "Do androids dream of electric ship"
(Philip K. Dick), inspirador de "Blade runner",
"The armies of the night" (Norman Mailer), "The
electric kool aid acid test" (Tom Wolfe) e "Castaneda:
Os ensinamentos de Don Juan: o caminho yaqui do conhecimento"
(Hellen Ker e outros). Os 40
anos do álbum branco será dividido em quatro
posts. Este primeiro abrange o lado um do álbum duplo.
A edição em CD é dupla com os lados um
e dois no primeiro CD e os dois restantes no segundo CD. Back
in the USSR (Paul McCartney) - Os Beatles eram proibidos
na União Soviética e esta música saiu
três meses depois de as tropas soviéticas sufocarem
a Primavera de Praga, o que provocou acusações
de que seu autor, Paul McCartney, estivesse defendendo o comunismo.
Claro que não era nada disso. Paul disse que fez uma
paródia dos Beach Boys e um contraponto com "Back
in the USA" de Chuck Berry. Ele achou divertido falar
da URSS como se fosse os EUA e das garotas da Ucrânia
como se fossem as garotas da Califórnia (''California
girls'', música dos Beach Boys). A
canção foi gravada nos dias 22 e 23 de agosto
sem a presença de Ringo Starr, que brigou com Paul
por causa da levada de bateria e resolveu deixar o grupo (voltou
dia 5 de setembro). No dia 22 gravaram a base com Paul na
bateria, George na guitarra solo e John no baixo num rock
energético. No dia 23 gravaram mais duas baterias,
Paul e George nas guitarras solo, dois baixos (Paul e George),
Paul colocou a voz, John e George fizeram vocais a la Beach
Boys e bateram palmas. O engenheiro Ken Scott levanta a hipótese
(mas não afirma) que John e George gravaram as duas
baterias e foi feita uma montagem. Naquela época isto
era feito com gilette, cortando e colando as fitas. O
som do avião a jato foi gravado no aeroporto de Londres.
O chefe da seção de efeitos especiais Stuart
Eltham afirmou que se tratava de um avião Viscount,
não disse de que companhia, e estava arquivado como
"Volume 17: Motor a jato e a pistão". Dear
Prudence (John Lennon) - A Prudence do título
é irmã da atriz Mia Farrow. Ambas estavam na
Índia e Prudence se mostrava muito arredia, trancada
em seu bangalô com seus exercícios de meditação.
A letra a chama para sair e brincar que o sol brilha, o céu
está azul, está tudo lindo e ela também.
John e George gravaram as guitarras em estilo dedilhado -
John no canal direito segurando a música inteira, George
solando no canal esquerdo. Paul gravou a bateria, tudo isso
no dia 28 de agosto. No dia seguinte, Paul gravou o baixo,
John o vocal com dobra e os vocais, pandeiro e palmas gravados
por Paul e George. O primo de Paul, John MCCartney, o cantor
e guitarrista contratado da Apple Records, a gravadora dos
Beatles, Jackie Lomax e o roadie Mal Evans ajudaram nos vocais
e palmas. No dia 29, Paul gravou piano e flugelhorn. Paul
dá uns vacilos na bateria durante a levada, mas no
final ele manda ver nas viradas. A canção devia
terminar com palmas e gritos, gravados por todos, mas não
vingou na forma final. A canção começa
em fade in e acaba em fade out.
Glass Onion (John Lennon)
- John sempre se divertiu com as interpretações
que davam às letras dos Beatles e gostava de colocar
coisas sem sentido. A letra de "Glass Onion" é
toda construída para provocar um curto circuito nesse
povo. Ela se refere a outras músicas dos Beatles num
texto totalmente non sense que fala em olhar através
de uma cebola de vidro/monóculo. As canções
citadas são Strawberry fields forever ("I
told you about Strawberry Fields/ you know the place where
nothing is real"), "I am the walrus" ("Well
here's another clue for you all/The walrus was Paul''), "Lady
Madonna" ("Lady Madonna trying to make ends meet"),
"Fool on the hill" ("I told you about the fool
on the hill") e "Fixing a hole" ("Fixing
a hole in the ocean"). A
canção foi gravada nos dias 11, 12 e 13 de setembro.
No primeiro dia foram 34 takes da base com John (violão),
Paul (baixo, piano), George (guitarra solo) e Ringo (bateria).
No dia seguinte, gravou-se o vocal de John e um pandeiro de
Ringo e, no dia 13, piano e bateria. No dia 10 de outubro,
foram gravadas as cordas por um octeto com quatro violinos,
duas violas e dois cellos. Na mixagem, a bateria ficou no
canal direito, o baixo seco de Paul no esquerdo. Quando John
cita "Fool on the hill'' há, no canal direito,
uma breve flauta tirada da música e gravada no dia
16 de setembro com auxílio de um gravador por Paul
e John. Ob-la-di Ob-la-da
(Paul McCartney) - Uma canção infantil de Paul
em ritmo de ska que ele sugeriu como single, mas os outros
discordaram. O grupo Marmalade gravou e foi ao primeiro lugar.
A história de Desmond, dono de uma carrocinha no mercado,
e Molly, cantora numa banda. Eles se casam, têm dois
filhos, de dia trabalham no mercado, de noite ela canta num
bar. Paul levou a banda à loucura fazendo e refazendo
a canção num total de 42 horas de trabalho nos
dias 3,4,5,8,9,11 e 15 de julho. Paul cantou, fez vocais dobrados
e tocou baixo; John fez vocal e tocou piano; George fez vocal
e tocou violão e Ringo bateria, bongôs e percussão.
