MADE IN BRAZIL: 51 anos!
- Details
- Hits: 13538
Eu só quero chupar o seu sorvete
(Mário Pazcheco)
Gênese: mais ou menos em 68, 69 e 70 pencas de grupos no Rio e em São Paulo surgiram. Moleques malucos por rock como quem consome sanduíches no Bob's, vomitando um som sujo, copiando e tirando a sonoridade do The Who via Blue Cheer ou tocando Cream e Led Zeppelin, em suas Gianinis e Phelpas (o amplificador rastejante). Os americanos da Costa-Oeste rotularam de: psichedelic punk o rock gosma dos moleques. No Brasil, dos Freak Outs, Aranha e New Breeds da vida ficou... Made in Brazil, conhecido como o grupo que mais tocava música dos Stones.
Original Made in Brazil (Oswaldo, Celso e Cornelius) uma das bandas que eu mais acompanhei via recortes, só perdendo para Beatles e Mutantes. Sem contudo, vê-los ao vivo. Em São Paulo, em duas oportunidades 1985 e 1992, não coincidiu de rolar, apenas um passeio na Rua Caraíbas... Confesso ainda que não conheço integralmente seus dois primeiros discos-clássicos. Os conheço a partir do Paulicéia Desvairada e da televisão. Faz tempo, existiu um tempo em que se passavam bandas nacionais na TV do Tio Patinhas e eu vi em poucos segundos o Dudu Chermont tocando ao lado do Made in Brazil.
O intercâmbio cultural se fomenta quando uma cópia escapa ao raio de ação estadual e passa de mão em mão é o suficiente. Os velhos roqueiros sempre tiveram seus discos do Made in Brazil a mão e histórias. A maioria como músico se inspirou na banda. — O primeiro disco brasileiro a usar a distorção!
O auge da banda aconteceu no biênio 1973-74 quando adaptaram o repertório para o português e abriram para os Mutantes no finalzinho de 73, tocando para três mil pessoas no Parque do Ibirapuera, ao ar livre. Choveu torrencialmente, mas ninguém arredou o pé. "A gente não saiu do palco. O Cláudio César Dias Baptista ligou um fio terra num lago para evitar choques elétricos. Foi uma grande loucura", relatou Liminha, à revista Bizz. A apresentação do Made durou 3 horas, tendo como climax o "Sympathy for the Devil" acompanhado pela bateria da Escola de Samba "Mocidade Alegre da Casa Verde".
No ano seguinte foi a hora e a vez do primeiro disco da banda. Para Rollando Castello Júnior, este primeiro disco (do qual é o baterista) é o melhor da banda. E para ele, o Made in Brazil, naquele ano foi a melhor banda do país 1974, (canção do Terço) e ano da excursão de Miss Alice Cooper com abertura do Som Nosso de Cada Dia.
O primeiro disco do Made in Brazil, também conhecido como o disco da banana, atrasou e só saiu no final de 1974 devido a vetos da Censura Federal. Se ainda no tempo do colégio, as mães paulistas queriam manter seus filhos longe do pessoal do Made, dona Censura, estrilou, quando ouviu o verso "Eu só quero chupar o seu sorvete", trocado por imposição, por um mais ameno, "eu só quero tomar um sorvete".
1975. Inicia-se a ligação de Ezequiel Neves com o Made In Brazil. O ciclo fecha-se. Cornelius, o cantor; sai para voltar 10 anos depois. Melhor show do ano (categoria rock nacional). Revista Veja.
O Made em crise
Primeiro, o cantor Cornelius adoeceu e o conjunto teve de parar. Depois, os caras acharam que ele estava sendo vedete demais e pintou a crise. (...) Cornelius voltaria ao rock, depois de casar com a filha de um industrial paulista. Mas aí entrou a RCA, lembrando que o grupo tem contrato com ela e que, se algum elemento cair fora, todos os outros têm que pagar 50 000 cruzeiros de multa. (Revista Pop, jun. / 1975).
Tem fantasma no Made
O novo LP dos Meninos está cheio de coisas inexplicáveis, e a cada mês sofre um novo adiamento em seu lançamento. (...) Celso queimou a mão e ficou sem tocar um tempão. O vocalista, Percy, andou afônico e, finalmente, Tony da guitarra solo, andou pirando e atrapalhou os trabalhos de gravação. (Revista Pop).
As 13 bases de Jack, o Estripador, o segundo LP do Made in Brazil foram fruto de 120 horas de estúdio e dívidas idem na RCA. Melhor disco do ano (nacional) Jornal de Música - votação dos leitores.
Cornelius & Grupo Santa Fé, a 29 maio de 1976, fazem sua estréia no Festival Canindé - S. Paulo, "o maior ou o mais longo show de todos os tempos".
Muito bélicos antes do Kiss
Em 1977, no aniversário de dez anos da banda, durante duas semanas o Made in Brazil estreou o show Massacre, no Teatro Aquárius, em São Paulo (hoje Záccaro). No repertório do show a inclusão das novas músicas que fariam parte do álbum também intitulado "Massacre" - o disco nunca foi lançado até hoje! O cenário era todo baseado no título do show, com o baterista Fenilli massacrando os tambores do alto de um tanque de guerra. "Também começou a "piar" a Eloá em todos os shows. Ela ia em todos e quase sempre acabava em cana. Ela começava a dançar e, quando não tirava a roupa, tiravam a roupa dela. É uma figura estranha, dança muito, tem muita energia. Aí, ao invés dela dançar na plateia, a gente começou a chamá-la pra dançar no palco. Era um barato. (...) Depois o Percy namorou ela. Nesse ano, Dudu Chermont é incorporado à turnê tocando guitarra e teclados. São eleitos o melhor conjunto do ano pela Revista Pop.
