Declarações e estrondos de Glauber Rocha

 

 

Declarações e estrondos de Glauber Rocha

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ou Frases compiladas por Mário Pacheco mundo afora

 

Jornal de Cinema: Ava Gadner fará uma operação plástica a fim de retirar bolsas de álcool que se formara sob os olhos. Qual seria o motivo das farras homéricas de Ava?

Em seu rosto já não se vê revolta: apenas profunda tristeza salta de seus olhos e de sua expressão já enrugada.
Glauber falando de um preso encontrado num presídio baiano. (Jornal da Bahia).

A vítima rachava lenha quando foi atingida por um pedaço de pau.

Sou comunista leve o que quiser.

Não aceito o conformismo como lei

Foi dado o corte epistemológico, eles têm que ver.

Pessoas que não conhecem a realidade não deveriam fazer cinema.

Pela minha formação social eu devia ser um cara inteiramente perdido. Nasci em Vitória da Conquista, estudei em péssimos colégios, minha família não é rica, não pude ir para grandes universidades, não estudei no exterior, não fiz bolsas de estudos. Aprendi cinema na Bahia, lendo uns livros russos e franceses. Aos 14 anos encontrei um sujeito no colégio que me deu Nietzsche para ler, Assim falava Zaratustra. Eu li a Bíblia e Nietzsche já cedo, entendeu? Quando tinha cinco anos, já sabia Castro Alves de cor. Nasci a 14 de março de 1939, mesmo dia do Castro Alves e mesmo ano de Machado de Assis, uma síntese, por isso está havendo uma transformação na minha vida. Fui castroalvino, agitado, louco até agora, mas já matei Castro Alves e estou entrando no barato de Machado de Assis.

Nasci judeu e protestante. Como judeu, sei o que é fazer parte de uma minoria oprimida. Como protestante, defendo o livre arbítrio. A Reforma foi uma grande explosão intelectual. Defendeu a liberdade de cada um interpretar a Bíblia à sua maneira. O protestantismo não conhece a Inquisição. O catolicismo colonial falava em penitência, no medo, no pecado, no pessimismo. Esta é a herança jesuítica que impregna a cultura brasileira. Existe ainda hoje uma arte católica, que se expressa na forma ritualística de uma missa. Graciliano Ramos é um formalista, comunista do Sistema. Machado de Assis é um conservador. José de Alencar é romântico, metafórico, explosivo. Jorge Amado é pagão, Oswald de Andrade também. A Igreja Católica fala em reformas sociais, mas, a 23 anos do século XXI, ainda faz campanha contra o divórcio.

No Egito, Jesus aprendeu história, geografia, medicina, parapsicologia, hipnotismo, astronomia, economia, política, filosofia, não existe metodologia mística. Sentimento sexual. Ação muscular....

A Revolução é um ato de Amor e não de Violência. Discordo de Lenin, de Mao, de Guevara. O sangue não purifica. O que revoluciona são as Idéias e não as Armas. Não quero lavar meu corpo e alma no sangue dos fascistas. Muitos machistas dirão: não quer brigar porque é frouxo. Os loucos encontram na morte o máximo de prazer. Os lúcidos encontram o prazer na vida. A Revolução é fundamentalmente a luta contra a morte dos amigos e dos inimigos.

O protestantismo anglo-saxão provocou a revolução capitalista norte-americana. O catolicismo ibérico miserabilizou sul-américa. O conceito moderno de Civilização Ocidental foi criado pelo Pentágono. Golbery possui um conceito filosófico correto de Civilização Ocidental Cristã mas discordo de seu conceito político. Uma má tática política prejudica uma grande estratégia filosófica. Sendo o Brasil a síntese do Terceiro Mundo não tem sentido o cristianismo romano e sim o Cristo Zorostrista. Porque Zoroastro foi o Mestre de Cristo e Buda. O cristianismo continua a maior força ocidental e o Enviado aparece encoberto por várias personagens. No Brasil é Sebastião, o louco. O Segundo Sebastião é o êxtase da lucidez.

