Brazilian musician Arthur Verocai on his late-blossoming career: ‘I wanted to run away from myself’ (2022)

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"Juro que não entendo por que você quer para tirar minha foto. Eu não sou tão importante." (Arthur Verocai)
Foto de: Kristin Bethege para The Guardian

Músico brasileiro Arthur Verocai sobre sua carreira tardia: 'Eu queria fugir de mim'

por Carlos Albuquerque

Publicado em: https://www.theguardian.com/music/2022/apr/06/brazilian-composer-arthur-verocai-interview

Dica de: https://www.jerondeau.com/


Elogiado por jazzistas, artistas de hip-hop e casas de alta moda, o ressurgimento do maestro septuagenário está muito longe de sua estreia quase ignorada em 1972, cujas cópias agora são vendidas por milhares de dólares

É uma tarde chuvosa de verão no Rio de Janeiro e Arthur Verocai está passando por dificuldades técnicas. O maestro brasileiro de 76 anos está ao telefone com sua equipe de produção. No final do dia, ele tem que imprimir, assinar e enviar um documento para a Louis Vuitton, que o contratou para marcar seu último show. Só assim ele será pago. O correio já está a caminho. Mas a impressora não está funcionando. E Verocai, tensa, não encontra caneta. “Eu odeio essas burocracias”, diz ele, enquanto caminha pelo seu espaçoso apartamento na zona sul da cidade.

verocai 2 Quando a impressora finalmente cumpre e o documento é entregue, Verocai coça o bigode grisalho, joga o corpo alto e magro no sofá da sala, pega o violão e diz ao fotógrafo: “Juro que não entendo por que você quer para tirar minha foto. Eu não sou tão importante.” Um quadro na parede de sua sala conta uma história diferente. É um cartaz de um show do Verocai em Los Angeles, em março de 2009, acompanhado por uma orquestra de 30 músicos, com convidados como o baterista Ivan “Mamao” Conti, o falecido tecladista José Bertrami (ambos do grupo de samba jazz fusion Azymuth) e o percussionista Airto Moreira, e DJ set de apoio de Madlib. “Esse foi um dos melhores shows que LA já viu”, disse o produtor Cut Chemist à NPR.
Naquela noite foi a primeira vez que Verocai tocou seu álbum de estréia auto-intitulado ao vivo e na íntegra. Originalmente lançado em 1972, quando o Brasil estava sob a ditadura militar, oferecia uma mistura única de jazz, funk, soul, samba e bossa nova, e mostrava os sublimes arranjos orquestrais de Verocai, que já o haviam visto trabalhar como arranjador com nomes como Jorge Ben. Mas o álbum desapareceu rapidamente, pouco promovido por sua gravadora, Continental Records, e ignorado pelos críticos.

 Desiludido, Verocai abandonou sua curta carreira musical. “Comecei a pensar que era loucura ter feito um disco assim naquela época”, diz ele. “Afinal, eu era um arranjador e ninguém se importava com arranjadores fazendo discos.” (Sua situação, nesse sentido, reflete a do arranjador dos Beach Boys, Van Dyke Parks, cujos primeiros álbuns solo foram notórios fracassos comerciais.) Ele passou para a publicidade. “Fui trabalhar com jingles – anúncios para tudo, de caminhões a comida de gato. O dinheiro era bom, mas eu sabia que ninguém naquele ambiente estava interessado na música que eu fazia. Acho que foi por isso que acabei ficando lá. Eu queria fugir de mim mesmo.”
 O álbum Arthur Verocai esgotou-se e desapareceu das lojas, e seu autor continuou a fazer arranjos para outros artistas, embora cada vez com menos frequência. Mas aos poucos, a lenda do álbum cresceu entre colecionadores e DJs. Décadas depois, uma cópia do original foi vendida por US$ 2.000. Em 2003, a obra-prima de 29 minutos foi relançada pela gravadora americana Luv N' Haight Records. Foi assim que artistas de hip-hop como Ludacris, MF Doom e Little Brother o descobriram, sampleando suas faixas e tornando o álbum e seu autor uma preocupação cult.

 Esse show esgotado em Los Angeles foi anunciado sob o nome Timeless e filmado para um lançamento em DVD dirigido por Brian Cross. “Estar lá foi muito emocionante”, diz Cross. “Parecia que a força do que foi feito em 1972 no Rio ganhou um novo conjunto de pernas. Arthur sentiu, Mamao, Airto, Bertrami, todos sentiram. Eles eram como um grupo de jogadores de elite se movendo juntos. MF Doom apresentou Arthur naquela noite, o que foi selvagem, pois Arthur não tinha ideia [de quem ele era]. Sabíamos que algo foi liberado no ar naquela noite que realmente poderia ajudar as pessoas a ouvir o gênio do que ele havia feito.”

 Ajudou Verocai também: era a primeira vez que ele ouvia as músicas de seu debut realizadas da forma como ele as havia imaginado. “Eu não ouvia esse disco novamente há anos”, diz ele.

