Sérgio Dias: Barato de fumo relembrado

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Sérgio Dias: Barato de fumo relembrado
(Mário Pacheco)

Dois. Na estrada ninguém melhor do que frentista para apontar os caminhos.

Três... Não tente passar pelo segurança, pegar autógrafo não cola.

Quatro... Se você não receber a pulseira de acesso é bom ter um anjo da guarda, pois eles não te deixarão em paz.

11 de maio de 2.002, Brasília à Goiânia, 270 km de estradas com cachorros atropelados e esqueletos de carros nos acostamentos e putas feias pedindo carona. Três horas com a velocidade média de 100km, faz calor e rola um rendrix, um dia de serviço matado. Vimos essas estradas várias vezes e seus vales verdes e vacas e vagas vertiginosas. Curitiba, Marília, Pedro Leopoldo, Itumbiara, Porto Alegre. Gente abaixada esperando... "Cada volta há um recomeço" e em outra placa: "Na loucura da vida tudo é normal". Pé e pó da estrada, o quarto de ácido é 25 pilas. RC em ritmo de aventura?

— Não!
— Sérgio Dias no Bananada 2002!

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Passagem de som é oficina de música

Goiânia 18:00 horas. Direto ao Espaço Cultural Martim Cererê. Porta de madeira violada, Sérgio Dias conversa com Feijão ao lado da mesa de som, usa camisa azul turquesa, jeans e tênis claros e desbotados. The Jets, a banda de apoio é jovem, engraçada e corajosa. No palco, Sérgio Dias não está só, com a guitarra fender bicolor, ele tira a palheta branca da boca igual a um cubo de açúcar debaixo da língua e afunda-se no trabalho para evitar ou cobrir falhas. Sem escolta a guitarra de ouro não veio. Suas novas canções têm início, meio e fim e ele me lembra Brian Wilson e George Harrison e têm várias semelhanças com Arnaldo.

— Está distorcendo! O jetbox tem de eliminar!

— Onde está o perigo? Foi a Lurdinha quem desligou o P.A.?

— Bom menino. Depois da orquestra você abaixa o volume do teclado.

— Desculpa-me estar falando com ele.

— Do mesmo ponto 2, 3 e 4. Vamos ver o que acontece...

— 4ever! Ele ensina a pegada de uma linha de baixo e nada adianta, ainda passa pelo teclado e pede volume, depois fala:

— Você esqueceu de abaixar o volume.

— Agora, todos fora do palco...

Your guitar still gently weeps

Teatro circular pequeno e apinhado de gente. O início show é de tirar o ar dos pulmões: Cidadão da Terra, Rock and Roll City e Beijo exagerado. Sérgio Dias espertamente comanda a onda, conhece a catarse e todos se banham na luz laranja de sua guitarra. Ele nem apresenta os membros da banda. Desde o início um bêbado insistentemente pede Posso perder minha mulher...,
Sérgio pede que arrumem um cigarro para ele, seu público fiel pede novamente Rock´n´Roll City. Ele quer se livrar da sessão arqueológica, da fossilização, mas não há como fugir... Embarcam nas canções pragmáticas de seu novo álbum "Estação da luz" e o som miraculosamente melhora. As duas backing vocals curtem sua guitarra, ainda bem que não há letras em inglês, elas passaram no teste do coro em - Foreeehver.

Seu toque de guitarra é exaustivo em Filho do silêncio, uma canção de protesto e em São Paulo e Araras, suas melodias podem remeter a algum herói da guitarra, mas quem está tocando é Sérgio Dias. Seu canto discurso com a coluna inclinada em Escravo da revolução, é um velho ardil dos cantores de work songs.

La femme Lourdina e Anjos do sul, certamente farão parte das lembranças de um dos melhores shows de nossa vida.
O encerramento do show de Sérgio é o mesmo que Rita Lee e Arnaldo Baptista apresentam em seus shows. Depois de 33 anos de flutuação Ando meio desligado finalmente se tornou um clássico popular com a versão do Patofu... Sérgio Dias atende intuitivamente aos pedidos das meninas da borda do palco. Na Balada do louco ele parte para a jam alongando os solos e mostrando a língua de satisfação. The Jets podem até reclamar da qualidade do som, mas a performance da banda é baixa, onde é que estão os arranjos originais? No palco sem a sua guitarra a banda se perde e ninguém diverge da direção musical de Sérgio Dias. É um show sem intervenções.

Vídeos não capturam a energia e a vibração desta apresentação. Sérgio Dias sai satisfeito. He can't get no satisfaction! Aqueles que perderam a passagem de som podem até dizer que foi burocrático. Ao fundo, músicos do Lusbell, Autoramas, Mákina du Tempo, Juca Seqüela e Terno Elétrico, espreitam uma oportunidade de subir e tocar com seu ídolo.

Aquela menina sardenta levantaria a placa de estaile para Sérgio? E Arnô, o gato sorridente de Clarisse abanaria o rabo? Não há mais solo pirotécnico de Keith Emerson. Estamos no século XXI, nada virtuoso ou valvulado, só tecnologia e a bateria que quase não me deixa ouvir a sua guitarra.

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