A revolução é uma estética.

Conheço muito bem a vida intelectual brasileira e coloco problemas sabendo que vão provocar discussão, para romper certas teses, porque detesto o dogmatismo, a ortodoxia, meu princípio filosófico não admite dogmas.

O único eterno subversivo é o artista.

O povo vive totalmente à margem das querelas tradicionais entre as elites de direita e de esquerda e trata de resolver por si mesmo suas contradições e problemas.

Vamos derrubar os militares.

Na verdade eu ponho frases na boca deles, atribuo significados a estes personagens e depois eles têm de agir conforme o script.

O roteiro de A Idade da Terra foi outra vez proibido pela censura e Rodolfo Echeverria me declarou fora da lei. Todos os cineastas latino-americanos nos negaram solidariedade: estava com febre e úlcera no quarto 418 do Hotel Camportella, Sullivan, 5, México D.F. e fui visitado por Augusto Boal: — Você é um traidor. — Qual é a sua? - Suas declarações em Visão 74! Respondi: — Sou artista! Sou um burocrata!

Ninguém sabe de uma coisa que eu vou dizer aqui em furo. A declaração que eu dei na Visão de março de 1974, foi reproduzida em mais de cinco mil xerox e distribuída pelo mundo inteiro. Até hoje não sei quem fez isso. Eu dei uma declaração como cineasta, como intelectual, como livre pensador. Quando cheguei ao Brasil, durante dezesseis meses, toda a imprensa brasileira, com raras exceções, me chama de louco. Então, eu virei uma espécie de figura desfrutada, de jornalistas irresponsáveis que, inclusive dizem mentiras.

Eu, soube, que um dos responsáveis pela campanha internacional movida contra mim, desde 1974, é o senhor Miguel Arraes.

Não tenho resposta na boca para todas as coisas. Sou um artista, portanto meu processo é um processo dialético entre o fluxo do inconsciente e minha razão dialética. Assim, posso mudar a qualquer momento.

O MDB está fazendo o jogo do capitalismo internacional: uma revolução está amadurecendo e ninguém parece se dar conta dela, mas é possível que ela esteja no cerne do comportamento do presidente Geisel.

Patrulha é a Igreja Católica em conluio com o MDB, dom Paulo de mãos dadas com o Cebrap, quatro séculos de Inquisição na jogada.

Fernando Henrique Cardoso é um subcientista social. Não e, nunca foi nem será comunista. É um neocapitalista, um kennedyano, um entreguista. Responsável pela organização das Patrulhas Ideológicas contra intelectuais e artistas revolucionários e nacionalistas. O gancho do Pentágono funciona em São Paulo. A metástase cancerígena abrange a telenovela, a música popular multinacional, o Cebrap - Centro Brasileiro de Análise e Planejamento, os brasilianistas, as universidades, o marxismo colonizador e a igreja de dom Evaristo, cardeal de Berlim.

Eles (o CEBRAP) fazem estudos sob uma visão materialista grosseira da história, porque acham que aqui é uma reprodução do sistema econômico ocidental, sem levar em conta a antítese irracional da emergência terceiro-mundista, inclusive a tradição do modo de produção africana e árabe nos bolsões brasileiros mais profundos. São bons estudos na parte de pesquisa, mas na parte de interpretação não existe mobilidade dialética no pensamento, resultado do trauma do fracasso de 64, sem que ninguém tenha feito a psicanálise do alter-ego janguista que não respondeu à ânsia revolucionária ou histeria revoltada de um profundo sentimento humanista.

O intelectual brasileiro é um alienado, é pobre não tem dinheiro para estudar. O Brasil pertence aos brazilianists.

Aqui o bombardeamento lingüístico é terrível. A publicidade é feita em inglês, os cantores cantam em inglês, estão todos escrevendo em inglês, falando inglês – esperando um dia ir aos Estados Unidos.

