LYGIA CLARK: TEORIA DA EVOLUÇÃO
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Lygia Clark 1920-1988
Teoria da evolução
No princípio, era um quadro. Apenas um quadro bidimensional, como todos os outros, composto de um chassi de madeira, uma tela de pano, uma moldura. Sobre ele, a imagem multicolorida, ligeiramente distorcida, mas que deixava visíveis todos os detalhes do objeto proposto como tema.
Com o correr do tempo, foi retirada a moldura. Elemento estranho à criação do artista, a moldura maquiava o produto final, acrescentando qualidades que não lhe eram próprias, ou escamoteando a beleza natural do quadro, que tinha de competir com elemento estranho, a ele incorporado.
Excluída a moldura, o quadro se sentiu livre para ganhar o espaço. O chassi também deixou de existir e, com ele, foi-se igualmente a tela. Agora, pedaços de madeira pintados a pistola eram sobrepostos, um ao outro, em cores, posições e tamanhos vários, dando um caráter tridimensional à obra. Já não se sabia mais onde terminava a pintura e onde começava a escultura.
Porém, havia ainda uma barreira a ser transposta: aquela que separava o elemento ativo – a obra – do elemento passivo – o espectador. E o criador acrescentou à criatura algumas dobradiças, o sopro de vida que tornava viva a obra de suas mãos, dando-lhe movimento próprio. Agora, o público não apenas olhava como também participava da obra, experimentando-a com as mãos e alterando-lhe a forma.
Depois, veio a arte que se podia vestir, os parangolés, que eram capas e faixas, pintadas e colocadas ao dispor do público para que este as usasse, tornando-se o espectador uma parte integrante da própria obra do artista!
Tudo parecia acabado, mas não. A obra de arte deixou de ser uma peça viva que podia ser ser apalpada, modificada e vestida, passando a ter agora numa quarta dimensão, que transcende a matéria para adentrar ao espírito, trazendo um desbloqueio psicológico com objetivo de libertar a alma. Assim, a arte, que experimentara a psicologia, caminhava para um produzir um efeito transcendental, bem mais próximo da religião.
Este pode ser, com muita propriedade, um resumo da trajetória de Lygia Clark, nos seus 40 anos de atividade artística, bruscamente interrompida pela morte prematura, ocorrida aos 69 anos de idade.
Pintora, escultora, pedagoga, psicóloga, guru tropical ? Talvez, tudo isso, com os ingredientes dosados em proporções ideais, levando a experimentação a campos nunca dantes imaginados.
Burle Marx, ao seu dispor
Lygia Cark nasceu em Belo Horizonte (MG), no ano de 1920, recebendo todo preparo e educação necessários para tornar-se uma boa dona-de-casa. Casou-se, como a maioria das mulheres, e dedicou-se à profissão do lar.
Já tinha três filhos e 27 anos de idade quando, mudando-se para o Rio de Janeiro, teve ocasião fortuita de conhecer Burle Marx, pintor, escultor, cantor de ópera, paisagista, e tudo mais que se possa imaginar.
Lygia encantou-se com a versatilidade deste homem dos sete instrumentos, que manejava todos com invulgar competência, dando um toque profissional em tudo o que se punha a fazer.
Burle Marx, por sua vez, dispôs-se a dar a Lígia aula de pintura e, como não sabia separar suas várias qualidades em módulos estanques, ultrapassou os limites das tintas e telas, passando à aluna conceitos artísticos muito além do prometido, abrindo com isto perspectivas de desenvolvimento jamais sonhadas por ela.
Um estágio em Paris
Com uma estrutura razoavelmente sólida e variada, em 1952, a jovem artista viajou a Paris, com uma recomendação especial ao pintor Arpad Szenes (1897-1987). Judeu e fugitivo da perseguição nazista, Szenes, com sua esposa Maria Helena Vieira da Silva (1908-1992) morou no bairro de Santa Teresa, Rio de Janeiro, entre 1940 e 1947.
Era um período de florescência de novos artistas na cidade maravilhosa e a presença de veteranos, como Arpad Szenes e Lasar Segall (1891-1957), muito contribuiu para o desenvolvimento daqueles que davam seus primeiros passos em terreno tão difícil e espinhoso.
Agora, em Paris, o respeitado pintor acolhia com simpatia artistas brasileiros que atravessavam o oceano em busca de aperfeiçoamento. Mas não era um homem de facilidades. De uma rígida disciplina, que impunha a si mesmo e aos outros, não cedia, não tergiversava, não fazia concessões à arte senão da maneira como ele a entendia. Se alguém o desejasse, que o aceitasse como tal, que ele não era de adaptar-se para agradar os demais.
