The Living Clocks - The Flowers of Evil (2001): Barbieri faz uma releitura dos poemas de Charles Baudelaire

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The Living Clocks
The Flowers of Evil (2001)

Barbieri faz uma releitura
dos poemas de Charles Baudelaire

por Antonio Celso Barbieri

The Living Clocks (Os Relógios Vivos) foi um projeto musical criado em Londres, por mim, Antonio Celso Barbieri, em 2001. A ideia principal foi criar um veículo para que pudesse expressar-me musicalmente mixando, a voz falada com “loops” de bateria, percussão, instrumentos acústicos e eletrônicos e, ao mesmo tempo bebendo de todas as minhas influências em termos de estilos musicais, indo do Rock ao Pop passando pelo Clássico, Música Étnica, etc.

Barbieri e Charles Baudelaire

Lá pelo começo dos anos 80, encontrei o trabalho do poeta Charles Baudelaire pela primeira vez. Foi a primeira vez que tomei conhecimento do livro As Flores do Mal. Na época, devo confessar que achei sua poesia muito obscura, mórbida e complexa. Eu não tinha ainda a inteligência suficiente para apreciar este trabalho. Desde então, o livro As Flores do Mal tornou-se um desafio pessoal.

Passaram-se muitos anos para que eu tivesse a oportunidade de enfrentar dos demônios do Baudelaire novamente. Neste álbum que vocês estão tendo a oportunidade de ouvir, juntamente com o ator Zadoque Lopes, pude brincar livremente com a forma e o conteúdo, sentindo-me livre para adaptar o texto e até em alguns casos omitir algumas estrofes para encurtar a música. Cabe notar que, uma vez que alguns poemas não foram usados na sua totalidade, para ser justo com Baudelaire e também para que o leitor tenha uma visão mais completa da obra deste grande poeta, incluí em texto, o poema todo no encarte do CD. Aliás, também é importante salientar que o livro As Flores do Mal contém quase uma centena de poemas dos quais, escolhi apenas 10 para incluir neste álbum. Portanto, ficarei muito feliz se este trabalho motiva-lo à fazer uma visita à biblioteca ou livraria mais próxima ou visitar o website do Sr. William A. Sigler.

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Zadoque Lopes e Barbieri em cartão postal especialmente criado para o lançamento deste CD

No álbum The Flowers of Evil a poesia de Charles Baudelaire recebe uma visão modernista e ganha nova vida! Imagino este trabalho como sendo um teatro, sem as luzes onde a única coisa sensorial é o som, a voz e a música. Trata-se de uma casa com muitos quartos onde o ouvinte encontrará à cada canto uma alma perdida discutindo um assunto desagradável. São assuntos que nunca desaparecem, estão sempre presentes vivendo nos recantos sombrios da nossa mente. É a morte, o diabo, o tempo, o inimigo, etc. A poesia de Baudelaire é realmente sombria, diabólica e pode colocar nossos sentidos em cheque!”

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Charles Baudelaire (1821-1867) foi um poeta francês do século 19. Baudelaire foi também tradutor, crítico de arte e crítico literário. No entanto, ele é mesmo muito famoso por ter escrito o livro Les Fleurs du Mal (1857 – As Flores do Mal) que, é considerado por muita gente como sendo talvez uma das mais importantes coleções de poesias publicadas no século 19

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The Flowers of Evil (As Flores do Mal)
Incluindo, na primeira faixa, entrevista com o ator Zadoque Lopes


Barbieri comenta o álbum The Flowers of Evil (As Flores do Mal) faixa por faixa

01. To the Reader (Para o Leitor)
O livro começa com um poema endereçado ao leitor chamado "To the Reader" (Para o leitor). Neste poema procurei mostrar a dualidade bem/mau. Onde uma voz calma contrasta com outra diabólica. Ao mesmo, tempo quis mostrar a voz maligna como se fosse a voz de um ditador fazendo um discurso inflamado. Sempre achei que Deus e o Diabo são os dois lados da mesma moeda. Os dois, na verdade, são um só, apenas uma força que pode tanto ser usada para o bem como para o mau. No fundo nós somos o Deus e o Diabo. Está tudo aqui na Terra e dentro da nossa cabeça. No final desta poesia, Baudelaire escreve: "Você sabe, leitor hipócrita e criatura sem sensibilidade, meu irmão leitor,  parecido comigo, meu gêmeo!"