Todos bateram palmas e fizeram "percussão de boca",
além dos inúmeros barulhinhos e falas ouvidos
ao longo da canção. Exemplos: John canta "arm"
e George canta "legs" depois de Paul cantar "Desmond
let the children lend a hand". E George ainda canta "foot".
Paul gravou uma guitarra em
tom grave para soar como um baixo, John o piano da introdução
com o detalhe de ter tocado em desespero porque Paul não
se dava satisfeito, gravando mais e mais takes. No dia 11
gravaram três saxofones e um piano elétrico por
Nicky Hopkins, o grande músico que tocou muito tempo
com os Rolling Stones. Paul levou uma cópia da canção
para casa e, no dia 15, gastou boa parte da sessão,
que foi de 15h30 às 3h30 da madrugada, refazendo a
voz. Wild honey pie
(Paul McCartney) - Gravada por Paul sozinho no dia 20 de agosto,
enquanto John e Ringo trabalhavam em “Yer blues”
e em “Revolution 9” em outro estúdio. George
tinha viajado para a Grécia, na primeira vez em que
um Beatle se ausentava durante a gravação de
um álbum. É uma brincadeira em cima de outra
música de Paul no disco, "Honey pie". The
continuing story of Bungalow Bill (John Lennon) - Canção
bem humorada que John fez na Índia inspirado em um
americano que também estava em Rishikesh: Ele se ausentou
por uns dias para caçar tigres e depois voltou para
continuar seus estudos de aperfeiçoamento espiritual.
Diante de uma figura dessas, John partiu para a gozação:
"Ele saiu para caçar tigres com sua arma e um
elefante/ Em caso de acidentes, ele sempre levava sua mãe/
Ele é aquele americano saxão filho da mãe
com cabeça em forma de bala", daí ele chamava
para o refrão com "Cantem todas as crianças".
Todo mundo que estava em Abbey Road foi convocado para cantar
o refrão e fazer uma zona para o final da canção,
incluindo Yoko Ono e Maureen Starr, mulher de Ringo. Yoko
Ono canta em dois versos na terceira estrofe. Ela faz "But
when he looked so fierce", aí John "his mummy
butted in". Em seguir ela e John cantam "If looks
could kill it would have been us instead of him".
A canção foi gravada
num único dia, 8 de outubro, numa sessão de
gravação que durou 16 horas, de quatro da tarde
às oito da manhã do dia nove (aniversário
de John, 28 anos) com gravações de “Long
long long”, “I'm so tired” e “Bungalow
Bill”. John e George tocaram violões, Paul tocou
baixo, Ringo bateria e pandeiro. Chris Thomas tocou mellotron
fazendo sons de bandolim e trombone. While
my guitar gently weeps (George Harrison) – George
teve dificuldades em gravar suas quatro canções
incluídas no álbum branco. "Tive que fazer
umas 10 de John e Paul antes que me dessem uma chance",
contou ele em 1987. Foram cinco sessões nos dias 25
de julho, 16 de agosto, três, cinco e seis de setembro.
George tocou violão e órgão e a voz principal
com dobra, Paul piano, órgão e baixo distorcido
(canal direito), John guitarra e Ringo bateria e pandeiro.
O grande trunfo é o solo de Eric Clapton, gravado no
dia seis de setembro com uma Gibson Les Paul depois de muita
insistência de George. "Ninguém toca num
disco dos Beatles," relutou Eric e George respondeu que
a música era dele e queria que Eric tocasse. Os dois
eram muito amigos, moravam perto e se freqüentavam, a
ponto de Eric se apaixonar pela mulher de George, Pattie Boyd.
George disse que a presença
serviu para que os demais Beatles trabalhassem com entusiasmo,
em vez de relutância. Eric não foi creditado
na época por problemas contratuais. A letra era uma
aplicação dos ensinamentos aprendidos na Índia
com uma abordagem condescendente que mereceu críticas:
"Eu não sei como alguém te controlou. Eles
te compraram e te venderam. Eu olho para todos vocês
e vejo o amor dormindo, enquanto minha guitarra gentilmente
chora." A música partiu de duas palavras "gently
weeps" numa página do I Ching que George abriu
ao acaso. Happiness is a
warm gun (John Lennon) – O título violento
foi achado por John numa revista de armas, uma sugestão
de que a felicidade é uma arma quente, ou seja, que
acabou de ser usada contra alguém. A letra é
mais um exercício de non sense para perturbar os que
buscam significados nas letras dos Beatles. "Ela não
é uma garota que perde muito. Ela conhece bem o toque
da mão de veludo como um lagarto numa janela"
e por aí vai, com alusão também a drogas
"Preciso de um pico porque estou indo para baixo".
O nome da música também foi associado a drogas,
como se "arma" quisesse dizer "seringa".
