Folia e tropicalismo

 

Folia e tropicalismo*
(Tom Zé)

Três Caravelas navegam ao comando de Zé Midas. O ovo de Colombo dá samba

PELO TELEFONE

Tem fase na vida que todo mundo gosta de você. Eu agora também sou daqueles que adoram Zé Miguel Wisnik e acho que nada de sério no Brasil deveria ser feito sem consulta-lo: nem a Constituição Federal, nem as calcinhas das mulheres. Pois, foi Zé mesmo quem deu a idéia para o show que faço com Itamar Assumpção e Luis Tatit hoje, lá no Teatro do Sesc-Pompéia, às 21 horas, como parte do Tropicália 20 anos, que se prolonga até novembro. “Eu faço” é força de expressão.

Na verdade, eu pego (ou evoco) a chamada “linha evolutiva” e empino duas pipas: Tatit e Itamar. Mas o show se chamará Três Caravelas, isto apesar de a “linha” não ter conseguido amarrar o avião em que Arrigo (a terceira caravela) viajou para ensinar trinados dodecafônicos aos belgas. (Espera-se uma futura geração de canários “evolutivos”.)

Diretor do show: Wisnik.

Mas Zé Miguel, amado por Deus e a humanidade, não tem tempo pra nada. E, como nós não lhe dispensamos a colaboração, ele teve mesmo de orientar os ensaios meus com Tatit e Itamar... mas o fez pelo telefone. Já que “Pelo telefone”, de Donga, foi o primeiro samba gravado no Brasil, pode-se dizer que, na atual fase de Zé Midas Wisnik, tudo em que ele bota a mão “...dá samba”.

(Pelo amor de Deus, amigo revisor: é Zé Midas Wisnik mesmo.)

O fato é que hoje em dia, no monte em que Wisnik tropeça, nasce uma fonte/que dança promove/no gosto das Musas./E uma das  nove/ritmando cria/aquilo que o nome/será Poesia.

Nasce rabo.

O Sesc fará um Baile Tropicalista hoje também, com Paulinho Boca de animador e um show de Frank Soriano, que no Nordeste se traduz Waldick. O baile terá todas as características das noitadas do Dancing Avenida, onde em 1968 foi lançado o Lp "Tropicália". Sobre o funcionamento de um dancing daquele gênero, consultei o editor Corisco, músico nos velhos tempos. Informou-me ele que o Avenida estava fechado havia muito, mas me aconselhou a procurar Wilson Sândoli, que é entendido na matéria e poderia ajudar-me.

Vocês sabem que Sândoli é o presidente da Ordem dos Músicos do Brasil, mas, como ele anda sempre de paletó, gravata e óculos escuros, isso lhe dá um aspecto de professor de ciências ocultas. Pois bem, sem mais aquela e em plena luz do dia, os rapazes do Sesc invadiram o escritório do homem (que é freqüentado pela sensível e desconfiada classe musical do Interior) e se puseram a perguntar sobre “ornamentação para táxi girls, etc”... E ainda estranharam muito, quando foram postos de lá pra fora com seguranças, ameaças e descomposturas.

(Oh! Sândoli, me perdoe! O culpado fui eu que não expliquei aos rapazes que assuntos delicados como cantos de fada e prostitutas, quando se fala nisso de dia, nasce rabo!)

Errata 1) Na crônica passada, a distribuição espacial correta é: “...o camarim foi invadido pela Comissão do PT.”

2) Onde se lê “Três moças de braços dados”, leia-se “de braço dado”, expressão que não se ensina na Usp nem na Puc, mas cuja sonoridade eu prefiro. Quanto à fundamentação que deve aos filólogos, eu me oriento pela fusão com que a amizade anula a alteridade, tornando o plural um absurdo “ad nauseam”.

 

*ORIGINALMENTE PUBLICADO NO ‘O ESTADO DE S. PAULO’ – 1987.

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