UVA: Memórias de 40 anos atrás (1982)
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A UVA reunida nas paredes da padaria da QE 34
Acima: Bodão, Pedrão, Mancha, ? e Ricardinho
Agachados: ?, Carlito, Elias, ?
UVA: Memórias de 40 anos atrás!
por Mário Pazcheco
UVA, um grupo ligado à cultura, da QE 34. A casa de ideias, que começou em 1973, e se espalhou pelo Brasil.
Em seus caminhos, tudo: bicicletas, super-8, skate, e acampamentos, motos, rock, girls, noites, pôsteres, camisetas, mocassins, macacões jeans, guitarras, bandas de rock e viagens ao Nordeste...
Era a nossa vitrine, uma espécie de "q
Celeiro de artistas e craques de futebol.uartel general".
No início, ficávamos em pé e encostados na parede de tijolos vermelhos da padaria da QE 34. À noite, erámos revistados pelo Estado – de armas em punho. Depois comíamos frango assado com Velho Barreiro. No roteiro, vários filmes e concertos de rock: as primeiras viagens para outros estados e galáxias.
Fama?
Experimentávamos uma certa fama, porque a UVA aparecera em 1973! Aglutinávamos estudantes das asas e viajávamos pelos eixos. Éramos conhecidos.
Chaguinhas tinha filmado um Super-8. Mancha imprimiu a primeira camiseta com estampa que eu vi, de Led Zeppelin e Jesus Cristo. Pedro Veras tinha um traço próprio, e Joel de Oliveira era artesão; Gaspar era professor de matemática, Zé Otávio cuidava da horta, e da orientação política; Eli Mendes pilotava a Tt branca.
Outubro de 1983, conjunto O da QE 34
Guará Rock City
Vim de Osasco (SP) para Taguatinga Sul. Vila Dimas, Vila Matias, e Sapolândia, na Shis Sul. Morei próximo à Praça do DI. Estudei na Escola Classe 23 e no CTN. Morei também na QNJ 5 (Shis Norte).
Taguatinga era mais urbana, gostava de bailes blacks, curtia Gérson King Combo. O rock era cultuado por uns caras mais velhos, ligados em Black Sabbath*.
Em 1978, cheguei ao conjunto C, QE 34. No dia do velório do pai do Ricardo Muniz, futuro amigo. Sem saber do ocorrido, eu ouvia o Superstars do Rock, a faixa Whole lotta love. Ela explodia pelas caixas. Nasciam as minhas amizades mais duradouras.
Minha chegada ao Guará fora marcada pelo início da falência do meu processo educacional. Neste ano, eu "tomaria pau".
A diferença entre Taguatinga e Guará estava nas pessoas. No Guará, o pessoal era mais receptivo, e não tinha protocolo para entrar nas casas das pessoas.
O mais estranho para mim era aquelas pessoas (os pais e as mães) serem receptivos às nossas loucuras. Além de apoiarem, participavam.
Nossas loucuras eram divididas entre os conjuntos C e O da QE 34.
Dona Luci (RIP) e Dona Catarina eram dispostas a participar, e ainda liberavam as suas casas para as nossas festas, que atravessavam noite adentro.
Praça da QE 34
– Conhece aqueles dois? – Não...
"Zé Boguinha" e Sérgio "Zulu", um negão atarracado, que costumava fechar a mão em concha e, com os dedos duros, cutucava o ombro dos outros, e perguntava: – E aí, figurinha?!
Diariamente curtiam o entardecer, um chá das 5, numa parada de ônibus (deserta).
Uma tarde, "Zulu" apareceu pra pegar a bola emprestada. Nem preciso dizer que o meu mundo caiu. (Pelo portão de casa entravam os convites para as grandes encrencas.)
– Por que aquelas bermudas pintadas a caneta?
Houve uma moicana – que queria usar o banheiro, usou, e comentaram: – Olha o cabelo daquela coitada!
(...)
Da esquerda: "Peixe" (dono da banca de HQs), Pedro Veras, Mancha e o Antônio, o "Padeiro"
Detalhe:Led Zeppelin III era o que estampávamos em nossas camisetas
Rock Baby
Eu estava "largado", sem trabalhar ou estudar: qualquer festa começava pelas minhas mãos.
Era sábado, eu de bobeira na Vidraçaria da 32. Joel e Eli apareceram: – Precisamos de uns pés de mandioca para um caldo...
Descemos à chácara e pedimos ao caseiro que nos apanhasse os pés de mandioca para o caldo.
Nesta noite especial, vários presentes vieram de todos os cantos da cidade para Isabela! O berço ficou cheio.
As engrenagens daquela festa compartilhavam momentos intrasferíveis. Históricos!
Andariam juntos por toda a eternidade...