O recém falecido Neil Aspinall, assessor dos Beatles
desde Liverpool, disse que ele e John fizeram muitos versos
juntando palavras aleatóriamente. Uma referência
pelo menos é verdadeira, o "homem na multidão
com espelhos multicoloridos nas botas" é referência
a um cara que botava espelhos nas botas para olhar por baixo
das saias das mulheres em jogos de futebol. A
interpretação é uma das melhores de John
em disco. Começa suave e vai num crescendo à
medida que ele enuncia a letra, até a parte final inspirada
em doowop, com sua voz gritada (canal direito) e o coro de
resposta feito por ele, Paul e George (canal esquerdo). John
tocou guitarra, George guitarra distorcida, Paul baixo, órgão
e piano. Foram 70 takes nos dias 20, 23 e 24 de setembro.
John decidiu que a primeira parte do take 53 e a segunda parte
do take 65 eram as melhores. Daí fizeram a edição
no dia 25. Fim do lado um.
Enviado
por Jamari França - 10/4/2008- 9:00
Os 40 anos do álbum branco
dos Beatles (Segunda Parte)
“The
Beatles”, o álbum branco dos Beatles, entrou
em várias listas de melhores de todos os tempos.
Numa eleição promovida em 1997 pela loja inglesa
de discos HMV em parceria com o Canal 4, o jornal “The
Guardian” e a “Classic FM”, o álbum
ficou em 10º lugar na lista de “Músicas
do milênio”. A mesma posição ele
ocupou na lista dos 500 discos mais importantes de todos
os tempos da revista americana “Rolling Stone”.
A revista ''Time'' colocou o álbum entre os 100 mais
importantes de todos os tempos numa lista por década,
sem ordem de classificação. Nos Estados Unidos,
é o décimo disco mais vendido da história
com 19 discos de platina ou 19 milhões de cópias
vendidas. O álbum foi lançado em 22 de novembro
de 1968 na Grã-Bretanha, e no dia 25 nos Estados
Unidos. Nas
entrevistas que deu para a série de DVDs “The
Beatles anthology”, Ringo Starr disse que, para ele,
o pior da fase de gravação mais elaborada
da banda era ficar um tempo sem fazer nada nos estúdios
até chegar sua vez. E, muitas vezes, quando chegava,
o baterista tinha que reproduzir o que o autor da canção
queria, em vez de o deixarem livre para elaborar sua participação.
Nas gravações do álbum branco, Ringo
perdeu finalmente a paciência. Irritado com as instruções
de Paul McCartney na gravação de “Back
in the USSR”, saiu batendo a porta (metaforicamente)
e disse que estava fora da banda. Isso aconteceu em 22 de
agosto de 1968. O trabalho não parou. Enquanto cortejavam
o baterista para que voltasse, o trio gravou “Back
in the USSR” e “Dear Prudence” com Paul
na bateria. No dia cinco de setembro, Ringo voltou e encontrou
seu kit decorado com flores azuis, brancas e vermelhas (idéia
de George Harrison). No futuro, ele se referiu ao incidente
como o início de “meses e anos de angústia”.
“Martha my
dear” – Paul McCartney – Gravada sem os
demais Beatles nos estúdios Trident, Paul se revezou
entre piano, baixo, guitarra, bateria, palmas e vocal com
dobra. Foram dois dias de trabalho, quatro e cinco de outubro,
com 14 músicos fazendo sopros e cordas: quatro violinos,
duas violas, dois cellos, três trumpetes, flugelhorn,
trombone e tuba. A maior parte foi gravada na sessão
do dia quatro, que durou de quatro da tarde às quatro
e meia da manhã. No dia seguinte, Paul gravou baixo
e guitarra. Na sessão do dia quatro, foram gravados
também os sopros de outra música de Paul,
“Honey pie”. Martha era a cadela pastor de Paul,
que morava no mesmo bairro da gravadora EMI, St. John’s
Wood, e ele de vez em quando a levava para passear. Um grupo
de fãs que fazia plantão diante de sua casa
às vezes recebia o privilégio de levar Martha
para passear. Paul também sentava na janela de noite
com o violão e cantava para elas, assim reza a lenda.
Apesar do nome, a letra não é sobre a cadela,
mas sobre um caso de amor complicado, a menos que alguém
ache que versos como “eu e você fomos feitos
um para o outro, garota boba” se referem à
cadela. O arranjo de cordas e sopros é de George
Martin. Paul costumava passar para ele de boca o que queria
e Martin orquestrava. Na mixagem, o piano fica no canal
esquerdo junto com cordas e palmas. No canal direito, estão
os sopros e baixo. A bateria está no meio e a voz,
no direito para o esquerdo.
“I’m
so tired” (John Lennon) – John compôs
esta música na Índia, numa referência
ao seu cansaço com tanto estudo e meditação
no ashram do Maharishi Mahesh Yogi. Ela se conecta diretamente
com “I’m only sleeping”, do LP “Revolver”,
pela semelhança do tema. Naquela, John pede que não
o acordem porque está ferrado no sono. Em “I’m
so tired”, ele tenta combater a insônia com
um drinque e um cigarro e, de quebra, xinga Sir Walter Raleigh,
o cara que introduziu o tabaco na Inglaterra, de “babaca”.
No final da canção John murmura “Monsieur,
monsieur, what about another one?” A
gravação foi feita num único dia, 8
de outubro, com John na voz, violão guitarra e órgão.
Paul tocou baixo, piano elétrico e fez vocal, George
guitarra e Ringo bateria. A sessão durou de quatro
da tarde às oito da manhã com os quatro trabalhando
também em “The continuing story of Bungalow
Bill”, de John, e na balada “Long long long”,
de George. Na mixagem, voz, vocal e órgão
no meio, guitarras à direita e bateria da esquerda
para a direita (não é pan).
