Crônica: “O que é Dom Casmurro?” (2014)
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Crônica: “O que é Dom Casmurro?”
por: Marcelo Torres [(This email address is being protected from spambots. You need JavaScript enabled to view it.)]
- Amiga, você soube do Big Brother ontem?
- Não assisto Big Brother, amiga...
- Eu também não. Só vejo de vez em quando.
- Foi uma pergunta sobre livro?
- Ué! Você não disse que não assiste?
- Eu não assisto, é que ouço o povo comentar.
- Pois é, foi uma pergunta sobre Dom Casmurro.
- E ninguém soube responder, uma vergonha!
- E uma anta ainda perguntou “o que é” Dom Casmurro! Vê se pode?
- Pois é, menina! Ô povo burro! São bonitões, mas tão burrinhos...
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Quanta maldade desse povo que assiste e/ou comenta o glorioso Big Brother Brasil! Agora, vejam só, acharam de criticar a falta de erudição dos participantes! Tem cabimento uma coisa dessa?
Numa prova cultural, o apresentador teria indagado: “Quem é o autor de Dom Casmurro?” Dizem que um rapaz passou para outro e o outro passou para o um, de modo que o apresentador pulou a pergunta.
Mas a crítica maior é contra uma das participantes, que entrou no meio da conversa, empinou a bunda e os seios e perguntou do alto da sua cultura: “O que é Dom Casmurro?”
O nome dela: Poliana, uma miss paranaense.
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Ora, gente, Poliana – a da literatura – foi uma personagem que sempre via o lado bom das coisas. Então, Poliana sabia que Dom Casmurro é um livro, quem não sabe disso? A pergunta era quanto ao gênero literário.
O que é Dom Casmurro? É uma autobiografia? É um livro de contos? Um romance? Ou é uma novela literária? Será um ensaio? Foi isso que pensou Poliana do reality show quando perguntou o que é Dom Casmurro.
Agora, esse povo maledicente fica aí galhofando da pobre miss, mas eles mesmos não sabem nada sobre a obra. No trabalho, numa mesa de bar, na fila do banco, no banco da igreja ou até no da faculdade, imaginemos alguns diálogos...
- Ana, você sabe o nome de Capitu?
- Ora, João, o nome de Capitu é Capitu!
- Não senhora! Capitu é o apelido de Capitolina.
- Ivo, que personagem amava os superlativos?
- Superlativos?
- Sim, superlativos: lindíssimo, atualíssimo...
- E tinha isso no livro, Antônio?
- Claro, Ivo! É uma das coisas mais divertidas.
- Não lembro. Faz um tempão que li...
- Pois é, o homem dos superlativos era José Dias.
- Wesley, quem era Dom Casmurro?
- Seria um amigo de Machado de Assis?
- Entenda, qual personagem era o Dom Casmurro?
- Ora, ora, Dom Casmurro era Dom Casmurro, uai!
- Não, Wesley, Dom Casmurro era Bento. Ou Bentinho, para os íntimos.
- Cris, você sabe o que é “casmurro”?
- Como assim: “o que é”?
- O significado de “casmurro”.
- Sei lá! Seria um corno, chifrudo?
- Ele até desconfiava disso, mas casmurro significa outra coisa.
- Então desembucha! O que é casmurro?
- É o homem quieto, calado, desconfiado.
- Magda, você sabia que existe o verbo “casmurrar”?
- Sério, Pedro? Eu nunca ouvi falar.
- Pois é, existe.
- E como é que conjuga esse trem?
- Eu casmurro, tu casmurras, ele casmurra, nós casmurramos, vós casmurrais, eles casmurram.
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É muita falta de compreensão desse povo! Em se tratando de Poliana, sempre é possível olhar o lado bom das coisas.
Se Sheherazade, não a da literatura, mas a do SBT, disse que é compreensível a ação de justiceiros que tiram a roupa, cortam a orelha e acorrentam um pivete de 15 anos, por que não seria compreensível essa perguntinha singela da Poliana do BBB?
- Ora, é mais que compreensível! - exclamaria José Dias. – É compreensibilíssimo! – concluiria o homem que amava os superlativos.
- Compreensibilíssimo!
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