Made in Brazil em 1968 - Cornelius Lucifer (vocal), Celso Kim Vecchione (guitarra), Nelson Pavão (bateria) e Oswaldo Rock Vecchione (guitarra) .
Nosso melhor trabalho jamais foi gravado
Ficaram distantes, os dias iniciais e as recordações ligadas ao Bob's, uma toca na Rua Augusta, onde Gil, Caetano e Gal apareciam para ouvir/ver as novas do underground. Superada a fase misóginia, eles enveredam pelo lirismo campestre dos blues de Robert Johnson. Acentua-se uma fase de glamour tupiniquim inspirada pelos Glimmer Twins. Aparato visual e publicidade periódica na revista Pop. E músicos profissionais no estúdio. Ainda na segunda metade da década de 80 do século passado, a banda já havia sobrevivido a 50 formações, um clássica tese de "o nosso melhor trabalho jamais foi gravado"...
Os últimos dois álbuns do Made in Brazil para a RCA paulista.Paulicéia Desvairada - 1978 e Minha vida é o rock'n'roll - agosto/setembro de 1980. Dariam um clássico álbum-duplo com os testemunhos e as crônicas a respeito de São Paulo, a cidade industrial que o grupo ama cada vez mais e cuja bandeira é usada como cenário do show de lançamento do LP "Minha vida é o rock'n'roll". Percy Weiss, abandonou o grupo após as gravações de "Paulicéia Desvairada", alegando a desnecessária troca de elementos. O vocalista, Caio Flávio, paulista da Vila Mariana, saiu no fim de 1979 e Oswaldo Vecchione Jr., assumiu o vocal solo. "Minha vida é rock'n'roll" é "o próprio retrato da resistência através da trincheira do rock", segundo Ezequiel Neves. A banda já adotava o rebelde figuro couro negro do heavy-metal.
"A rebeldia e o inconformismo sempre atuaram de uma maneira muito forte em nós e na maioria dos jovens que nos seguem e curtem nosso som, pois não é só de comer e patinar que se vive a vida". Oswaldo Vecchione.
Talvez por "Minha vida é o rock'n'roll" ser um somatório de conquistas e derrotas, Oswaldo Vecchione convida um distante Arnaldo Baptista para apresentarem-se ao vivo, quando atuariam juntos a 26 de dezembro de 1981, no Ginásio do Palmeiras, Arnaldo declinou do convite.
O Made in Brazil sempre conseguiu vincular suas apresentações às dos novos grupos. Se no distante ano de 1981, eles tocaram com a Banda do Lixo, Gang 90. Ao final de 1983, reuniram-se à Patrulha do Espaço em dois espetáculos no Tuca, em São Paulo. Dois anos depois, Dudu Chermont voltaria a integrar o Made in Brazil.
Do blues ao heavy - do heavy ao blues
O Made in Brazil está na ativa há 37 anos. A banda é Oswaldo Vecchione, líder inquestionável. Hoje a formação do Made in Brazil, é Oswaldo Vecchione no contrabaixo e voz, seu filho Rick na bateria (cuja estréia aconteceu em 1984, quando ele tinha 13 anos!) e na guitarra seu tio Celso Vecchione e nos backing vocals e percussão, Deborah Carvalho.
A partir de 1985, na RGE participaram da coletânea Metal Rock, gravaram o álbum de estúdio Deus salva e o rock alivia (este é o único LP não lançado em CD), e registraram o ao-vivo Made Pirata - Volumes I e II. Por vezes você encontrava um volume e o outro não, finalmente os dois foram reunidos em CD. Em 1992, na gravadora própria "Made in Brazil Records" lançaram outro álbum-duplo ao vivo In Blues, (também relançado em único CD). Estes álbuns marcavam a volta da banda ao repertório do delta do Mississipi e a abertura do próprio selo.
Em julho de 1997, aos 30 anos de carreira, eles concluíram Sexo, blues e rock'n'roll - um disco que levou dois anos e quase 250 horas de estúdio e uma no para ser lançado! Onde regravaram Mexa-se boy, versão para o clássico Mannish boy de Muddy Waters e participações especiais de Sérgio Dias, Charles Gavin, Luis Carlini e André Christovan. Na faixa Rock da Pompéia o Made in Brazil reuniu no estúdio Tony Campello, Roger Moreira, Clemente, Kid Vinil, Nasi e João Ricardo.
Em 1999, a festa de arromba se repetiu quando o Made in Brazil gravou e lançou em dois volumes o Fogo na madeira - acústico, com participação de um cast estelar da nata do rock paulista. A velha Turma da Pompéia: Sérgio Dias, Luís Carllini, Nenê, Manito, Wander Taffo, Bororó, Mozart Mello e os irmãos Vecchione se reuniram para gravar um álbum homônimo e fazer alguns shows.
Por ser um artigo curto, alguns nomes foram preservados para outra oportunidade, onde leremos um relato do guitarrista Babalú que esteve com o Made em várias estradas. Eu mesmo já perdi o In Blues emprestando para promotores de cidades satélites que algum dia conspiraram em trazer o Made in Brazil a Brasília. Na última tentativa, quando a banda participaria da festa de aniversário de um clube da cidade, o colunista musical do principal jornal, estrilou "com tanta banda de axé, logo Made in Brazil!". Isso esfriou de vez a vinda. Comentando este fato com Rodrigo Hid, ele me disse: "É como se Londres esnobasse uma apresentação dos Rolling Stones!" Falar mais o quê? Que a civilização mais absurda do planeta habita o hemisfério sul? Prefiro ouvir:
"Todos pensam que tocar rock é mole / mas vou logo dizendo que não é mole não/quem não me entende diz que a terra é do samba / e que não tem lugar pra gente". ("Uma banda Made in Brazil" - Paulicéia Desvairada).