02. Yet Not Satisfied (Ainda Não Satisfeito)
Este poema fala de um ser apaixonado por um amante que ele não consegue satisfazer. A interpretação vocal começa apaixonada e vai ficando desesperada até culminar com a exclamação: "…demônio sem piedade faça com que a chama não suba tão alto. Eu não sou Stix para agarra-la e acende-la nove vezes! Eu não posso, sua libertina, quebrar o seu espirito ou fazer o seu desespero sublime! No inferno da sua cama tornei-me Prosperine." Nota: Coloquei a palavra "Brasil", subliminarmente, no meio do ritmo. Veja se você consegue ouvi-la?

03. The Clock (O Relógio)
Como esta música fala do "tempo" que, como um "relógio, sinistro, um Deus inatingível, que aterroriza, que com um dedo ameaçador diz: lembre-se…", achei apropriado marcar o tempo com o som da marcação de um relógio e, ao mesmo tempo, criei um tipo de mantra, uma textura sonora tentando remeter o ouvinte para a milenar Índia, um lugar, à meu ver, onde até parece que o tempo parou.

04. For Ever the Same (Para Sempre o Mesmo)
Acho que fui muito feliz nesta música. Tinha acabado de assistir o filme O Gladiador dirigido pelo diretor Ridley Scott e, no DVD havia também um documentário feito com o compositor da trilha sonora. Fiquei sabendo então que algumas das vocalizações meio árabes tinham sido feitas pela vocalista da banda Dead Can Dance. Aliás, uma banda que escutei muito. A ideia de incorporar ritmos marciais com elementos clássicos sempre me interessou. Depois de assistir o filme e o documentário fiquei inspirado e criei esta música. Imaginei um exercito romano marchando. Este som do bumbo, que marca o tempo, é o meu prefiro e já o venho usando à anos. O trabalho de edição é minucioso e cada palavra é ajustada no tempo de forma precisa e individual. O eco foi colocado também individualmente, palavra por palavra. O poema fala de angústia e tristeza e começa com "de onde, me diga por favor, esta estranha tristeza vem, subindo como o mar sobre pedras negras e nuas…"

05. Get Drunk! (Embriague-se!)
Baudelaire, neste poema, propõem que "deveríamos ficar bêbados, que é a única coisa que importa, uma necessidade imperativa, para não sentirmos o peso do tempo, um peso que nos quebra os ombros e nos curva…" Portanto achei apropriado que nesta interpretação o ator, dentro de um bar, começasse recitar o poema sóbrio e, o terminasse bêbado.

06. Music (Música)
Nos dias de hoje, sempre que discutirmos a fusão da voz falada com música, naturalmente o estilo musical conhecido como Rap virá à nossa mente. Portanto, achei interessante a ideia, quase impossível, de juntar a poesia de Baudelaire com Rap. Na verdade pedi para o Zadoque Lopes imaginar que ele era um negro com todos os maneirismos de um Rapper. Pedi para ele baixar um pouco o tom da sua voz. Então, nós dois ficamos andando e gesticulando pelo estúdio como se fossemos membros de alguma gangue perigosa.  Foi muito divertido :-)

07. The Vampire (O Vampiro)
Eu queria que este vampiro fosse um vampiro da Transilvânia, com aquele sotaque cheio de "R"s. Minha ideia com este poema foi fazer uma homenagem aos antigos filmes B, aos Dráculas deste período e, ao ator e Bela Lugosi em particular. Realmente fiquei com pena deste vampiro apaixonado: "…humilhe minha alma para fazer dela sua cama e domínio. Estou preso ao seu buraco raquítico como está um prisioneiro às suas correntes, como um jogador está às suas cartas, como os vermes estão à um corpo em decomposição, na sua garrafa eu sou um bêbado! lhe desejo a danação, que você seja para sempre amaldiçoada!".