“Blackbird”
– Paul McCartney – Paul compôs esta música
na Índia e a inspiração foi um acordar
com o canto de pássaros antes do dia raiar. O músico
usou a imagem do pássaro negro para se referir às
experiências que estava tendo com o guru indiano.
“Pássaro negro...pegue estas asas quebradas
e aprenda a voar/ Você esperou por este momento toda
a sua vida”. E “Pássaro negro...pegue
estes olhos encovados e aprenda a ver/ Em toda sua vida
você estava apenas esperando este momento para ser
livre”. Paul gravou em 11 de junho, sozinho, em Abbey
Road, com violão Martin D-28 e voz , com uma afinação
em ré das duas cordas mi com execução
dedilhada. Apesar de simples, Paul gravou 32 takes, 11 deles
completos. O canto do pássaro na faixa veio do volume
sete da biblioteca de efeitos de Abbey Road: “Pássaros
de pena”. A mixagem pôs um clique (metrônomo)
marcando no canal esquerdo como se fosse percussão
e o restante no meio. Paul trabalhou no estúdio dois
de 18h30 a 0h15, enquanto John trabalhava nos efeitos de
“Revolution 9” no estúdio três
de 19h às 22h15.
“Piggies”
– George Harrison – Canção de
George que ecoa “Animal Farm” ("A revolução
dos bichos"), de George Orwell, em que os porcos dominam
os demais animais com o mote de que todos são iguais,
mas uns são mais iguais do que outros, o que se encaixa
perfeitamente no conceito ocidental de democracia. A letra
fala de porcos pequenos que apenas têm a lama para
chafurdar e dos grandes porcos acima deles, sempre com roupas
limpas, que saem com as esposas para jantar e comem bacon,
dos porcos pequenos, supõe-se. A
canção tem um arranjo barroco com quatro violinos,
duas violas e dois cellos. O co-produtor Chris Tomas, que
dirigia as sessões na ausência de George Martin,
tocou cravo. Paul tocou baixo, Ringo bateria e John fez
os loops de fita com os roncos dos porcos usando o volume
35 da biblioteca de áudios: “Animais e abelhas”.
George gravou a voz com dobra em alguns pedaços e
distorção. O engenheiro Ken Townshend explica
como conseguiu o efeito: “Passamos o sinal do microfone
por filtro de câmara de eco muito agudo que cortou
tudo acima e abaixo do nível de três kilohertz,
criando uma faixa de som bem estreita”. Na mixagem,
o trecho em que Paul imita o ronco de um porco fica no canal
esquerdo com baixo e pandeiro. A voz de George está
no meio com dobras que vão para o canal direito.
Violinos e cravo estão no meio, com cellos à
direita. O loop dos porcos à direita. George
contou com ajuda de Lennon, autor do verso “clutching
forks and knives to eat their bacon” (“Empunhando
facas e garfos para comer seu bacon”) e sua mãe,
Louise, fez o verso “What they need is a damn good
whacking” (o que eles precisam é de uma boa
surra”). A canção foi interpretada como
sendo contra a polícia porque pigs é uma gíria
para policiais. Charles Manson, o líder de uma seita
que trucidou quatro pessoas numa mansão da Califórnia
se disse inspirado pela canção “Helter
Skelter”, deste álbum, e escreveu “morte
aos porcos” na porta, uma referência, ao que
parece, à música de George. Uma de suas vítimas
foi a atriz Sharon Tate, oito meses e meio grávida
do marido, o cineasta Roman Polanski, e três amigos,
dois homens e uma mulher.
“Rocky Raccoon”
– Paul McCartney – Canção com
relato cômico de Paul sobre um caubói chamado
Rocky Raccoon que vivia nos morros do estado de Dakota.
A mulher dele, Magill, foge com um tal de Dan, ele vai atrás
para lavar a honra, encontra os dois mas Dan é mais
rápido e atira nele. Paul fez parte da letra no estúdio.
Gravada numa única sessão no dia 15 de agosto,
das 19h às três da manhã, com Paul na
voz e violão, John no vocal, gaita, harmonium e baixo,
George no vocal e Ringo na bateria. O produtor George Martin
gravou o solo com um piano de armário. Na mixagem,
a voz está no meio, no canal direito estão
violão, gaita, vocal e o solo de piano. A bateria
e o baixo à esquerda. Alguns versos deixados de lado:
“roll up his sleeves on the sideboard”; “roll
over Rock...he said oh, it’s OK doc, it’s just
a scratch and I’ll be OK when I get home” “This
hear is the story of a boy living in Minnesota”.
“Don’t pass me
by” – Ringo Starr – O baterista da banda
sempre tentou fazer músicas, mas quando mostrava
aos outros, eles caíam na gargalhada porque ele apresentava
músicas que já existiam. Este country levou
cinco anos para ficar pronto, uma canção de
amor com versos pueris. Levou quatro sessões, em
cinco e seis de junho e 12 e 22 de julho, com Ringo na voz,
bateria, sineta, piano, Paul ao piano e baixo e Jack Fallon
ao violino. Fallion era empresário de shows e músico
e contratou os Beatles para alguns shows no começo
da carreira deles. John e George não participaram
da gravação. Na mixagem, os teclados e a voz
estão no meio, o baixo à direita com o violino
e a bateria à esquerda.
