Começamos escrevendo
para viver e acabamos escrevendo para não morrer.
Para quem edifica palavras mal rompe a aurora, escrever é
inadiável e urgente, mesmo que nada externamente nos
obrigue a isso. Mas a necessidade interna é visceral,
orgânica, chama e fogo, flecha, algo colado à pele.
Não conseguimos escapar desse apelo.
Escrevemos para perdurar, para vencer a poeira do tempo, para
despistar a morte, para regar nossos fantasmas e (por que não?),
para amar e se amado.
A literatura é o refúgio da sinceridade num mundo
de pose.
"A literatura é
um apelo de fogo, onde mora meu desespero, a minha inquietação
e o meu paraíso", escreveu alguém.
Eu sei: tento escrever um hino de amor à palavra.
Qual a maior viagem (interior) que podemos fazer, senão
aquela que é um mergulho no livro, nesta criação
de outros mundos, nessa peregrinação às
áfricas interiores?
"Se o mundo dos objetos palpáveis e vida prática,
não é mais real que o mundo das ficções,
dos sonhos e dos labirintos, então pode ser que o autor
de artifícios verbais tenha mais direito à condição
de demiurgo que qualquer outro candidato", escreveu
Samuel Titan Jr., falando sobre Borges..
Hoje, a realidade chamada virtual fica sendo mais importante
que o humano propriamente dito.
Uma personalidade não aparece porque é boa, mas
é boa porque aparece.
Vivemos uma mudança de época e não uma
época de mudanças.
Ou está inapelavelmente decretado que não há
nada mais a fazer, que o destino já rabiscou todos os
destinos?
Queremos um modelo de consumidores ou de cidadãos?
Aceita-se passivamente um mundo onde são as coisas que
comandam e não os valores.
Queremos pessoas abúlicas, inertes, numa globalização
onde impera a uniformidade e não a igualdade?
A literatura é um sonho do eterno. Sua morte tem sido
decretada diariamente.
Mas por que ela continua tão viva?
Pois há dentro do homem uma sede de infinito que nenhum
modelo meramente mercantil pode saciar.
*Escritor
ESCREVA P/
Emanuel
Medeiros Vieira