Quem diz que a primeira parte de Os Sertões é ilegível está completamente alienado: Euclides da Cunha era geólogo militar e ouviu de Antônio Conselheiro a revelação de tudo. Uma leitura atenta de Os Sertões pode revelar, inclusive, o mapa dos lençóis petrolíferos brasileiros: está tudo em código.

O profeta Souzândrade fez uma profecia sobre a hora presente e cantou ‘a revolução feita pela espada de Deodoro’.
O grande Descartes poderia ter terminado seus dias como mascate em Pernambuco, pois quando fugiu da perseguição religiosa, em França, foi acolhido e escondido por Maurício de Nassau, que implantou o primeiro governo protestante no Brasil.

A CYA quer nos impor as coisas, a CYA quer nos impor o negrismo, o viadismo, o mulherismo, que não levam a porra nenhuma!

A palavra de ordem é cortar minha cabeça, estão cortando com a língua, espero que não venham com facões.

Arte só existe quando não há repressão. Mas aqui não se trata só da repressão das leis, dos códigos, da força: há também a repressão interna, o código interno. Escrever um verso é escrever a primeira coisa que vem à cabeça, a primeira loucura, o primeiro desbunde, a primeira imagem. Eu poderia até dizer que arte não tem relação direta com talento, mas sim com coragem. É preciso ter coragem para admitir uma subjetividade caótica, cósmica. Isso não quer dizer que tudo o que for liberado será belo, há uma variação, uma escala. Todo homem tem possibilidade de fazer arte, de liberar arte.

Existirá uma síntese dialética entre o capitalismo e o socialismo. Estou certo disso. E do Terceiro Mundo seria o nascimento da nova e verdadeira democracia, a democracia que não é socialista, não é comunista, não é a capitalista. A democracia é o desreinado do povo. Sabemos todos que morremos de fome no terceiro mundo, sabemos todos das crianças, pobres, velhos abandonados, loucos, famintos. Tanta miséria, tanta desgraça. É necessária uma revolução econômica.

A revolução soviética já era, a revolução francesa já era, o euro-comunismo... Adeus Europa (...) vamos descobrir o Brasil.

Os russos e os americanos estão de mãos dadas para manter o mundo colonizado.

O Brasil é um país grande. América Latina, África, não se pode pensar num só país. Temos que multinacionalizar e internacionalizar o mundo dentro de um regime interdemocrático. Com a grande contribuição do Cristianismo e todas as religiões, que são a mesma religião.

O fato dos heróis terem sido heróis, não me impede de criticar seus erros políticos.

Golbery e Darcy, os dois gênios da raça, se juntassem. Eles são a cara e a coroa do mesmo país. Falta ao Darcy a visão militar e ao Golbery a visão antropológica. Além do mais, os dois nomes terminam em y.
Os cubanos, a princípio ficaram surpresos, mas acabaram convencidos, o mesmo ocorrendo com Arraes e João Goulart. Por isto me surpreendi com a reação das pessoas. Quando dei essa declaração, achei que estava declarando o óbvio.

Golbery é uma síntese de Splenger e Euclides da Cunha.

Eu apenas leio os telegramas internacionais das agências. Leio os editoriais dos jornais. Ouço as declarações dos políticos e sei o que se está passando é uma questão de análise.

Segundo um jornalista da Abril, amigo de Delfim Netto, Juracy Magalhães teria me prometido o Governo da Bahia caso eu o chamasse de gênio.

O ideal do jornalista é escrever um livro. O jornalismo é a única literatura militante. Melhor que as telenovelas é a Coluna do Carlos Castello Branco. Interpretação cotidiana de Brasília. Carlos Castello Branco é melhor que Machado de Assis.

Se o pessoal do jornal Movimento estivesse no poder Glauber Rocha cineasta revolucionário do Terceiro Mundo seria fuzilado porque esculhambou Machado de Assis.