Assim, em comparação a Burle Marx, Szenes era exatamente o reverso da medalha, algo que a pintora precisava experimentar para domar sua arte. Lygia tomou aulas com ele e, paralelamente, estudou também com Fernand Léger e Isaac Dobrinsky, sentindo-se finalmente segura para, ali mesmo na França, realizar sua primeira individual, no Institut Endoplastic, que foi, por sinal, muito bem recebida pela crítica.
No Brasil, alçando voo
"Flashbacks p/ Lygia Clark"
2014 - 5 maio
2007 - 4 abril
O diário erótico de Lygia Clark
(Celina Côrtes - Istoé)
2006 - 15 fevereiro
A Amostra Tropicália em Londres reúne obras de Hélio Oiticica, Lygia Clark, Lygia Pape e Antônio Dias.
2005 - Outubro
Na imprensa francesa, Tunga é considerado pelos críticos um artista “barroco”, “herdeiro longínquo de Oiticica e de Lygia Clark”.
2001 - 13 dezembro
Daniela Name (O Globo) - Em leituras apressadas do neoconcretismo, Hélio e Lygia Clark aparecem como os pilares do movimento, e os outros, em segundo plano. A senhora se ressente disso?
Lygia Pape: Isso acontece porque os dois morreram, o Hélio de forma trágica. Mas ainda há Amilcar de Castro, Franz Weissmann e a Lyginha aqui, né? O Carvãozinho (o pintor Aluísio Carvão) agora também morreu e tem que ser reconhecido. Cada um de nós tem sua leitura. Mas acho que muita gente fica incomodada é com a intensa carga poética do neoconcretismo. Andaram saindo uns artigos horríveis...
1994
Reconhecimento mundial
Texto de Paulo Victorino)
Polêmica e controvertida, como poucos artistas chegam a ser, Lygia Clark logrou obter publicidade e, ao fim, o reconhecimento mundial de seu trabalho.
Além de várias individuais, realizadas em Paris, Rio de Janeiro, Nova York, Stuttgart, Londres, Belo Horizonte, assim como participação em incontável número de coletivas, a artista teve o reconhecimento de sua obra prolongado após a morte, ocorrida no ano de 1988.
A 22ª Bienal de São Paulo, em 1994, dedicou-lhe sala especial. Em 1997, Manolo Borja-Villel, da Fundação Tapies (Barcelona) organizou uma exposição itinerante com obras da artista, a qual, após fazer sucesso na Espanha, transitou por Portugal, Holanda e finalmente Brasil, com apresentações no Rio e em São Paulo.
Não há na vida de Lygia Clark lances dramáticos, que possam resultar numa história apaixonante. Há sim, um roteiro racional, calculista, com uma determinação quase que científica, em que a artista só arrisca um novo patamar depois de haver estabelecido e consolidado o patamar anterior. Aí está um de seus principais diferenciais em relação aos demais artistas que povoam nossa história.
Anos 80
Em 1988, morreu a artista plástica Lygia Clark.
• Nos anos 80, Waly Salomão escreveu Gigolo de bibelôs que fez sucesso e retomou as parcerias musicais com Lulu Santos, Cazuza e Roberto Frejat. Dirigiu shows de Marina Lima, Zizi Possi, Cássia Eller e por último Adriana Calcanhotto para quem vendeu uma escultura de Lygia Clark.
1976
De volta ao Rio de Janeiro, parecia que a experiência havia chegado ao fim quando, em 1976, tal como aconteceu com O Alienista, de Machado de Assis, Lygia Clark deu uma guinada de 180º. Renegando todas as experiências anteriores, ela passou a declarar-se uma «não artista» e encaminhou todos seus conhecimentos para o trabalho de terapia ocupacional.
Ato contínuo, montou no Rio de Janeiro um consultório, onde reunia grupos de pacientes, aplicando neles os mesmos testes que fizera com os visitantes de suas exposições.
As reações foram as mais contraditórias. Sempre houve quem protestasse contra o que se designava como mistificação. Registrou-se, em um ou outro momento, problemas com a aplicação desse tratamento em gente mais sensível e sugestionável. E, como acontece em tal processo, também houve reações positivas, resultando em melhora no estado de alguns pacientes que se submeteram à nova terapia.
1970/75
Entre 1970 e 1975, Lygia lecionou na Sorbonne, em Paris, ultrapassando os limites da arte, para buscar em seus alunos reações que trouxessem à tona impulsos reprimidos, substituindo-os por energia criativa. Tudo era válido na busca dessa transformação. Estimulava os discípulos a usar elementos até então estranhos em uma sala de aula, tais como tubos de caça submarina, saquinhos de plástico cheios de água, bolinhas de pingue-pongue e outros materiais fora da didática convencional.