Na década de 1960, Verocai era estudante de engenharia civil. Formou-se em 1968, “mas não trabalhou muito na área”, conta. “Em vez disso, escolhi construir música.” Ele começou a tocar bossa nova aos seis anos de idade, e depois estudou com Roberto Menescal, uma lenda do gênero. Ele conseguiu sua primeira chance como arranjador aos 21 anos – para a cantora brasileira Leny Andrade – depois de ser visto apresentando seu trabalho em festivais de música, e logo foi muito requisitado. Escrever seu álbum auto-intitulado ao lado do letrista Vitor Martins lhe ofereceu liberdade em comparação com trabalhar para outros artistas e cumprir briefings comerciais – embora a liberdade fosse condicional devido ao regime militar do país.

“Foi feito em tempos difíceis no Brasil, quando muitas letras foram censuradas pela ditadura”, diz Verocai. “Então, para evitar problemas, o Vitor teve que usar muitas metáforas nas letras. [O título da música] Presente de Grego significava que a ditadura era um cavalo de Tróia para o Brasil, um presente ruim. E Pelas Sombras era sobre a forma como a polícia secreta do governo agia nas sombras, escondida do público, prendendo pessoas. Era como camuflar nossos sentimentos. Mas para mim, eu só queria fazer a melhor música que pudesse.” Tudo se encaixou, diz ele, quando entrou em estúdio com alguns dos melhores músicos brasileiros dos anos 70 – Paulo Moura, Nivaldo Ornelas, Hélio Delmiro e Oberdan Magalhães. Ele cumpriu suas próprias ambições, diz ele, “mas ninguém percebeu naquela época. Então aquele show em Los Angeles trouxe uma sensação incrível de profunda satisfação.”
O renascimento de seu trabalho levou Verocai a fazer mais música. Em 2002, lançou de forma independente o álbum Saudade Demais, seguido cinco anos depois pelo Encore pelo selo londrino Far Out Recordings. Em 2016, o álbum No Voo Do Urubu (pelo selo japonês Kissing Fish, posteriormente reeditado pela Light in the Attic) contou com convidados como Seu Jorge e Mano Brown e foi lançado com grande aclamação nacional. Naquele ano, ele também fez a música para a cerimônia de encerramento dos Jogos Paralímpicos Rio 2016.
“Nunca vi ninguém como Verocai”, diz Menescal. “Ele sempre fez seu trabalho com discrição, avançando, às vezes sem ninguém saber. Muitas vezes, cheguei a pensar que ele havia abandonado tudo. Mas, claro, ele não tinha.”
No Rio, ainda está chovendo. Verocai me leva à cozinha para fazer um café. Ele diz que este apartamento é grande demais para ele. “Casei novamente em outubro do ano passado e nos mudamos para cá. Mas infelizmente nos separamos um mês depois e acabei sozinho nesse lugar enorme. Pensando bem, talvez tenha sido um erro. Acho que estou velho demais para essas aventuras.”

Mas não musicalmente. Sua atividade recente é aventureira e conecta os pontos entre Verocai e os artistas que influenciou. Em janeiro, ele fez o arranjo deslumbrante de Tyler, a trilha do criador para o desfile póstumo do estilista Virgil Abloh para a Louis Vuitton na semana de moda de Paris. Verocai trabalhou recentemente no último álbum da superstar do samba brasileiro Marisa Monte, colaborou com a banda australiana de jazz-funk Hiatus Kaiyote – que planejou uma mini-turnê ao Brasil em 2019 apenas para conhecer Verocai pessoalmente e gravar uma música para o álbum de 2021 Mood Valiant – e arranjou quatro novas músicas do grupo de fusão canadense BadBadNotGood para o álbum Talk Memory.
Seguem-se as colaborações com Flor Jorge, filha de Seu Jorge, e Zeca Veloso, filho mais novo de Caetano Veloso, e com uma das estrelas mais misteriosas da música, mas não pode dizer quem. "Eu assinei um acordo de confidencialidade", diz ele, baixando a voz.
Há também mais novas músicas solo. Verocai abre seu computador e me toca algumas músicas novas para seu próximo álbum de estúdio, com lançamento previsto para o ano que vem. Enquanto ouvimos, ele ocasionalmente acompanha as gravações na guitarra. Truira e Ajuste de Contas são lindos e edificantes, enquanto Bilheteiro tem o sabor de jazz funky dos Head Hunters de Herbie Hancock.
Verocai voltará a apresentar seu álbum de 1972 em São Paulo ainda este ano para comemorar seu 50º aniversário. “Vou convidar alguns convidados, vai ser uma boa festa”, diz. Haverá um álbum ao vivo, além de um documentário para a televisão brasileira. “A ideia é homenagear Verocai, um gênio ainda subestimado em seu próprio país”, diz o diretor Leonardo Fiorito. “Mas não queremos nos limitar ao registro de 1972. Queremos mostrar como ele ainda está ativo hoje, ainda tocando as pessoas.”
O baterista do BadBadNotGood, Alex Sowinski, é um deles. Ele diz que nunca esquecerá a primeira vez que ouviu a música que Verocai escreveu para a música City of Mirrors. “Eu tive que voltar e tocá-lo de novo e de novo para começar a compreender o que eu estava ouvindo. É picante, vivo e cria emoção que atinge a alma.”

“Uau”, diz Verocai quando conto a ele o que Sowinski disse. "Ele realmente disse isso? Faz-me sentir tão bem. É tão revigorante trabalhar com as novas gerações. É isso que me faz seguir em frente.”

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Arthur Verocai’s 1972 album sessions. Photograph: Fernando Bergamaschi; used courtesy Now-Again Records

 

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