O redator distorceu minhas palavras, fez uma matéria escandalosa porque eu propus uma coisa óbvia como a lua: o general Figueiredo nomear um intelectual para o Ministério da Educação e Cultura. São ignorantes, não sabem sequer que o De Gaulle nomeou o André Malraux. Distorceram e disseram que eu estava para trás, que era um corrupto, cobra mandada que recebia dinheiro do governo, uma coisa inteiramente absurda, irresponsável. Eu ia escrever uma carta, mas deixei pra lá. quer dizer, a revista diz que é minha amiga, eu converso numa boa o cara vai lá e faz uma coisa dessas. Felizmente o Paulo Francis escreveu um artigo me defendendo, esculhambando essa desonestidade. Você não pode discordar de nada.
Glauber Rocha in Jornal de Brasília, 21 jan. / 1979 .

Conheço muita gente que considera Delfim ou Campos inteligentes. Respondo sempre que economista idealista é burro. Idealismo ou retórica. Leiam Campos leiam Furtado. Se Furtado é materialista, Campos é dialético. E por ai podemos explicar porque Furtado era ministro de Jango e hoje Campos ou Delfim estão no poder.

Um dia, em 1970, veio alguém me procurar para fazer um filme pra Shell. 30 milhões. Respondi que a Shell era americana. Que estava disposto a fazer de graça pra Petrobrás. O sujeito me respondeu que a Shell era holandesa. Que a Shell e a Esso controlam a cultura brasileira. Onde está o Ministério da Educação e Cultura que permite duas companhias de lubrificantes e gasolina controlar nossas Letras e Artes?

Depois de Antônio das Mortes compreendi que era impossível continuar nessa rota. Para mim estava terminada a época onde eu representava o cavaleiro da esperança, o profeta de uma revolução fracassada, a bandeira de uma geração em revolta. Em 1971, o cinema político se transformou em comércio e no interior desse comércio eu estava me convertendo num artigo de luxo. A moda do cinema político é hoje a posição mais cômoda para um autor cinematográfico. Eu decidi acabar com isso, a fim de continuar a ser livre para fazer meus filmes políticos longe dessa moda internacional.

Meu estilo de filmar está profundamente ligado à cultura popular brasileira. Os que são considerados símbolos e alegorias não são abstrações, senão expressões diretas de elementos da cultura popular. É um cinema feito sobre o povo e com a colaboração popular de sua cultura. O que ocorre é que o cinema tradicional está informado por uma iconografia burguesa e por uma gramática burguesa capitalista. O cinema latino-americano tem dois caminhos: um, que é o cinema-documentário, informado de denúncia e agitação política e social, tendências que se encontram embutidas na literatura latino-americana. No meu caso, por uma deficiência profissional, já que não tenho capacidade para fazer documentários, faço filmes de ficção ligados à realidade latino-americana, com uma linguagem que expressa os mitos. Mitos mais profundos do povo latino-americano, herdados da cultura negra, da cultura índia, da moral do povo que não é a psicologia burguesa, da imaginação visual, da arquitetura, dos trajes, da cultura popular, que não é a burguesa. Daí surge o símbolo ou a alegoria. Mas não é simbólica nem alegórica: é a pura realidade. É a verdadeira cultura do povo, aquela que está nas telas. Desde Barravento meu primeiro filme, até Cabeças cortadas o último, sempre estive voltado para eles. Inclusive corri o risco de uma determinada compreensão. Afasto a afirmação de que faço alegorias e símbolos em meus filmes. Creio que eles refletem exatamente as possibilidades do cinema latino-americano inspirado no povo.

Cabeças cortadas é a degola final dos fascismos, dos imperialismos, dos patriarcalismos, dos totalitarismos, e pra mim, representa a degola do meu passado no Brasil.