“Why
don't we do it in the road?” – Paul McCartney
- Um blues de verso único com apenas um minuto e
40 segundos gravado por Paul e Ringo em duas sessões
nos dias nove e 10 de outubro, na reta final do álbum
branco, no estúdio um. Paul tocou violão,
guitarra, baixo e bateu palmas, Ringo tocou bateria e bateu
palmas. Paul usa todos os seus recursos vocais nesta faixa,
indo do gutural ao falsete num sonoridade bem crua. John
adorou e ficou chateado por não ter sido convidado
a participar quando Paul gravou as bases no dia nove. John
e George estavam acompanhando mixagens em outro estúdio.
Na mixagem, piano e guitarra à direita, baixo à
esquerda e o restante no meio.
“I will”
– Paul McCartney – Outra das belas baladas de
Paul como “And I love her”, “Here, there
and everywhere”, “For noone”, “Yesterday”,
entre outras. Letra boba do tipo ''eu te amo e você
sabe que vou te esperar", com um arranjo e interpretação
tocantes, foi gravada em duas sessões, em 16 e 17
de setembro, com Paul na voz e violões, John na percussão
e Ringo nas maracas, címbalos e bongôs. A canção
exigiu nada menos que 67 takes até que Paul ficasse
satisfeito com o take 65 na sessão que durou de sete
da noite às três da manhã. No dia 17,
Paul gravou um “baixo de boca” que pode ser
ouvido melhor com fone de ouvido no canal direito e gravou
vocais. O solo de violão está à direita
, a percussão à esquerda, voz e vocal no meio.
“Julia”
- John Lennon – Homenagem de John à sua mãe,
Julia Stanley, que cuidou dele apenas nos primeiros quatro
anos, passando a responsabilidade à irmã Mary,
ou melhor, a Tia Mimi, que criou John. Julia prezava sua
liberdade, via John apenas ocasionalmente, mas ele sempre
a adorou. Os dois foram mais próximos na juventude
de John, quando ele formou os Quarrymen, a banda à
qual se agregariam Paul e George. Julia morreu atropelada
em 15 de julho de 1958, quando John tinha 17 anos, e ele
sempre demonstrou um trauma em relação ao
abandono. Na canção “Mother”,
de sua carreira solo, ele canta “mãe, você
me teve, mas eu nunca tive você”. “Julia”
é uma canção de amor para a mãe
e também cita Yoko Ono no verso “ocean child
calls me”: Yoko significa “criança do
oceano” em japonês. Os psicólogos de
plantão interpretam que Yoko finalmente preenchera
o vazio que ele sentiu com a morte da mãe, a quem
amava muito. Julia fazia o papel de amiga e o encorajava
criativamente e sua morte, segundo os supracitados, o levou
a adotar uma postura rebelde e a tratar mal as mulheres
até conhecer Yoko. John gravou sozinho cantando e
tocando violão duas vezes e estas duas versões
foram superpostas no estéreo, o que dá um
efeito quando ele canta “Julia”. Esta canção
foi a última a ser gravada para o álbum branco,
em 13 de outubro, e encerra o lado dois.
Enviado por Jamari França
- 15/4/2008- 9:00
Álbum branco: Helter
Skelter inspira chacina e Yoko Ono é macaca
O lado três contém
a música mais polêmica do álbum branco,
o rockão de Paul McCartney “Helter Skelter”,
usado pelos fanáticos da seita californiana de Charles
Manson como desculpa para assassinar a atriz Sharon Tate
e três amigos dela, além de várias outras
pessoas. A canção, junto com outras do álbum
branco, conteria mensagens de uma rebelião que jogaria
negros contra brancos numa guerra racial e Manson se ergueria
como o guia dos vencedores. O crime chocou a nação
pela violência e, ao estilo show business do país,
pela morte da bela Sharon grávida de oito meses.
É óbvio que a música nada tinha a ver
com isso, mas ficou associada ao crime. “Helter Skelter”,
que ao pé da letra significa confusão, desordem,
na época se referia a um escorrega em espiral nos
parques de diversão ingleses e a letra se refere
a isso: “quando eu chego ao fundo eu volto ao alto
do escorregador, onde dou voltas num passeio, chego ao fundo
e te vejo de novo”. A canção “Everybody’s
got something to hide except me and my monkey”, de
John Lennon, se refere à verdadeira guerra da imprensa
e dos fãs dos Beatles contra Yoko Ono, retratada
numa charge como uma macaca nas costas de Lennon. O lado
três tem três músicas de John Lennon,
duas de Paul McCartney, uma de George Harrison e uma de
Lennon e McCartney. Birthday – Lennon e McCartney
– Única canção no disco da dupla
com os dois se revezando na voz principal. A parte principal
é de Paul completada por John. Gravada no dia 18
de setembro, quando a BBC exibiu pela primeira vez o filme
“The girl can’t help it”, estrelado pela
louraça belzebu Jayne Mansfield como uma cantora
em busca da fama. Mas o atrativo principal eram os números
musicais de Little Richard, autor da canção-título,
Fats Domino, The Platters e Gene Vincent & The Blue
Caps. Os Beatles combinaram de começar a sessão
de gravação às 17h em Abbey Road, depois
seguir para a casa de Paul, na vizinha Cavendish Avenue,
para ver o filme às 21h05. Paul foi o primeiro a
chegar ao estúdio e os outros o encontraram levando
“Birthday” ao piano com sua voz no alcance máximo
ao estilo de Little Richard, usada por ele no passado em
“Long tall Sally”. Os quatro começaram
a trabalhar na base com Paul na voz e piano, John na guitarra
e voz e vocal, George no baixo e Ringo castigando os tambores.
