A Geração Beat mudou o meu futuro - Paul Bowles

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A Geração Beat mudou o meu futuro - Paul Bowles (1910-1999)
Transgressor/iconoclasta/imoralista vibrante/desinibido/desreprimido
(Mário Pacheco)


 

 Uma pessoa está sempre a mudar e nunca chega a parte nenhuma.
Mas chegar a algum lado não é necessário.
Morrer sim.
Tudo o que é inevitável é necessário. (Paul Bowles)

Em 1979, eu tinha 15 anos e andava amargurado por não ter prestado o teste para admissão num estágio do Banco do Brasil que a Professora Virgínia, do terceiro ano do segundo grau havia me inscrito. Três anos depois nu na fila de exames orais do exército também repeti essa ambiguidade desleixada com o futuro, quando literalmente me agarraram! Eu disse   — Eeehepa man! Não sirvo pra isso! Consegui a dispensa e jurei a bandeira no pátio da Administração e lá mesmo recebi a reservista.

  — Não e não mesmo! Não foi assim... Meu 3/4 saiu horrível e com vergonha de imprimi-lo na reservista disse que o perdi e o mesmo para o meu pai que novamente me deu a grana e dessa feita eu usei um terno ensebado de lambe-lambe que é a foto que está nos meus arquivos confidenciais.

Ao final dos anos 70, eu orgulhosamente conversava com Osmar/Zenas/Anísio/Delôr, trafegantes noturnos arrolados nos capítulos de uma vida boêmia e imaturamente decadente no Guará. Sem acesso aos livros, falávamos de Beatles, Jack Kerouac, de Allan Ginsberg e Jorge Mautner e um pouco mais tarde Renato contou-nos de William Seward Burroughs, mas "sabíamos tudo" via imprensa nanica: "Timothy Leary está em liberdade"; "John Lennon está gravando de novo", "o barato agora é um tablete colorido".

Maurício Melo escrevia seus versos urbanos e colaborava na divagação das lendas. Cécé era o autêntico Beat talvez o único Beat que eu tenha deitado os olhos e sua cimitarra no grupo de rock, Extremo. Isso era o Guará I e II dos fatos e das drogas possíveis e também batidas policiais e porque não prisões e suicídios?

Voltando ao passado recente, Paul Bowles foi um dos últimos Beats que eu li/conheci. Consegui a edição de "Um amigo do Mundo" no Quiosque Cultural do Conic. Com sua leitura a estranha experiência vivencial e a psicadélica antropologia de Paul Bowles entranharam em mim como a névoa de um cachimbo. Dificilmente o leitor não se identifica ou aprende com as situações inusitadas, próximas e inevitáveis que fatalmente algum dia enfrentaremos, uma espécie de curso de mil e um dias e noites para a morte ou a vida.

Em 1992, Paul Bowles ensaiou uma volta, editando uma curta novela e escrevendo a música para uma produção árabe da tragédia grega Hipólito. Ainda em Tânger, Paul Bowles, morreria sete anos depois em 19 de novembro de 1999. Desde 1947, refugiado em Tanger. Sua rotina consistia em receber em seu apartamento diversos andarilhos culturais de todas as partes do mundo, inclusive do Brasil;   — Cadê os meus direitos autorais!, que após lerem os seus relatos tinham em mente caminhar pelas vielas de Tânger conversando com o autor.

Músico - Intectual marginal norte-americano sobrevivente do círculo de intelectuais da Paris dos anos 20. Ex-crítico musical do jornal "The New York Herald Tribune", teve sua carreira impulsionada quando ouviu de Gertrude Stein que seus escritos não eram poesia.

 

Jane Bowles
por Mário Pacheco

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Em 1938, Paul se casou com Jane Auer Bowles, a talentosa escritora judia e, como ele, homossexual, tinham inúmeros relacionamentos extraconjugais. Depois do casamento, Paul Bowles abandona a Universidade e parte para a Europa, misturando-se à comunidade de escritores e artistas que viviam em Paris, onde compõe trilhas para peças de teatro e filmes. Pouco tempo depois retorna para New York e se firma como compositor. Agora escritor, compositor, comunista depois de uma visão em um sonho exila-se em Tânger, encravada entre o paraíso e o Estreito de Gibraltar, esta cidade também permeou os sonhos oníricos de Brian Jones, líder daquela mofenta bandinha barata de blues inglês.

