Modulações da violência

Violência: carpinteiros e formões do universo

Violência

É Raul, Raul, Raul,

É Raul Seixas, é Lampião

Chegaram no FMI

Que nem tentou resistir

 

É Raú, Raú, Raú,

Lampião não anda só

Trouxe Deus e o diabo

Raul, a terra do soL 

 

Antes de passar, de maneira ultra simplificada, pelas idéias do sociólogo Judeu Norbert Elias, quero falar de um sujeito particular, que se autodenominou formão do universo. Ele existiu, ou teria existido, entre o início dos anos sessenta e os dias de hoje. Foi uma criatura peculiar. Não se conformava com as mais simples violências do dia a dia dos nossos tempos, do início do século XXI. As pessoas eram mais educadas nos anos 50, 60 e 70 do século XX, descobriu ele em suas pesquisas. Eram muito menos agressivas, lembra-se ele, que estando com quase meio século de vida, floresceu adolescência nos anos 70 e viveu as transformações relativas à violência ocorridas, principalmente, a partir de meados dos anos 80 e anos 90 afora. 

Carpinteiro do universo inteiro eu sou.
Carpinteiro do universo inteiro eu sou.

Não sei por que nasci
pra querer ajudar a querer consertar
O que não pode ser...”

[...]

Humm...Estou sempre,
pensando em aparar o cabelo de alguém.
E sempre tentando mudar a direção do trem.
À noite a luz do meu quarto eu não quero apagar,
Pra que você não tropece na escada, quando chegar.

Carpinteiro do universo inteiro eu sou.

[...]


Carpinteiro do universo inteiro eu sou (Ah eu sou assim!).
No final,
Carpinteiro de mim!

Carpinteiro do Universo  ( Raul Seixas e Marcelo Nova)

 

Ele chegou, em um dia do século XXI, à conclusão de que não estava próximo a imagem de “Carpinteiro do Universo”, tal como o personagem na canção de Raul Seixas e Marcelo Nova. Ele se sentia como o formão do Carpinteiro do universo. Deus e a humanidade, coletivamente e a longo prazo, moldam, em larga medida, nossas concepções e nossas condutas.

 


Norbert Elias teve a mãe morta em Auschwitz Como todo intelectual da sua época, que fosse judeu e estivesse em território dominado pelo nazismo, foi obrigado a sair pelo mundo, fugindo. Trabalhou na França, depois na Inglaterra e só foi ter seu Processo civilizador (1939) reeditado nos anos sessenta. A partir dos anos setenta esse sociólogo passou a provocar influências e debates entre historiadores franceses. Ainda hoje a penetração de seu pensamento sofre fortes resistências. 

 

Na idade média a faca era evitada à mesa, pois bastava um pequeno impulso para que um cidadão mediano comum, ou até de alguma corte, lançasse mão de uma lâmina para exterminar algum desafeto. De acordo com Norbert Elias, o grande Sociólogo Judeu nascido na Alemanha (, as coerções e limites antes impostos pela sociedade, foram, gradativamente, do final da Idade Média em diante, sendo transformados em mecanismos de auto-coerção, que passaram a ser transmitidos e assimilados na educação desde a mais tenra infância. Antes, tenra era a carne tocada pela lâmina do homem comum ocidental que não continha seus afetos, pulsões, impulsos sexuais e outros componentes de sua natureza.

Explico melhor: antes, na Idade Média, o indivíduo era retido pelo medo de ser punido, mais que nos nossos tempos. Eram as leis familiares, dos clãs, dos feudos e do Vaticano, vamos dizer assim, grosso modo, o freio de muitos atos bestiais que hoje um indivíduo razoavelmente educado pode, ele mesmo, controlar. Eu disse pode, pois tudo indica que algumas válvulas de escape “defeituosas” (humanas) estão soltando, em plena era dita Pós-moderna (ou Modernidade Tardia), afetos e pulsões de forma hedionda e violenta. Ações descontroladas saem da mão de indivíduos e grupos diversos.

Na dita Idade Média, um homem, antes de deixar explodir um impulso agressivo, era contido pelo medo da punição divina, papal, feudal, familiar e etc; quando era contido, é claro. Hoje essa violência, em larga medida, se comparada à suas manifestações no medievo (Idade Média), é contida por mecanismos de controle do próprio sujeito, por auto-coerções.

Se por um lado, os atos violentos pontuais, especialmente os individuais, sofreram, consideravelmente, essa evolução em sua forma de controle, antigamente, um único homem não tinha o poder de extinguir a humanidade inteira com o simples ato de apertar um botão! 

 

Olha faca!” (Domingo no parque – Gilberto Gil);

 Olha o dedo de Deus dizendo sim pro não [...] como será o dedo da mão/ de quem vai apertar/ o botão?” (Arrigo Barnabé e Hermelino Neder). 

 

Antes que se pense que o sociólogo estudava uma suposta transformação linear e impecável da violência humana (algo como um progresso da capacidade humana de conter violência, vou ressaltar que Norbert Elias abordou as falhas, os vazamentos, o caráter não uniforme e determinista do que ele nomeou “Processo civilizador”. Esses processos “evolutivos” acontecem quando “a maioria” das linhas apontam em uma determinada direção”. E os seriais Killer, os atos isolados e incompreendidos de violência que casamos de presenciar pela mídia (cometidos por indivíduos ou por grupos), as guerras que continuam a matar adultos e crianças, homens e mulheres, simplesmente para que mais armamento seja vendido, para que um território rico em petróleo seja dominado, ou por alguma outra razão bestial são evidências de que a humanidade caminha, ainda, sempre bestialmente ligada à violência. É uma transformação complexa, à qual não podemos abordar aqui; por isso remeto à leitura das obra de e sobre Elias. Aos mais animados, que vão às fontes acadêmicas da sociologia, recomendo procurar realmente os textos de e sobre Norbert Elias; muitos aproximam aspectos axiais do pensamento de Elias de aspectos fulcrais da obra de Michel Foucault. Por hora é só.

Sandro Alves Silveira. 

Nota: Sandro é Mestre em Teoria e História da Arte, VIS. Ida, UnB.

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