Um rock rápido ao melhor estilo de Little Richard.
Depois do filme voltaram para concluir, acertando algumas
partes, John gravou a sua parte, duas esposas que estavam
no estúdio, Pattie Harrison e Yoko Ono ajudaram nos
vocais. A canção substitui o tradicional “Parabéns
pra você” nos aniversários da turma do
rock. “Yer blues” – John Lennon –
Uma rara incursão dos Beatles pelo blues, foi escrita
por John como uma brincadeira com a onda de blues que assolava
a Inglaterra na época. Para captar o espírito
do blues, foi gravado num pequeno anexo da sala de controle
do estúdio dois. As guitarras de John e George passaram
por caixas Leslie, Paul tocou baixo e Ringo bateria nas
sessões de 13 e 14 de agosto de 1968. John faz uma
grande interpretação nesta canção,
que ele considerava uma de suas melhores e faz o solo de
apenas duas notas. No final John canta diante de um microfone
com captação mínima dando a impressão
de que está cantando bem longe. No dia 20, Ringo
gravou a contagem “two, three...” que abre a
canção.Na sessão do dia 14 John também
gravou “What’s the new Mary Jane”, que
ficaria inédita em lançamento oficial até
1996, quando foi incluída no volume três da
Beatles’ anthology”.
“Mother’s nature
son” – Paul McCartney – Outra balada lírica
de Paul sobre um rapaz pobre do campo que se proclama filho
da mãe natureza. Paul gravou sozinho com voz dobrada,
violões, bateria e tímpanos em 25 takes, aproveitando
o 24º. A primeira sessão foi no dia nove com
gravação só de voz e violão.
No dia 20 de agosto, Paul gravou um segundo violão,
o tímpano e a bateria. Para esta última pediu
ao engenheiro Ken Scott que ela tivesse um som parecido
com bongôs e sugeriu que fosse gravada no corredor,
o que deu um interessante efeito de staccato. Também
foram gravados os sopros: dois trumpetes e dois trombones.
“Everybody's got something
to hide except me and my monkey” – John Lennon
– Esta canção de aparente letra non
sense se refere a uma charge de um jornal inglês que
mostrava Yoko Ono como um macaco nas costas de Lennon. Muitos
versos se referem a citações do Maharishi
durante a estada da banda na Índia.“Come on
it’s such a joy” (“Venha, é tanta
alegria”) era uma frase freqüente do guru indiano.
“The deeper you go the higher you fly” (“Quanto
mais fundo você for, mais alto voará”)
e “Your inside is out and your outside is in”
(“Seu interior está para fora e seu exterior
para dentro”) são outras citações.
Gravada em quatro sessões nos dias 26 e 27 de junho
e 1º e 23 de julho, John cantou, tocou guitarra e percussão.
George fez vocal, tocou guitarra e percussão. Paul
fez vocais, tocou baixo e percussão. Ringo tocou
bateria e percussão. Todos bateram palmas. A canção
tem uma insistente sineta no canal esquerdo e duas guitarras
à direita, uma em contínuo, a segunda mais
aguda tocando o riff básico de influência espanhola.
No dia primeiro de julho, Paul gravou um baixo e vocais.
Todos os quatro contribuíram para os repetidos “come
on come on come come on” no final. Sexy Sadie –
John Lennon - Inspirada no (suposto) comportamento do Maharishi
Mahesh durante a estada dos Beatles no seu ashram na Índia
em 1968. Eles souberam que o guru assediava discípulas
para lhes mostrar um atalho sexual para o Nirvana. Lennon,
sempre cínico, escreveu a canção e
lhe deu o nome de Maharishi: “Sexy Sadie what have
you done/ You made a fool of everyone” (“Sexy
Sadie, o que você fez/ Você fez todo mundo de
bobo”). O nome não se manteve como “Maharishi”
por pressão de George Harrison e para evitar processos.
Há uma segunda versão de que a fofoca foi
engendrada por um certo Alex Mardas, ciumento com a influência
do guru sobre os Beatles. Mardas era um charlatão
conhecido como Magic Alex que convenceu os Beatles de que
poderia construir um estúdio de 72 canais e não
fez coisa alguma, só mamou nas tetas do Fab Four
até ser posto porta a fora.A canção
consumiu 35 horas de estúdio nos dias 19 e 24 de
julho e 13 e 21 de agosto. John fez a voz com dobra, vocal,
tocou violão, órgão Hammond e guitarra
base. Paul tocou baixo, piano e fez vocal. George tocou
guitarra solo e fez vocal e Ringo tocou pandeiro e bateria.
A sessão do dia 19, de 19h30 até 3h30, foi
dispersiva, com muitos improvisos, incluindo seis minutos
instrumentais de “Summertime”, de George Gershwin.
