Trecho da peça Jango

Trecho da peça Jango
(Glauber Rocha )


Jango: — Porque aumentei o salário do proletariado, hoje me acusam de comunista. Dr. Getúlio me explicou porque era obrigado a pedir a renúncia e compreendi. Nos porões do Catete, reinavam Gregório Fortunato, o negro anjo da guarda de Getúlio, a política militar, a polícia civil.

Dr. Getúlio era vítima de sua polícia. Por que Gregório resolveu por conta própria matar Lacerda? Quem estava por trás de Gregório? Será que a família do dr. Getúlio me ama como ele me amava? Ele me amava como a um filho. Talvez a família tenha ciúme.

Talvez o senador Tancredo Neves possa me ajudar. Tancredo, Tancredo. Podes me ajudar? É longa a agonia do exílio: deposto, expulso de minha terra, as palmeiras do sabiá. Botem uma música do Chico ou do Tom Jobim... Aquela... Vou voltar... Para o meu lugar... Sei que um dia vou voltar... Foi lá. Não quero choro nem velas. Não quero emoções fáceis na minha chegada, não quero escolas de samba, não quero carnaval. Que tudo seja feito discretamente para evitar movimentos de massas... Que tudo seja feito na melhor tradição da nossa pacífica democracia...

O Coro: — Você não vale mais nada. Não passa de um retrato na macumba das fábricas. Você já era. O Brasil cresceu, vai pra frente. O Brasil é um país independente. Morremos no paraíso. Ai, ai, ai, ai...
Prolongadíssimos gritos fúnebres. Movimento de balé funeral. Luz clara. Orquestra dilacerante.

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