MAMONAS DO LÚDICO-CHULO AO BURLESCO IMORTAL
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MAMONAS DO LÚDICO-CHULO AO BURLESCO IMORTAL
À medida em que a poeira emocional baixa, a trágica e prematura morte dos Mamonas Assassinas torna-se cada vez mais objeto de discussão. Qual seria a importância dos rapazes para a formulação do imaginário do povo brasileiro – principalmente de suas gerações mais novas. Depois que inventaram a mass-media, o limite entre o público e o privado tornou-se, invariavelmente, mais tênue. A morte – às vezes ao vivo e em cores – de pessoas de enorme projeção, torna-se quase tão eivada de comoções quanto o desaparecimento de um ente familiar. Exemplos? Kennedy, Lennon, Daniela Perez, Senna e por aí vai. Estranhamente, não sabemos entender porque muitos de nós, só hoje, depois do avião em que viajavam espatifou-se na Serra da Cantareira, resolvemos prestar atenção no que eles representavam.
Quando a namorada do vocalista Dinho disse, durante os funerais que “não poderia ser diferente”, a moça não quis ser ambígua no desabafo, não quis dizer que a culpa fosse do destino. Acontecer... acontece, mas eles não eram mais que um grupo de rock, eram um fenômeno nacional.
A rebeldia peculiar das crianças e jovens percebeu antes. Palavrão por palavrão, todo mundo fala. Nos colégios, nas ruas, nos campos de futebol, em qualquer lugar. O problema é que os canais de comunciação mudaram, a mensagem deixou de ser o privado hipócrita e transformou-se em público e carismático, ainda mais se considerarmos que o vírus do humor desenxabido contaminou o país em menos de um ano. Havia o marketing? Havia contingências de mercado envovlendo tanto sucesso? É claro que sim. Mas havia também uma mensagem subterrânea nas letras do grupo, que poucos se preocuparam em decifrá-la antes do desfecho da tragédia. Sarcasmo bem alto-astral ad aeternum. Sem contar que eles faziam rock’n’roll operário de primeira, cantado em português, por saudáveis mancebos, filhos de trabalhadores comuns.
Descabido eria compará-los aos Beatles, recaindo em bufonaria demagógica, como fez um ex-candidato a governador, ombreando-os a Tom Jobim.
Evidentemente que entre os garotos de Liverpool e os de Guarulhos há pontos em comum. O sucesso rápido, a alegria e espontaneidade, E a música “Eleanor Rigby”, por exemplo, que conta as desilusões de uma mulher que de tão solitária, passaria despercebida em qualquer quarteirão do mundo. O que pode perfeitamente emoldurar o anteverso do mundo dos Mamonas – óbivios demais para serem ignorados.
A comparação não passa de provocação, pois há parvos que nunca entenderam o inglês unviersal dos Beatles, como há os que jamais entenderão o sabor tupiniquim dos Mamonas Assassinas.
Apesar das palavras – e além delas – resta o travo na garganta:por quê?
(ROBERTO GICELLO – FOLHA DA SERRA – SOBRADINHO, ABRIL DE
1996)