Eu exerço um trabalho de pioneiro. Decifro os caminhos obscuros dentro das florestas, enfrento as tempestades nos desertos, desafio as lavas dos vulcões para poder mostrar os momentos iluminados e os momentos de revelação. (...) Continuo fechado com minhas posições de um cinema terceiro-mundista. Um cinema independente do ponto de vista econômico e artístico. Um cinema que não deixe a criatividade estética desaparecer em nome de uma objetividade comercial e de um imediatismo político. Não há vantagem alguma em fazer filmes de conteúdo revolucionário se, na forma, você imita a Nouvelle Vague francesa, o expressionismo alemão ou o comercialismo norte-americano. O problema dos cineastas do Terceiro Mundo é encontrar um estilo próprio. Eis o triunfo do artista. Porque há um corpo literário e há os artistas. O que faz de Eça de Queiroz um grande escritor é que ele é um estilista específico do português - e, nesse domínio, ele é igual ou superior a Gustave Flaubert ou Marcel Proust. É aí que fica a grandeza da literatura. Ela é popular e revolucionária. Os críticos de arte, os críticos de cinema deveriam entender. Querer reduzir o artista a um propagandista e a um imediatismo comercialista é um erro, porque, para fazer o trabalho do comércio vulgar ou de propaganda imediata, já existem milhões de pessoas. Os artistas são seres especiais que enxergaram a luz dentro do processo histórico. Então, eu defendo a estratégia da criatividade global e democrática e a tática da criatividade intelectual. Isto é: uma estratégia de conquista do mercado e do desenvolvimento industrial e uma tática de revelações pessoais.

A arte é dialética. O processo dialético é sutil. Você não pode dizer que todos os filmes produzidos por uma indústria de Estado defendem a política do Estado, como também não pode dizer que todos os filmes produzidos pela política do capital privado não defendam a política do capital privado. A tese é esta, mas a antítese é outra. É assim que se pode explicar a existência de cineastas como Tarkovski, um realizador soviético que se situa entre os melhores do mundo e é inteiramente independente. Ou então Miklos Jancso ou Martha Meszaros ou Alea Gutierrez que fazem filmes revolucionários como Godard, Bergman e Buñuel. O processo artístico, então, possui uma gama de subjetividade que escapa ao materialismo imediato. É este o grande segredo, o grande mistério da arte. É um problema que foi visto por Fernando Pessoa - por exemplo. Fernando Pessoa é um produto da monarquia portuguesa ou da república portuguesa? Não é um produto de nada. É um produto de tudo e de nada: simultaneamente. É o ‘eu terei tudo e não sou nada’ ou ‘não serei nada e sou tudo’. Isto quer dizer que o mistério artístico é, justamente, o grande fluido que ilumina a humanidade. É impossível fabricar um Van Gogh por decreto, mas você deverá ter uma Escola de Belas Artes que ofereça a possibilidade de estudar a pintura. Se de duas centenas de estudantes nasce um Van Gogh a cada dez anos é uma maravilha, porque um Van Gogh, um Gauguin, um Pablo Picasso, um Ezra Pound, um Vieira da Silva iluminam o mundo. Não se pode dizer que a pintura portuguesa seja somente Vieira da Silva ou que a literatura portuguesa seja somente Ferreira de Castro. Artistas assim não se fabricam nas escolas de literatura ou nas escolas de Belas Artes. Mas é preciso que existam as escolas e vinte mil pintores medíocres para que - de toda essa mediocridade - possa surgir a genialidade de um Vieira da Silva. O grande artista é, além de tudo, um democrata, neste sentido. Então, é por esta razão que acho que o Estado - e também as organizações privadas - devem investir na educação artística, devem pagar bolsas de estudos, subvencionar obras nas galerias de arte, nas editoras, no teatro. Caberá aos críticos e ao público - e aos próprios artistas - selecionar o que é bom. É o que me leva a ser contra todo tipo de censura - teórica, econômica ou política.

Toda a intelectualidade, toda a vanguarda cinematográfica brasileira é de esquerda. De direita são os medíocres. Aliás, ser de direita é uma condição de burrice.

Cultura não pode dormir na mesma cama que a pornochanchada.

Fora. Zefirelli. Vá se embora. Quem vai filmar O Guarany sou eu. E Caetano Veloso será Peri.

Os negativos dos quatro filmes que produzi no Brasil estavam na Europa. Só agora me encorajo a importá-los. Quando a Censura ameaçou destruí-los, eu, clandestinamente, os transportei para a Europa.

