HÁ 40 ANOS O PINK FLOYD MOSTROU, À SUA MANEIRA, QUE RAIVA É ENERGIA COM INJUSTIÇADO E SUBLIME 'ANIMALS'
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Há 40 anos o Pink Floyd mostrou, à sua maneira, que raiva é energia com o injustiçado e sublime “Animals”
Yahoo Notícias Regis Tadeu / https://www.yahoo.com/news/ha-40-anos-o-pink-floyd-mostrou-a-sua-maneira-que-raiva-e-energia-com-o-injusticado-e-sublime-animals-184836180.html
25 jan. / 2017 - O impacto já começava pela capa, uma das mais espetaculares da história do rock, a ponto de ter se tornado tão icônica quanto a de tantas outras que lembramos imediatamente dentro da discografia dos Beatles, Rolling Stones, Black Sabbath, Led Zeppelin e de quem mais você imaginar. Não havia o nome da banda, muito menos o título do álbum. Nem precisava. Sabíamos – não me pergunte como! – que estávamos diante de um novo álbum do Pink Floyd.
O singelo violão na faixa de abertura, “Pigs on the Wing (part 1)”, e no início dos mais de dezessete minutos da faixa seguinte, “Dogs” nos dava a impressão que o clima acústico da canção “Wish You Were Here”, que batizou o álbum anterior, lançado dois anos antes, seria o fio condutor do disco. Ledo engano. A partir do momento em que a bateria de Nick Mason entrava, mesmo que com a delicadeza de sempre, já dava para notar que a atmosfera seria muito diferente da previsível. Tal impressão era sacramentada pelos primeiros dos espetaculares solos que David Gilmour espalhou ao longo da canção. Com as letras nas mãos, então, tudo era mergulhado em um poço de raiva melodiosa e explícita ao mesmo tempo. A alternância de climas, os latidos de cães, a atmosfera sombria conduzida pelo piano elétrico e demais teclados de Rick Wright e a voz repleta de ironia de Roger Waters… Tudo ser transformava em um pesadelo etéreo e sombrio ao mesmo tempo.
Quando a gente virava o LP – sim, era assim que funcionava naqueles tempos -, “Pigs (Three Different Ones)” continuava a nos assombrar de um modo diferente. Éramos jogados em um caleidoscópio lisérgico inesperado, repleto de referências ao estado de idiotice e ganância que nos rodeava – e ainda rodeia, caso você não tenha percebido. Enquanto Wright espalhava seus timbres tenebrosos, Waters cantava e tocava seu baixo como se fosse um Chapeleiro Maluco pronto a nos seduzir com seringas contendo doses de LSD muito cáustico, enquanto Gilmour tratava de cortar nossa alma com seus solos que mais pareciam navalhas afiadas. Não havia saída. Era impossível levantar a agulha do disco e não ouvir a canção até o seu final. Onze minutos de um suplício embriagante e viciante…
A viajante introdução de “Sheep” era uma espécie de “ratoeira” para o ouvinte. Wright usava seu piano elétrico como isca para nos jogar posteriormente em um abismo sem fundo, repleto de guitarras distorcidas, órgão Hammond fumegante e agressivo, baixo “na cara” e letras cantadas com sarcasmo desconcertante. Tudo para desaguar em um final apoteótico. Ou apocalíptico, dependendo do entendimento e da percepção de cada um… O final/retorno ao início com “Pigs on the Wing (part 2)” era o supremo amálgama de ironia, sarcasmo e alerta pretendido em cada sulco de Animals.
Daquilo que The Dark Side of the Moon se tornou a partir de seu lançamento em 1973 – uma ode à loucura que existe em todos nós – para a homenagem explícita a Syd Barrett em Wish You Were Here, lançado dois anos depois, o Pink Floyd alcançou a respeitabilidade que todo artista desejava. Só que isso se tornou um fardo pesado demais para o quarteto. Na cabeça deles – de Waters, principalmente – era preciso romper com a vassalagem dos fãs e da imprensa. Era necessário usar a amplitude do sucesso para abrir os olhos e mentes para o pesadelo que se pronunciava já naquela época. A liderança de Waters nesse sentido já era clara na música do grupo e se tornaria incrivelmente explícita no álbum seguinte, o mítico The Wall, que seria lançado também dois anos depois.
Isso explica porque Animals – explicitamente inspirado em um dos mais desconcertantes livros de todos os tempos, A Revolução Dos Bichos ("Animal Farm"), de George Orwell, uma feroz crítica ao stalinismo da União Soviética escrito ao final da II Guerra Mundial – foi um dos melhores exemplos de que o chamado “rock progressivo” poderia soar tão cortante quanto qualquer canção de dois minutos de uma banda punk. Pena que pouca gente sacou isso, a ponto de tantos anos depois o álbum continuar a ser delegado a um injustiçado segundo plano dentro da cena musical de todos os tempos.
Quatro décadas depois, ainda dá tempo de você se redimir…