Situada no ponto de encontro do Oceano Atlântico e o Mediterrâneo, Tânger domina o estreito de Gibraltar. A sua proximidade da Europa, alguns 14 Km, permitiu-lhe ter desde a antiguidade laços privilegiados com o continente. Entre 1923 e 1956, a cidade foi colocada em regime de administração internacional. Cruzamento marítimo e cultural entre os continentes europeu e africano, Tânger é o primeiro porto de viajantes de Marrocos.
Nos anos 1940, Tânger, foi a escolha por excelência de artistas e escritores estrangeiros, em torno do círculo de amigos dos Bowles estavam artistas, escritores, músicos e figuraças dos Estados Unidos, Reino Unido e Canadá; Tennessee Williams, Jacques Majorelle, Paul Morand, Jean Genet, Truman Capote, Brian Jones, Bernard-Henri Lévy, Cecil Beaton, Gregory Corso, William Burroughs, Jack Kerouac, Allen Ginsberg, Ira Cohen (poeta Beat e fotógrafo), Oliver Smith, Barbara Hutton, the Comtesse della Faille (aristocrata), Libby Holman (cantora), Alfred Chester, Gore Vidal, Edouard Roditi, Ned Rorem, Brion Gysin, Jay Haselwood, Christopher Wanklyn, Marguerite McBey, Joseph McPhillips, John Hopkins (novelista), David Herbert e Virgil Thomson. Todos carregados pelos seus próprios ideais românticos de arte e aventura que procuravam os dois apartamento do casal Bowles.

Em 1951, William Burroughs - brincando ou propositalmente de Guilherme Tell com a mulher, ela com uma taça de champanha na cabeça, ele com um revólver - acertou um tiro no meio da de Joan; Joan Adams, uma amiga de Edie Barker, que se tornara a primeira mulher de Jack Kerouac, largou o marido e passou a viver com Burroughs. Três anos fugindo pelo mundo até se mandar para Tânger! Estava montanda uma filial dos beats tendo Paul Bowles como padrinho literário, principalmente de William Burroughs e Allen Ginsberg.

Outra tragédia amarga, em pleno ramadã de 1957, por excessos Jane Bowles, sofre um derrame e nunca mais recupera a saúde física e mental. Ciúmes pelo marido ter tomado-lhe a glória literária e uma crise criativa agravada pelo álcool comprometeram a sua carreira. Jane Auer Bowles, morre numa clínica psiquiátrica, em Málaga, em 4 de maio de 1973, aos 55 anos. A morte de Jane pôs fim a carreira literária de Paul Bowles. Não tinha mais a quem mostrar suas ficções.

Louco de haxixe que fumava todos os dias, Paul Bowles explorou o poder alucinógeno das drogas, o complexo de perseguição paranóico e as relações conflituosas entre pais e filhos: o pai de Bowles tentou matá-lo quando tinha apenas seis semanas de idade, mais tarde na infância magoava o filho para testar sua autoridade perante a família e o ódio entre pai e filho encontrou terreno fértil no cotidiano familiar e se enraizou de tal forma que, aos dezenove anos, Paul Bowles atirou uma faca de cozinha sobre o pai, felizmente sem atingir o alvo. Seu humanismo final: ser enterrado em meios aos animais uma vez que o Mulçumanismo não permite a cremação.

Biografia

"Tantos caminhos", editora Martins Fontes

Indicação de leitura

"Up above the world", publicado nos anos 60, se passa na América Latina.
"Que venha a tempestade", editora Rocco;
"O céu que nos protege", editora Rocco;
"Um amigo do mundo" - contos reunidos, editora Rocco;
"Chá nas montanhas" - com introdução de Gore Vidal, Editora Rocco.
"Muito longe de casa" - novela curta e avassaladora que o escritor lançou em 1992.


Filmografia

"The Sheltering Sky" adaptado para o cinema, em 1990, pelo diretor italiano Bernardo Bertolucci, sem atingir a aprovação de Paul Bowles que preferia o "Almoço Nu" de Cronenberg.

 

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Trecho Capote Uma Biografia - Gerald Clarke, editora Globo,1993, tradução: Lya Luft

A única coisa que tornava a vida suportável nesse lugar era a presença dos Bowles, um dos casais mais interessantes dos meios literários norte-americanos. Apesar de naquele casamento não existir sexo, isso em nada diminuía a notória devoção que um sentia pelo outro. Ele era compositor e escritor, e ela, escritora e dramaturga, dona de um estilo surrrealista e alucinante que já contava com um pequeno porém fanático séqüito de admiradores. Um dos mais fiéis era Tennessee, que a considerava a melhor autora de ficção dos Estados Unidos.   — Podem me chamar de louco, disse ele em suas memórias, mas eu prefiro ficar com ela. Truman não chegava a esse ponto, mas também a colocava entre as usas autoras prediletas, logo depois de Willa Carther e Edith Warton.   — Não existe ninguém como Jane Bowles, disse ele.   — Seu pensamento é bizarro, tanto nos textos quanto pessoalmente. Talvez essa loucura, no sentido filosófico e não clínico, a impelisse para obsessões tão ridículas que até mesmo Truman as achava divertidas. Como uma das personagens endemoniadas de seus livros, ela se envolvera numa relação estranha com uma nativa exageradamente alta, que tinha um leve bigode e era muito, muito feia. Ainda por cima usava jeans e sapatos de golfe marrons sob o manto bebere. Diariamente Jane ia ao mercado de cereais, onde a mulher tinha uma barraca, oferecia-lhe presentes e prestava-lhe homenagens. Voltava na hora do jantar e contava, morrendo de rir, a quantas andava a sua campanha. 
 

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