Giscard pretende cobrar imposto sobre a verdade! Como os gênios são pobres, ninguém mais produz. O subversivo sexual ou político não vai pra cadeia: paga imposto sobre a verdade. O tutu mata a cultura. Mas quem morre mesmo é a cultura do tutu.

A droga, passados os tempos ideológicos do sonho, é o alimento dos anos 70 e o fato de ser utilizado para o melhor funcionamento do cérebro provocaria a mais radical revolução na medicina desde que esta ciência foi criada

Ácido e fumo não dá luz a cego.

A viagem lisérgica é superfluidade química.

Sou cineasta amador e jornalista profissional. Sou pensador, político, porque o cinema não me dá dinheiro. Ganho do que faço para a imprensa brasileira (precisava de um emprego melhor, porque vivo de free-lancers).

Tenho horror de ser gratificado e não me interesso pelo público. Sou insensível diante do sucesso e frio diante do sofrimento.

Sempre fiz questão de me desmistificar inteiramente, indo contra todos os tipos de paternalismo. Considero o estrelismo uma atividade doente, que oprime o público e exerce uma função paralisante na sociedade.

Desprezo o dinheiro, nunca fiz cinema de publicidade nem de encomenda: meu poder intelectual dentro do cinema é uma conquista definitiva. Os caciques do cinema, como Rosselini, Visconti, Pasolini, Antonioni, Renoir, Buñuel, Godard, Bertolucci sempre me consideraram um mestre do cinema!

Eu sei que meus filmes valem muito dinheiro, é um grande capital e estão fora, até para serem preservados. Algum dia os trarei para o Brasil, mas não vou vendê-los como um artista que na crise econômica vende os quadros ao primeiro comerciante. Meus filmes não estão vendidos para a televisão. Se ela quiser exibi-los tem que pagar muito caro e eu não deixo botar publicidade no meio, porque filme meu não corta para botar propaganda de inseticida, não.

O cinema brasileiro é uma terra devastada.

No caso brasileiro, o único homem de cinema que ainda pode viver do ofício é o crítico.

A situação atual do Cinema Brasileiro é catastrófica como em 1962. Quinze anos de Cinema Novo convertidos em comerciais da Globo! Como Oswald de Andrade, a quem nunca li antes de existir, conheço alguns amigos cineastas - mas recuso absolutamente o programa oportunista e reacionário da Embrafilme! Posso mesmo acusar alguns ex-amigos de traidores do Cinema Novo.

Minha tese é que as mulheres dos cineastas provocaram o cisma do Cinema Novo. Os membros do movimento se amam tanto que as mulheres ficam ciumentas e desagregam o ambiente. São mulheres adoráveis, talentosas, belíssimas mas não se conformam em ter os maridos trepando intelectualmente com Cacá Diegues, Saraceni, Gustavo, Nelson, Joaquim, Jabor, David, Miguel, Leon, Orlando Senna e todo mundo, com Luiz Carlos Barreto.

O Cinema Novo sou eu. Quando a canalha diz que o Cinema Novo morreu quer dizer que Glauber Rocha morreu. Por isso, mataram Anecyr Rocha. Mas eu estou vivo. Só que eu não sou moleque da Globo, não sou garoto-propaganda da Shell ou da Esso. E não sou teleguiado do PC.

Até hoje Walter Lima Júnior não explicou como Anecyr Rocha morreu caindo de um elevador.

Harry Stone dá uísque para os críticos e influi na orientação da indústria cinematográfica brasileira.

Não é jornalismo, nem cinema. É vida. Glauber sobre o programa Abertura na TV Tupi.

Quando meu filme bate na tela, o santo desce e o astral pinta.

A primeira coisa que um diretor tem que saber é pentear e despentear o ator.

Ai, meu Deus, esses atores brasileiros adoram ficar nus diante das câmeras.

A TV Globo é soporífera, uma espuma flutuante do povo brasileiro. Faz dormir como um detergente audiovisual, vende publicidade e bestialidade através dos grandes atores – hoje todos palhaços.

