LAWRENCE FERLINGHETI, NOVO LIVRO AOS 100 ANOS
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LANÇAMENTOS
AMERICANA QUE REDEFINIU A LITERATURA QUEER, EILEEN MYLES É LANÇADA NO BRASIL
Romance e antologia poética da escritora chegam ao país
Bolívar Torres — O Globo
Eileen Myles, em foto de 2016: poeta sofreu preconceito de editoras ao escrever 'Chelsea girls', nos anos 1990 Foto: EMILY BERL / NYT
30 abr. / 2019 — RIO — Quando chegou às livrarias americanas, em 1994, Chelsea girls ganhou resenhas positivas, mas quase sempre com ressalvas. Primeiro livro de ficção da poeta Eileen Myles, o livro é uma inclassificável mistura de romance, memórias e autobiografia. A narradora, que também se chama Eileen, alterna flashes e casos de sua infância no interior dos Estados Unidos com relatos da boemia artística nova-iorquina, entre drogas, delinquência, dificuldades financeiras e sexo entre mulheres.
Talvez pela falta de costume de ver uma mulher — ainda por cima lésbica e oriunda da classe operária — falar tão abertamente de sua própria vida, a crítica da época fez questão de ver “ego” e “narcisismo” no projeto da autora. Vinte e cinco anos depois, no momento em que é editado no Brasil pela primeira vez, o cenário é muito diferente: Chelsea girls virou um marco dos anos 1990, responsável por redefinir conceito de “literatura queer” e antecipar tendências do romance contemporâneo, como a autoficção.
Hoje cultuada por escritores de diferentes gerações (de Deborah Levy a Ben Lerner), Eileen é enfim apresentada ao leitor brasileiro em duas facetas. Além de Chelsea girls, que sai pela Todavia com tradução de Bruna Beber, um balanço de sua trajetória poética aparece em Por qual árvore espero, que a editora Jabuticaba coloca em pré-venda a partir da semana que vem.
— Acho que havia certa misoginia e preconceito de classe nessas críticas a Chelsea girls — avalia Eileen, em entrevista por telefone, do Texas. — Mesmo tendo poucas cenas de sexo no livro, passaram a me definir como uma autora que escreve sobre sexo o tempo todo. Porque não estavam acostumados a ler sobre sexo de uma perspectiva feminina. Até os escritores gays de São Francisco diziam: “quem quer saber da sua vida de lésbica?”. E eu pensei: bom, se você tem um problema com a nossa existência, talvez não queira saber mesmo. Eu diria que o livro foi amado em alguns círculos, mas o mainstream de modo geral não sabia muito bem o que fazer com ele.
'Chelsea girls' Foto: Reprodução
Eileen havia desembarcado de sua Boston natal em Nova York em 1974, com o objetivo de “se tornar poeta”. Vinte anos depois, com seus versos já admirados por nomes como Allen Ginsberg, tentou dar um salto para a prosa. A ideia era escrever um On the road para garotas” — não só porque admirava Jack Kerouac, mas porque queria que Chelsea girls tivesse “o mesmo bang , o mesmo buzz ” do clássico beat.
Mas faltava combinar com as editoras, que em um primeiro momento se incomodaram com a liberdade narrativa do livro. Em uma prosa poética, sem ordem cronológica, ela segue diferentes Eileens em diferentes momentos da vida. A criança que se vê como “Guerreira de Luz” e sonha ser a próxima Joana D’Arc em uma pequena cidade povoada por existências medíocres; a adolescente descobrindo sexo e o álcool na América Profunda dos anos 1960; e a adulta tentando sobreviver no Lower East Side dos anos 1970-1980, sempre quebrada financeiramente e afetivamente.
Os capítulos se sucedem como instantâneos de um álbum de fotografias voluntariamente mal organizado. A autora olha para trás e reflete sobre suas experiências, mas sem nenhum desejo de unidade ou totalidade. E, principalmente, sem lições de vida.
— Eu não conseguia um agente, os editores não queriam saber de mim — lembra Eileen. — Teve um que se interessou, mas foi muito condescendente comigo. Queria que o livro tivesse um arco narrativo, que a personagem tivesse que conquistar algo, aprender algo. Só publicaria se retrabalhasse todo o texto, fazendo uma censura profunda, profunda... Ia transformá-lo em algo normal.