Vinte e um takes foram gravados da canção,
mas John não gostou de nenhuma. No dia 24, eles recomeçaram
com 23 takes, John marcou um deles como melhor, mas começou
tudo de novo no dia 13 de agosto, desta vez mais rápido,
com apenas sete takes. A canção foi finalizada
no dia 21 de agosto. Helter Skelter – Paul McCartney
– Uma das primeiras canções, se não
a primeira, do que viria a ser chamado de heavy metal. Paul
ficou mordido com uma declaração de Pete “The
Who” Townshend, que chamou seu single “I can
see for miles” de a “canção mais
alta, barulhenta e crua” da carreira do Who. Paul
resolveu fazer uma que fosse muito mais tudo isso que a
do Who e há versões de que foi uma resposta
a quem o acusava de só fazer baladas.Os Beatles gravaram
a música em três sessões nos dias 18
de julho, nove e 10 de setembro com Paul no vocal, guitarra
e baixo. John tocou baixo, sax tenor, baixo, guitarra e
vocal. George tocou guitarra e fez vocal e Ringo bateria,
numa performance excepcional. A sessão do dia 18
foi toda de jam sessions, uma delas de 27 minutos e uma
das outras foi editada e incluída no volume três
da Antologia.A sessão do dia nove de setembro foi
descrita como uma loucura total pelo engenheiro Brian Gibson,
que insinua que eles estavam drogados. O auxiliar de George
Martin Chris Tomas conta que George Harrison botou fogo
num cinzeiro e andou com ele na cabeça enquanto Paul
gravava a voz. A canção tem um fade out e,
a seguir, um fade in até um final caótico
em que Ringo grita que está com bolhas nos dedos,
uma referência à sua performance incendiária
nos tambores e pratos. Long, Long, Long – George Harrison
– depois da demência de ''Helter Skelter'' esta
balada tranqüila de George cai muito bem. Gravada em
três sessões nos dias sete, oito e nove de
outubro com John Lennon ausente. George cantou com dobra
e tocou violões, Paul tocou baixo e órgão
Hammond. O co-produtor Chris Thomas piano. Um ruído
no final climático é de uma garrafa de vinho
que estava em cima da caixa leslie e começou a tremer
quando Paul tocava. Eles gostaram do som e o repetiram com
um microfone para a devida captação. A letra
de George pode ser interpretada como de amor romântico,
mas o engajamento religioso dele pode lhe dar uma outra
interpretação: “Faz muito muito muito
tempo/ Como eu posso ter te perdido/ Se eu te amava/ Levou
muito muito muito tempo/ Agora estou feliz por ter te encontrado”.
Enviado por Jamari França
- 24/4/2008- 9:00
Álbum branco, o final
-numberninenumberninenumbernine
Durante as gravações
do álbum branco, os Beatles ensaiaram músicas
que só iriam aparecer mais adiante, nos álbuns
"Abbey Road" e "Let it Be", e outras
que só emergeriam na carreira solo deles, como "Jealous
guy", que John Lennon ensaiou com outra letra e outro
nome ("Child of nature") e vocês podem conferir
ao lado, na coluna "Veja e escute aqui" em gravação,
digamos, alternativa. O mesmo aconteceu com "Teddy
boy", de Paul McCartney (também ao lado), numa
versão diferente da que está no terceiro volume
da "Beatles anthology". E tem ainda "All
things must pass", de George Harrison... Idem, idem.O
lado quatro do disco foi o que mais fundiu a massa encefálica
da rapaziada, na época, pela presença dos
oito minutos e 13 segundos de "Revolution 9",
algo que nunca tinha sido ouvido fora do restrito círculo
da música experimental: meia dúzia de gatos
pingados que conheciam John Cage e Karlheinz Stockhausen.
Neguim pirou legal ouvindo aquele troço, ainda mais
com os neurônios aditivados pelas três letrinhas
místicas THC. Neste encerramento, temos quatro canções
de John, uma de Paul e uma de George. Interessante o contraste
entre ''Revolution nine'' e ''Good night'', que fecha o
disco, ambas de John, uma muito louca, outra uma canção
de ninar com orquestra. A mesma diversidade se repete para
os demais Beatles e a grande conclusão, infelizmente
saudosista, é que eram bons tempos em que quatro
caras de uma banda faziam um disco de 30 músicas
diferentes umas das outras.
Revolution – John Lennon
– As agitações de 1968 tiveram influências
conflitantes sobre John Lennon, que gravou três versões
de "Revolution". A primeira, mais rápida
e cantada de maneira agressiva, com guitarras distorcidas,
foi lançada em um compacto com “Hey Jude”.
A segunda, mais lenta, com sopros e guitarra distorcida
com menos ataque, abre o lado quatro do álbum branco.
A terceira é uma colagem de sons que entrou como
a quinta faixa deste lado e falo mais adiante. A letra trata
de temas cotidianos daquele ano, como a pregação
de uma revolução por setores agressivos da
esquerda americana como o Youth International Party e os
Panteras Negras. Lennon diz que todos querem uma revolução,
mas, se for pela violência, ele está fora.