08. The Bad Enemy (O Mau Inimigo)
Como parte da preparação para gravação desta música, assistimos novamente o filme Amadeus dirigido pelo diretor Milos Forman. O filme é uma adaptação da peça de Peter Shaffer que mostra a carreira do compositor Wolfgang Amadeus Mozart em oposição à inveja e ódio de Antonio Salieri um compositor sem a mesma virtuosidade de Mozart. Então, nesta música o ator procura emular Salieri na sua revolta.

09. Obsession (Obsessão)
Eu gosto desta música porque ela é nervosa e, parece lutar contra as forças da natureza. "Grande florestas vocês me assustam como catedrais vocês uivam como orgãos. E nossos corações de miséria, salas de eterna tristeza…"

10. Dance of Death (Dança da Morte)
Este poema, desde o principio, sabia que seria pesadíssimo. Portanto deixei-o para o final. No poema a morte vem buscar uma pessoa e, ela em desespero descreve o que vê. Imaginei alguém caminhando à noite em algum lugar deserto e sendo agredido com uma paulada pelas costas. Um tipo de acidente ultra violento e desnecessário, patético mesmo. O ferido é levado para o hospital, indo direto para a UTI. O som do equipamento que o mantém vivo, marca o tempo da música que passa a fazer um contraponto com o som dos passos da morte que se aproxima. Quando, neste dia, o ator Zadoque Lopes chegou para a sessão de gravação, tratei-o de forma muito fria e seca. Disse que tinha pensado muito e estava realmente insatisfeito com o trabalho dele. Disse que estava pensando em jogar todo o trabalho já feito, de meses, no lixo. Zadoque foi ficando cada vez mais tenso e indignado. Fui cada vez mais, colocando defeitos no trabalho dele. Percebi que ele estava quase para explodir e, desafiei-o que o fizesse. O homem ficou louco e começou gritar. Então eu falei: "Você está pronto! Pode interpretar o texto agora!". Ele percebeu rapidamente que tudo não passava de uma jogada psicológica minha mas, agora já era tarde demais e, ele já estava totalmente emocionalmente abalado. No final Zadoque colocou toda a sua angústia e frustração na interpretação deste poema. Ele ficou tão nervoso que, até chorou no meio das gravações. Foi cruel mas funcionou. Depois pedi desculpas e lhe dei uma xícara de chá :-)

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The Convict Prison (detalhe em azul), uma pintura de Van Gogh

Ficha Técnica

The Living Clocks é Antonio Celso Barbieri (Teclados, Sampling, Sequenciador e Direção Teatral). Artista Convidado: Zadoque Lopes (Ator, Voz).

Toda a trilha sonora foi composta por Antonio Celso Barbieri exceto The Dance of Death que, foi baseada na introdução da música Read to Rise do álbum The Tribal Tech, composta pela banda brasileira Cortina. As traduções dos poemas de Charles Baudelaire para a língua inglesa foram usadas com a permissão do tradutor, Sr. William A. Sigler. Este álbum foi Masterizado em Londres no Hiltongrove Multimedia por Graeme Hardie. Todas as músicas foram teatralmente dirigidas dirigidas, gravadas e produzidas por Antonio Celso Barbieri no seu estúdio chamado Raw Vibe Studios em Londres, no inverno de 2001. A Capa é também de autoria de Barbieri e inclui no encarte um detalhe, em azul, de uma pintura de Van Gogh chamada The Convict Prison.

Quero deixar aqui meu grande agradecimento ao Sr. William A. Sigler por permitir que suas traduções fossem usadas neste projeto.

Translations from William A. Sigler subjected to copyright©1999. All rights reserved.

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