O
Bandido da Luz Vermelha
(Rogério Sganzerla)
O
que você fazia antes de filmar O Bandido da Luz Vermelha?
Fazia crítica de
cinema para jornais. Já tinha feito o curta "Documentário",
que ganhou o prêmio de melhor montagem no Festival Jornal
do Brasil e me garantiu uma viagem à Europa. Assim pude
percforrer vários festivais como enviado especial: Cannes
em 1967, Pesaro, onde eu fui do júri, Veneza etc.
Como
surgiu a idéia para o filme?
Surgiu na Europa. Tive
a idéia de fazer um filme policial narrado por um comentatista
esportivo. Achei que seria uma boa opção para fazer
uma análise crítica da nossa realidade. Fui escrevendo
o roteiro na viagem de volta,a bordo do navio Eugênio C,
mas eu mesmo não acreditava muito na possibilidade de um
bandido mascarado assaltanhdo casas, como uma espécie de
Zorro subdesenvolvido. Achava muito ficcional. Até que,
na volta, deparei com um jornal que mencionava o João Acácio
Pereira da Costa, o "Bandido da Luz Vermelha". Aí
eu vi que a realidade suplantava a ficção. Tudo
o que eutinha escrito, até alguns diálogos, estava
no jornhal.
Como
você escolheu Paulo Vilaça para o papel?
Ele estava no teatro, fazendo
a peça "Navalha na Carne", do Plínio Marcos.
Fui assistir e disse: "É ele". Ele tinha uma
voz grave e a face de um Humphrey Bogart acaboclado, lembrava
muito o próprio bandido.
Como
se viabilizou a produção?
Com a ajuda de dois produtores
de São Paulo, José Alberto dos Reis e José
da Costa Cordeiro, conhecido como Deca, que era dono da distribuidora
Urano, que só trabalhava com filmes brasileiros. Era um
filme de orçamento médio para a época, em
torno de US$ 100 mil.
As
filmagens foram realizadas na boca-do-lixo?
Foram. E foram movimentadas,
pois aquela região da boca era muito conturbada. Além
de ser um local de marginalidade, era também ali que havia
a sede do Dops (Departamento de Ordem Política e Social).
Havia então muita confusão, e nós tivemos
alguns problemas de controle da situação. Era o
bairro mais perigoso de São Paulo. O bandido estava ali
perto, ninguém sabia ainda quem era ele. O Deca tinha muito
receio de que, ao ler as reportagens sobre o filme que saíram
na época, o bandido viesse achacá-lo. Ele teve muita
coragem de produzir o filme. Além do mais, eu era um estreante,
nunca tinha sido assistente, não tinha quase nenhuma experiência.
Era uma equipe extremamente jovem. O câmera Carlos Alberto
Ebert tinha 19 anos, eu tinha 21.
Você
acha que isso contribuiu para o frescor e a inventividade do filme?
A gente ia aprendendo à
medida que ia rodando. Mandava rodar e ia filmando na rua, aproveitando
o frescor dos fatos, da forma mais direta, mais nua e crua possível.
Há
curiosidades no elenco, como a Sonia Braga...
Foi o primeiro trabalho
dela, que hoje é um fenômeno de mercado. Ela foi
descoberta graças ao talento do diretor de produção,
Julio Calasso. Tinha a cena do assalto à mansão
número três. Mas cadê a madame misteriosa,
a figura que chama a atenção do bandido? Ele disse:
"Se você quiser, eu pego um táxi e vou procurá-la
no ABC paulista". Ele foi e, quando voltou, trouxe aquela
figura singular. Achei ela sensacional.
Você
chegou a conhecer o verdadeiro bandido?
Cheguei. muitos anos depois.
Fui vê-lo no Carandiru e até tive uma boa impressão.
Ele foi sincero comigo. Elogiou o trabalho de direção
do filme e parecia que entendia um pouco de cinema. Ele queria
fazer cinema.
Ele
tinha sido preso um pouco depois de termos começado a fazer
o filme. Um dedo-duro do Paraná informou a polícia
e ele foi preso em Curitiba. Temos um material sensacional dessa
detenção, que pretendo usar no Bandido 2, que
estou preparando.
OUTROS
FILMES: A Mulher de Todos (1969), Copacabana,
Mon Amour (1970), Abismu (1977), Nem Tudo é
Verdade (1986), Tudo é Brasil (1988) e
O Signo do Caos (2002)
*Meu
Primeiro Filme, por Rogério Sganzerla. Folha de S. Paulo
- Mais! 3 ago. / 2003.