Aos que culpam a Constituição, ele manda que
mudem suas cabeças. Aos que levam posters do líder
chinês Mao Tse-tung, ele rebate que nada vão
conseguir. Em resumo, prega a revolução pela
mudança individual de cada um, uma posição
utópica que foi criticada pelos setores politizados
da época, com a América pegando fogo contra
a guerra do Vietnam e as manifestações francesas
ainda no rescaldo do maio de 68 (o disco saiu em novembro).A
gravação aconteceu em quatro sessões
a 30 e 31 de maio, quatro e 21 de junho: John cantou, tocou
violão e guitarra; Paul tocou piano, órgão,
baixo e fez vocais; George tocou guitarra e fez vocais;
e Ringo tocou bateria. Esta versão tem dois trumpetes
e quatro trombones. A guitarra solo fica no canal esquerdo,
os sopros no direito, em alguns momentos dialogando com
a guitarra no esquerdo, dois trombones ficam marcado, um
em cada canal. Os “all right” finais de Lennon
passeiam em pan pelos dois canais.
Honey Pie – Paul McCartney
– Canção de Paul ao estilo das bandas
de jazz dos anos 20, com sopros manipulados para soarem
como as antigas gravações em 78 rotações.
A história de uma garota do norte da Inglaterra que
faz sucesso na América e seu apaixonado a chama de
volta. Gravado nos estúdios Trident, nos dias 1,
2 e 4 de outubro, com Paul na voz, piano e guitarra; John
na guitarra; George no baixo e Ringo na bateria. Os sopros
são cinco saxofones e dois clarinetes. Um verso “now
she’s hit the big time”, no princípio,
recebeu forte compressão e chiados para soar como
num disco antigo.
Savoy Truffle - George Harrison
– Esta música é uma homenagem à
então fama de chocólatra de Eric Clapton,
grande amigo de Harrison, que assaltava caixas de bombons
“Good news” que tinham sabores como Savoy truffle,
Montelimart, Gingersling, Cream tangerine e coffee dessert,
todos citados na letra. Gravada no Trident e em Abbey Road
nos dias 3, 5, 11 e 14 de outubro, teve George no vocal
com dobra e guitarra, Paul no baixo e Ringo na bateria e
pandeiro. Os sopros são seis saxofones – dois
barítonos e quatro tenores – que tocaram lindamente
o arranjo do assistente de George Martin Chris Thomas. Quando
estava pronto, George pediu ao engenheiro Ken Scott que
distorcesse o som, o que foi feito injetando os sopros em
dois amplificadores que foram saturados e sujaram tudo.
Antes de os músicos ouvirem, George pediu desculpas
pelo que tinha feito mas explicou que era assim que queria.
Eles não gostaram nem um pouquinho, mas estavam ali
para fazer o que o autor desejava.
Cry Baby Cry – John
Lennon – Canção inspirada num comercial
que mandava as crianças chorarem para as mães
comprarem uma marca de flocos de milho. A letra foi inspirada
em histórias de fantasia a la ‘’Alice
no país das maravilhas’’, que John conhecia
da infância. Gravada nos dias 15, 16 e 18 de julho,
com John na voz, violão, piano e órgão,
Paul no baixo, George na guitarra solo, Ringo na bateria
e no pandeiro e George Martin no harmônio. No dia
18, os Beatles compareceram à première de
“Yellow submarine”, mas também acabaram
a gravação com um nova voz de John, vocais
e efeitos. Na mixagem, John canta a introdução,
o refrão no canal esquerdo, as estrofes no meio,
baixo na esquerda, piano e bateria no meio, harmônio
na esquerda.Revolution 9 - John Lennon – começa
com um fragmento de Paul cantando algo sobre ser levado
de volta por um barco, a seguir um diálogo entre
o produtor George Martin e o gerente da Apple Alistair Taylor
que se esquecera de trazer uma prometida garrafa de vinho
e pede desculpas para Martin. Daí entra uma voz dizendo
“number nine” encontrada numa fita que John
usou para criar um loop que se repetia ao longo da peça,
inspirada nos experimentalismos de gente como Cage e Stockhausen.
A colagem foi feita por John e Yoko, com uma força
de George, e inclui coisas como um trecho orquestral de
“A day in the life”, ao contrário, um
mellotron ao contrário, trechos de óperas
e sinfonias, John e George falando coisas aleatórias
como “the watusi”, “the twist”,
“the eldorado”, “economically viable”,
“financial imbalance”, “there ain’t
no rule for company freaks”. Yoko canta “you
become naked” e solta aqueles gritos irritantes. Um
engenheiro falou que o “number nine number nine”
virou mania na gravadora e as pessoas ficaram semanas repetindo
como um mantra.
John levou os funcionários
de arquivo e os engenheiros à loucura com sua pesquisa
de sonoridades, colagens feitas na base de gilete e cola,
loops grandes que tinham que ser segurados com lápis
longe dos gravadores e a loucura de jogar tudo isso nos
oito canais e fazer a mixagem com efeitos de pan. Nunca
uma peça experimental teve o alcance de tanta gente,
levada para a casa pelos milhões de compradores do
álbum branco.
Depois disso, só restava
finalizar o disco com algo bem careta.
Good Night – John Lennon
– Ringo canta esta cantiga de ninar feita por John
para seu filho Julian, de cinco anos. Nos dias 28 de junho
e dois de julho, John e Ringo gravaram uma base, que George
Martin levou para criar o arranjo de orquestra, gravado
no dia 22 de julho por 26 músicos, com o coral dos
Mike Sammers Singers, quatro rapazes e quatro moças.
Ringo colocou o vocal definitivo nesta noite numa sessão
que foi de sete e meia da noite a uma e 40 da madrugada.
That's all folks. Bye bye...
|