1973
Baba antropofágica, experiência sensorial concebida por Lygia Clark
Hélio Oiticica e Wally Salomão durante as filmagens de H.O" de Ivan Cardoso
O crítico Mário Pedrosa, que organiza o Museu da Solidariedade, no Chile, a pedido do presidente Salvador Allende, é enquadrado na Lei de Segurança Nacional. O governo brasileiro proíbe que obras nacionais cheguem ao Chile. Artistas residentes em Paris, como Franz Krajberg, Lygia Clark e Sérgio Camargo, furam o bloqueio.
• Rubens Gerchman em seu ateliê, onde mora até 1973 com a mulher e dois filhos, hospeda Hélio Oiticica, Lygia Clark e Glauber Rocha.
1972
- então eu me lembrei que iria ver os filmes de ivan na casa de lygia clark. não é domingo? onde está ana? (torquato neto).
• Lygia Clark, é a primeira a dizer a Wally Salomão que seu livro, Me segura qu’eu vou dar um troço, é muito denso.
1971 - Junho
Em Nova York, Rubens Gerchman vai morar no apartamento 250 da rua Bowery, esquina da Spring Street e vê nascer o Soho, ponto de encontro artístico.
1968
Rubens Gerchman muda-se para Nova York. Esteve lá com outros brasileiros de destaque, como Lygia Clark e Hélio Oiticica.
Lygia Clark, Dialogue, 1968. (Photo: Huber Josse)
1967 - 11 outubro
Conduzida pela análise da produção de vanguarda no eixo Rio-São Paulo, a exposição Nova objetividade brasileira congrega no MAM do Rio 47 artistas, como Lygia Clark, Nelson Leiner e Waldemar Cordeiro.
Ainda em 67, participa do Ciclo de Estudos da Arte Brasileira: Galeria Macunaíma, junto com Ivan Serpa, Rubens Gerchman, Carlos Vergara, Carlos Zilio, Antônio Dias, Antônio Maia, Hélio Oiticica, Lygia Pape, Roberto Magalhães, Solange Escosteguy, Carlos Escosteguy, Wesley Duke Lee entre outros.
1966 - março
Com o apoio técnico dos arquitetos André Lopes e Eduardo Oria, Carlos Vergara vence o concurso para execução de um mural no auditório da Escola Nacional de Saúde Pública, em Manguinhos (RJ), com projeto de painel realizado com tubos de PVC, medindo 4m de altura por 18m de comprimento. O júri é composto por Flávio de Aquino, Lygia Clark e Lygia Pape.
1960
A década se inicia sob a influência do movimento neoconcreto, fundado um ano antes pelos cariocas dissidentes do concretismo, liderado pelos paulistas. Encabeçado por Lygia Clark e Hélio Oiticica, o movimento forja a arte de Carlos Vergara, Antônio Dias, Roberto Magalhães, Rubens Gerchman. Nos anos 60, a cultura de massa impregna a criação, através da pop art, e a figura é retomada na produção brasileira.
1956
Lygia participa da Exposição Nacional de Arte Concreta e, a partir daí, vai rapidamente evoluindo do Construtivismo para o Concretismo, avançando em experiências mais arrojadas e testando a capacidade de interação do público com a sua obra.
Chegou a um ponto em que o próprio movimento concretista representava limites à sua liberdade de criação e, em 1959, rompeu com ele, assinando, com Ferreira Gullar e outros, o Manifesto Neoconcreto.
Hélio Oiticica é o artista carioca que funda, o Grupo Neoconcreto com os também artistas Amilcar de Castro, Lygia Clark e Franz Weissmann.
Tratava-se de um novo movimento, que se iniciou com mostras no Rio de Janeiro, São Paulo e Salvador e que se dizia «nascido de uma necessidade de exprimir a complexa realidade do homem moderno dentro da linguagem estrutural da nova plástica. »
O espaço é o infinito, o tempo é a eternidade
A partir de sua adesão ao Neoconcretismo, a arte passou a ser, para Lygia Clark, um laboratório onde se desenvolviam contínuas experiências de ação e reação envolvendo de um lado a obra exposta e, de outro, o espectador curioso e atônito.
Passo a passo, foi-se concretizando toda a evolução a que nos referimos no início. O público, chamado a participar, não se fez de rogado e em breve havia uma integração quase que total entre os visitantes e os objetos expostos, que podiam ser tocados, manipulados e vestidos.
1954
De volta da França ao Brasil, no Rio de Janeiro realiza outra individual no Ministério de Educação e Saúde e, em 1954, ingressa no Grupo Frente, de Vanguarda, que preservava a liberdade de expressão. O grupo era formado inicialmente por Lygia Clark, João José da Silva Costa, Hélio Oiticica, Abraão Palatnik, Ivan Serpa, Décio Vieira, Lygia Pape, Franz Weissmann, Eric Baruch e Aloísio Carvão. Os teóricos do grupo eram o crítico Mario Pedrosa, e o poeta e crítico de arte Ferreira Gullar.