No meio do som, eu levei uma fita gravada ao vivo do Extremo. Quando eles chegaram, os recebemos tocando a fita.
Para falar a verdade, era meu aniversário também. Eu completava 20 anos!!
Naquele tempo, pelo telefone, em rápidos contatos com Gama, Sobradinho, Taguatinga e Cruzeiro, vários amigos vinham para o rock!!
Jantávamos um mexido na mesma panela. – Um estranho fenômeno: o Plano Piloto começava a frequentar as festas no Guará.
Um pouco mais tarde ocorreu o Rock Baby, uma tentativa de integração roqueira entre o Guará I e o II. Com a presença do Extremo. A festa terminou em baixaria, por causa do tal caldo de mandioca.. (Pode?...!) – O fato foi que, então, foi formado o Psicose Crônica. O fato é que eu preferi curtir as primeiras festas de reggae de Brasília. Houve também o Reação Cultural. Tudo na QE 32. Intercâmbio dos roqueiros, a aurora do Heavy Metal, na cidade.
Hoje isso tudo parece ingenuidade, mas pode procurar qualquer um nas quadras, na redondeza, que contam os detalhes das festas da UVA, regadas a Velho Barreiro, Chapinha e frango assado. Todo mundo sentado no chão, comida mexida na mesma panela, mais pão quente, vodca, show de rock.
Jornal do Rock, número 05 - março/abril de 1983
No cinema
Exibições de Jimi Hendrix por Sganzerla. Woodstock. Monterrey Pop. Rock É Rock Mesmo. No Galpãozinho, Escola Parque, Cine Brasília, Gama.
Na Cultura Inglesa, final de agosto de 1980, eu assisti a Help! Nesta mesma sala, uma semana depois do assassinato de John Lennon, em dezembro, Alucinados do som e da guerra. Em 1981, julho, Magical Mistery Tour, Galpãozinho. E no mês seguinte, setembro, o inesquecível Rock Cerrado!
Em abril de 1982, na QE 32, na semana em que abri o fã-clube dos Beatles, realizamos uma homenagem a Bob Marley. Foi quando passamos nossa primeira noite na cadeia. Saímos então no Jornal Correio Braziliense, em duas oportunidades.
Três meses depois, ocorreu a primeira apresentação da Legião Urbana. Neste show, a coisa mais marcante é que conheci o trio Extremo, de hard rock. Nos próximos 18 anos, estaríamos juntos.
Neste mesmo 1982, no mesmo Guará, aconteciam aqueles EMGs ("Encontro de Músicos do Guará"). Eu mesmo fui a dois, e conheci o professor e escritor Lincon Lacerda, a pessoa que mais compareceu às apresentações de arte no Guará.
Na 302 Sul, na Livraria Cultura, o livreiro Ivan "Presença" exibia alguns clipes dos Beatles no telão. A gente assistia...
Taguatinga. Uma sexta-feira 13. Fomos assistir uma temporada de rock na Rua do Sorvete Sem Nome. O Fernandez, vestido de "vampiro", estava de porteiro. Quando entrávamos, o pessoal da banda disse "Estão conosco". E Fernandez, com cara não-muito-satisfeita, respondeu: "Pô, só tem convidados!..."
Assim eram aqueles tempos. Eu também tinha que colar em alguém – para voltar para casa.
No Conic, frequentávamos o Jegue Elétrico. Folheávamos livros americanos da contracultura, que pertenciam à loja do Ary Pararraios, o nosso anfitrião, e comprávamos discos independentes.
Joel de Oliveira e Narcisa Fonseca foram os primeiros a comprar discos diretos da Strawberry Fields, a produtora de Belo Horizonte, do Marco Antônio Araújo. Nós o vimos, com Grupo, no Teatro Nacional, Sala Martins Penna, em 1985!
Culturalmente, estes foram os acontecimentos iniciais e mais marcantes desses 29 anos e seis meses de pão, circo & rock Tellah lançava o Continente Perdido.
Plebe Rude – em cima do caminhão – no Chaplin.
Barão Vermelho, no Autódromo.
Robertinho 'Heavy' de Recife na Escola Parque.
Show do Venom e Exciter!
Concerto do Liberdade Condicional na Concha Acústica.
Akneton no Teatro Nacional.
Vários shows do Marciano Sodomita na cabeça.
Exposições de fotografia nas passagens subterrâneas para as superquadras.
Foto de: Leonardo Saraiva
Sábado, 5 fev. / 2012 – Disfarçados & mocados... Ou a volta dos que não foram...
De óculos escuros, Prof. Zé Otávio; Mário Pazcheco; Eli Soares: um triângulo de 34 anos de amizade!!!
Da UVA ao ingresso no mercado de trabalho.
Colaborações substanciais – desde os tempos imemoráveis dos zines!
Muitas histórias a se narrar...