Sou um gênio, uma glória nacional, não encham meu saco.

Se eu quiser dez elefantes brancos da Índia para colocar em cena, que tragam. Sou um gênio.

Se eu rodo a cena com nuvens, os críticos vão afirmar que Glauber Rocha não entende nada de cinema. Os críticos querem me matar.

O cinema é materialista porque é dialético.

Orson Welles is the only genius!

Meu ídolo político é Napoleão Bonaparte.

Estou trabalhando A Idade da Terra, há dois anos, e só gastei 500 mil dólares, Francis Ford Coppola gastou cinco anos em Apocalypse Now e mais de 30 milhões de dólares. Ninguém vê isso. A imprensa vive dizendo que já montei o filme não sei quantas vezes, e coisa e tal.

A Idade da Terra é a desintegração da seqüência narrativa sem a perda do discurso infra-estrututural que vai materializar os signos mais representativos do Terceiro Mundo, ou seja: o imperialismo, as forças negras, os índios massacrados, o catolicismo popular, o militarismo revolucionário, o terrorismo urbano, a prostituição da alta burguesia, a rebelião das mulheres, as prostitutas que se transformam em santas, as santas em revolucionárias. Tudo isso está no filme dentro do grande cenário da História do Brasil, por meio da arte nova, como se fosse Villa-Lobos, Portinari, Di Cavalcanti ou Picasso. O filme oferece uma sinfonia de sons e imagens ou uma anti-sinfonia que coloca os problemas fundamentais de fundo. A colocação do filme é uma só: é o meu retrato junto ao retrato do Brasil.

Ficou um filme muito bom. Muito bom mesmo.

O que eu poderia dizer é que eu tive prazer a fazer o filme, foi o único filme que não me torturou e que, depois, tive prazer em ver.

Acho que todo sujeito que tiver dinheiro para ir assistir ao meu filme, tem condições de entender perfeitamente. Glauber Rocha sobre A Idade da Terra.

Coisas extraordinárias acontecem com pessoas extraordinárias.

— Juan, eu preciso resistir, vencer a intolerância, vencer a maldade humana, vencer o egoísmo, vencer a morte, mesmo que seja com a minha vida.

Mas eu me sinto marginal dentro da minha própria tribo, quer dizer, se não me absorvem me matam, fica isso. Eu sempre que penso no Brasil eu penso na minha morte e quando penso no Exterior eu penso na minha vida. Eu partirei em busca de uma relação onde eu possa me desenvolver, porque eu não sou mártir, eu não curto ser crucificado, o meu Cristo é a ressurreição, não é a cruz.

Eu estou na alça da mira, mas prefiro ser um cadáver do que um desses mortos-vivos que andam por aí.

O homem justo não pode ficar calado. Atrás do silêncio da gente, os mortos começam a se amontoar.

Estão confundindo minha loucura com minha lucidez (...) talvez esteja havendo confusão entre loucura e lucidez. A minha lucidez e informação é grande. Vivo hoje num universo cibernético bastante aparelhado.

Fiz o que Figueiredo faria se estivesse aqui. Botei para quebrar. Somos uma país pobre, mas não temos o direito de calar diante de uma indústria dos países ricos.. Glauber Rocha no Festival de Veneza.
E também não quero mais saber da polêmica cultural brasileira. Ela se resume em discutir se a sunga do Gabeira é mais transparente do que as calcinhas ou o sutiã do Caetano Veloso. Estamos em pleno ridículo cultural e isso tudo já era. Aproveito a Manchete para dar um adeus definitivo à vida cultural brasileira. Vocês não me verão mais, nunca mais.

 

 

gr2  

 

 

 

 

 

 

 

 

 

É inútil epitetar: não há glauberianos.

 Sinopse por Mário Pacheco 
 Demasiado no trabalho e no vício. A exege glauberiana, que não é menos complicada que a dos sábios, cindia e decifrava o destino da humanidade.
 

 

 

 

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