1999

OUTUBRO

Primeiro tributo digital: CD Onde É Que Está o Meu Rock’n’Roll?  — Arnaldo Baptista Revisitado Novamente

1999

Pela capa deste CD independente, é evidente o apego do produtor aos tempos de Arnaldo como o “rosto bonito” da Patrulha do Espaço. A primeira foto à esquerda causava certa discrepância com o design digital do projeto visual, o que levou o produtor a sobrepor uma imagem maior de Arnaldo, quase escondendo a foto original. Para mim, aquela imagem inicial era provocativa e inquietante, refletindo as marcas do rosto e os traços de uma época intensa.

Sonoramente, o CD funciona como um panorama das canções da Patrulha do Espaço, compondo 33,33% do tributo, gravado integralmente em Brasília. Entre as músicas incluídas, destacam-se: "Sexy Sua", "The Cowboy", "Trem", "Sr. Empresário" e "Imagino".

Segundo a simbologia presente na obra dos Mutantes, Deus é quem conduz tudo, e foi por “designação divina” que o power trio Nata Violeta abriu o tributo com "Sexy Sua". A faixa é uma explosão de adrenalina, desprovida de teclados, mas carregada de energia. Em seguida, "The Cowboy" mantém a força da versão original, agora com um toque texano na voz e uma pegada contemporânea. "Trem", da banda Ligação Direta, resgata o espírito preguiçoso e profundo do blues, evocando sua origem nas ferrovias, com um trabalho de guitarra que homenageia o guitarrista John-John.

"Sr. Empresário", uma faixa inédita, revisita o Arnaldo dos tempos de twist e surf music, superando o hard rock da versão original com uma abordagem mais fluida. Já "Imagino" é uma recriação autodidata nos primeiros passos de Sylvio Júnior no teclado. Aparece como uma gravação minimalista e intrigante, evocando o funk de maneira discreta e quase fantasmagórica. Nessa faixa, o guitarrista Sylvio J do Pravda mantém fielmente a linha de contrabaixo da versão original, preservando a essência da composição.

O produtor deste CD buscava incorporar a pompa e a complexidade dos arranjos dos Mutantes, contrastando com a crueza dos tempos da Patrulha do Espaço. Admirador dos anos 70, ele propôs uma abordagem distinta do tributo paulista Sanguinho Novo. No entanto, uma vez em campo, as diferenças entre os projetos se diluem. O resultado é um equilíbrio entre o rock cru e visceral da Patrulha do Espaço, a grandiosidade dos Mutantes e a trajetória solo de Arnaldo Baptista, iniciada ainda na infância, aos sete anos, com a composição de “Dança de um Outro Tempo”.

Este tributo é, sem dúvida, uma homenagem complexa e multifacetada a um dos maiores gênios do rock brasileiro. 

Paralelo entre os dois tributos de 1989 e 1999 

Sanguinho Novo (Paulista) e Onde É Que Está o Meu Rock’n’Roll? (Brasília) — revela não apenas diferentes abordagens estéticas, mas também uma relação com o legado de Arnaldo Baptista e dos Mutantes que varia conforme os contextos regionais e as influências musicais locais.

Sanguinho Novo (1989), tributo paulista, reflete a cena pós-punk de São Paulo, com uma abordagem mais cru e direta. As faixas de Patrulha do Espaço são reinterpretadas por bandas como Sexo Explícito, Último Número, e Akira S, com uma sonoridade agressiva, minimalista, que flerta com o experimentalismo. A exploração do som, com guitarras saturadas e timbres agudos, e o uso de elementos como percussão manipulada e sampler, mostram uma intenção de desconstruir e reinterpretar a música de Arnaldo Baptista de maneira visceral, mantendo um vínculo com a irreverência e o espírito rebelde do rock paulista. No caso de "O Sol", por exemplo, o Sexo Explícito adota uma guitarra forte e saturada, enquanto o Último Número dá uma eletricidade emocional à balada "I Fell in Love One Day". Akira S, por sua vez, apresenta uma versão experimental de "Sanguinho Novo", com o uso de sintetizadores e sampler, incorporando elementos da música eletrônica e da experimentação sonora.

Já Onde É Que Está o Meu Rock’n’Roll? (1999), tributo brasiliense, se alinha com o desejo de revisitar as raízes do rock brasileiro com uma abordagem um pouco mais reverente, mas igualmente ousada. Gravado integralmente em Brasília, este tributo se distingue por sua tentativa de capturar a grandiosidade dos Mutantes, contrastando com o peso cru da Patrulha do Espaço. Faixas como "Sexy Sua", "The Cowboy" e "Trem" mantêm o espírito da versão original, mas também buscam uma nova interpretação, que mistura o hard rock com elementos de texano, blues e funk. A recriação de "Sr. Empresário" e "Imagino" traz uma renovação do som, ao mesmo tempo que resgata a complexidade dos arranjos da banda Mutantes. Neste tributo, a reverência pela obra de Arnaldo Baptista se faz mais explícita, com uma vontade de homenageá-lo de forma mais polida, sem perder a energia dos anos 70, mas distanciando-se um pouco da crueza e do experimentalismo de Sanguinho Novo.

Conclusão do paralelo:

Ambos os tributos reconhecem a importância de Arnaldo Baptista e dos Mutantes, mas de formas distintas. O tributo paulista (1989) se afasta da estrutura tradicional e adota um estilo de musicalidade mais abrasivo, dadaísta e experimental, alinhado com a estética pós-punk de São Paulo. Já o tributo brasiliense (1999) busca explorar a grandiosidade do som dos Mutantes, com um olhar mais reverente e ambicioso, enquanto ainda preserva o espírito de liberdade criativa da época. Ambos, porém, são registros importantes de como Arnaldo Baptista influenciou e continua a inspirar diferentes gerações de músicos, seja com a irreverência do rock paulista ou a busca por algo mais grandioso e estruturado em Brasília.