A tradicional crônica de Marcelo Torres
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"JK, ACM e o personalismo"
por Marcelo Torres
Pense num absurdo, e na Bahia haverá um precedente. A frase foi eternizada pelo ex-governador baiano Octávio Mangabeira.Ele que, em 1951, construiu um estádio, o estádio da Fonte Nova, e neste colocou seu próprio nome, abrindo um precedente.
Depois veio Roberto Santos, que construiu outro estádio, em 1979, e o batizou como Estádio Governador Roberto Santos, que o povo chama estádio de Pituaçu (nome do bairro).
Depois veio ACM, que construiu dez estádios pelo interior, sete deles com seu nome, dois com o nome do filhinho - Luiz Eduardo Magalhães - e o décimo em nome de um irmão.
Matéria de Eliano Jorge nesta quinta no jornal A Tarde informa que esses sete estádios davam a ACM o título de campeão nacional em nomes de estádio de futebol. Em segundo lugar vinha Juscelino Kubitschek, que curiosamente é outra sigla - há cinco estádios batizados de JK.
“Mas em 2009 ACM sofreu três perdas”, diz o repórter Eliano Jorge, "e acabou ultrapassado pelo mineiro, que soma cinco: em Paranoá-DF, Itumbiara-GO, Uberaba-MG, Manhuaçu-MG e Andradas-MG”.
Além dos estádios, essas siglas dão nome a mil e uma coisas. ACM era, na Bahia: escola, rua, praça, avenida, hospital e o'scambau. A coisa era de um jeito que este escrevedor certa feita ouviu o seguinte diálogo:
- Ô, Fulano, cê sabe o que é ICM?
- Claro que sei!
- E o que é?
- Intõe Carlo Magalhães.
ICM era Imposto sobre Circulação de Mercadorias, que depois ganhou um S (de Serviços) e ficou ICMS.
Mas em Brasília JK é mais: é rádio, é televisão, é faculdade, é ponte, é aeroporto, é barbearia, farmácia, pizzaria, lanchonete, o diabo.
Até um rato, vejam os senhores - um rato raro, diga-se - descoberto em Brasília na época da construção, até a esse ratinho deram o bendito nome de Juscelino. É mole?
O personalismo, sabe-se, não é nenhuma exclusividade desses dois homens, dessas duas siglas. O Mineirão, em BH, leva o nome do governador que o construiu - Magalhães Pinto.
No Brasil, cerca de 15% dos topônimos de cidades levam as marcas do personalismo: Governador Valadares, Florianópolis, Bento Gonçalves, João Pessoa, Petrópolis...
Há 26 cidades cujo primeiro nome é Presidente: Presidente Getúlio, Presidente Vargas, Jânio Quadros, Castelo Branco, Tancredo Neves, Nereu, Olegário, Prudente, Figueredo e adjacências.
Temos duas cidades chamadas Presidente Dutra e outras duas Presidente Médici. Agora, acreditem, existem no Brasil dois municípios de nome... Presidente Kennedy.
Temos também, é claro, duas cidades com o nome de Presidente Juscelino, uma fica em Minas, obviamente, e a outra é do Maranhão, onde também não poderia deixar de ter um município chamado Presidente Sarney.
Ainda em Minas, teve uma cidade que, como não podia mais ser Presidente Juscelino - pois já existiam duas homônimas - foi batizada como Presidente Kubitschek.
Lê-se na Wikipedia que alguns habitantes usam o nome antigo - Tijucal - e que pessoas de outras cidades se referem a esta com uma abreviatura depreciativa - "Preku".
Na Bahia, graças a Deus e ao Senhor do Bonfim, ACM não deu nome a nenhuma cidade, deixou para o filhinho - Luiz Eduardo Magalhães, que também emprestou o nome ao aeroporto de Salvador, antes chamado Dois de Julho.
A sigla do terminal aéreo, no cadastro internacional, permaneceu SSA, mas bem que poderia ser ALÉM - Aeroporto Luiz Eduardo Magalhães.
Apesar de a Bahia ter seus absurdos, no dizer do Governador Mangabeira (outro nome de município), os filhos da cidade de Luiz Eduardo Magalhães não podem ser chamados ACM-Netos.
Se bem que, na capital, a maioria hoje prostra-de diante da TV Bahia (da família do mandachuva) e de mãos espalmadas reza para ACM Neto, o novo santo Salvador.
Porque as siglas, meus senhores - as siglas e o personalismo - também deixam suas marcas, suas viúvas, seus netos. E seus seguidores, obviamente.
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