Mas Eileen estava cansada de esperar a “permissão para fazer as coisas”. Encarnando sua Joana D’Arc interior, procurou outras editoras e acabou caindo nas graças da Black Sparrow, famosa por editar Charles Bukowski. Hoje, Chelsea girls costuma ser visto como “a quintessência memorialística do Lower East Side”, mas é importante notar que faz isso do ponto de vista de uma mulher queer . Não por acaso, a escritora britânica Deborah Levy diz que o livro é “a peça perdida para qualquer um que só tenha lido escritores homens da geração beat”.
— [O Lower East Side dos anos 1970-1980] foi o fim de um momento do qual não se tinha cópia — Tínhamos esse sentimento de cena, de reunião, de culto. A gente se sentia numa comunidade, era só sair na rua para encontrar os amigos. E, parte do motivo por que escrevi Chelsea girls é porque eu era parte de tudo isso, mas também consciente de que eu era mulher, queer e um tanto à margem da história que eu estava contando. Eu sabia que estava sendo tanto historiadora quanto artista enquanto o escrevia.
Capa de 'Por qual árvore espero' Foto: Reprodução / Internet
Em maio, Eileen ganhará sua primeira antologia em português, Por qual árvore espero. Com tradução de Mariana Ruggieri, Camila Assad e Cesare Rodrigues, a edição é baseada no livro I must be living twice, que condensa poemas de 1978 até 2012. Se Chelsea girls tem um recorte específico do agito de Nova York, a coletânea destaca poemas com tom político (como o famoso “An American poem”, na qual Eileen se coloca como membro da família Kennedy que larga a vida burguesa para viver como poeta). Vale lembrar que, em 1992, a autora se lançou como a primeira candidata “assumidamente mulher” à presidência dos EUA, numa histórica e divertida performance.
— Eileen transita muito bem entre o lirismo, o humor, a militância política, a questão da sexualidade, sem ser piegas em nenhum momento — dia Camila Assad.
SERVIÇO:
Chelsea girls.
Autora: Eileen Myles. Editora: Todavia. Tradução: Bruna Beber. Páginas: 256. Preço: R$ 59,90.
Por qual árvore espero. Autora: Eileen Myles. Editora: Jabuticaba. Organização: Mariana Ruggieri. Tradução: Mariana Ruggieri, Camila Assad e Cesare Rodrigues. Páginas: 86. Preço: R$ 30.
LAWRENCE FERLINGHETI, POETA DA BEAT GENERATION, ESCREVEU UM NOVO LIVRO AOS 100 ANOS
Um dos autores mais importantes da Beat Generation, foi co-fundador da icónica City Lights. Aos 100 anos, decidiu olhar para trás e escrever "Rapazinho". A edição portuguesa chega no final do ano.
Lawrence Ferlinghetti em 2012
Rita Cipriano / https://observador.pt/2019/09/03/lawrence-ferlingheti-poeta-da-beat-generation-escreveu-um-novo-livro-aos-100-anos/
3 set. / 2019 — Depois de vários anos sem publicar nada de novo, Lawrence Ferlinghetti, poeta da Beat Generation e co-fundador da City Lights, a importante editora e livraria de São Francisco, decidiu pegar na caneta e escrever um novo livro. O motivo? O seu 100.º aniversário, celebrado a 24 de março deste ano.
Rapazinho (Little Boy na edição em inglês), que terá edição portuguesa pela Quetzal, é “o testemunho e o testamento literário do maior poeta” da Beat Generation, editor de autores como Allen Ginsberg (com quem fundou a City Lights), Charles Bukowsky ou Paul Bawles. Livro difícil de definir, é de um romance (Ferlinghtetti faz questão de dizê-lo) e, em parte, uma autobiografia com recordações dispersas, torrentes de linguagem e sentimentos. “Sempre com o tom mágico da escrita de Ferlinghetti”, garante a editora, que acrescenta:
No livro, há reminiscências biográficas entrelaçadas com explosões de energia e de recordação, reflexões, reminiscências e profecias sobre o que podemos esperar da vida no futuro. É uma fonte de conhecimento literário com alusões ao mundo e à vida literária do autor, à sua geração, erros e descobertas – e um convite ao maravilhamento”.
Segundo a Quetzal — que anunciou esta terça-feira a publicação do novo livro do também pintor norte-americano durante a apresentação das novidades do grupo Bertrand, a que pertence –, Rapazinho é “um romance breve, luminoso e destinado a recordar o mundo como ele devia ser”.
A edição portuguesa de Rapazinho será publicado no final do ano, em novembro, mês em que, habitualmente, a Quetzal não costuma editar novos títulos.