ROCK INVADERS (DOM 14 SET 15H 2025)

 

Do Próprio Bol$o: memórias de um festival independente

Jonas era um guitarrista magnífico. Tinha guitarras importadas – uma Gibson e uma Fender – e um arsenal próprio de equipamentos: amplificador, pedestal, microfone. Mas o que mais chamava atenção não era o som, e sim o comportamento. Ninguém podia encostar em nada do que era dele. Enquanto os outros se viravam com violão plugado direto na mesa, Jonas esmerilhava a guitarra em seu set exclusivo. Brilhava, mas fazia questão de criticar todos os que não atingissem seu nível.

Com o tempo, parecia querer transformar o festival em palco particular: ele, seus amigos e, de quebra, churrascadas que me roubavam os sábados e domingos. Fui podando. Deixava-o de fora do flyer, resolvia a aparelhagem por conta própria. A turma já não suportava o estrelismo do nosso “guitar hero”. Décadas depois, Jonas ainda me cobrou:
— Você nunca mais me chamou.
Respondi apenas:
— É... você não tinha um espírito muito agregador.

Não foi só com ele. A Banda Presença também vivia em dilema de afirmação. Sempre que eu anunciava uma data, inventavam uma desculpa: “não podemos nesse dia”. Na primeira vez até aceitei, mas logo percebi o jogo. Nunca mais mudei uma data. O que estava no flyer, valia. Não demorou para começarem a obedecer.

Entre 1996 e 1999, os primeiros anos do festival contaram com a aparelhagem do duo psicodélico Além. Passaram por ali bandas como Todas as Tribos, Terno Elétrico – com Jean Paice na bateria – e Lu Blues. As noites de sábado eram especiais e a festa começava já na sexta. Mas, em 2000, a morte do guitarrista Cécé levou o festival a um hiato de seis anos. A aparelhagem foi parar na Bahia. Resistimos em casa, entre festas embaladas pelo blues de Zezinho Blues, de Lu Blues e pelo Skaravelho, com Rubão na bateria.

A retomada veio em abril de 2007, quando o Do Próprio Bol$o completava 25 anos de ação. Robson Gomes, da Barbarella, sugeriu juntar nossas aparelhagens. Foi o que fizemos. Eles foram os primeiros a tocar nesse novo ciclo, com Marian Camelo. A estrela da noite foi Renato Matos. A partir dali, os festivais se abriram ao público. Já são 18 anos de portão aberto.

É difícil manter um festival do próprio bolso com devoção, dedicação, fé e determinação. O Do Próprio Bol$o já abrigou mais de 200 artistas. Nunca permiti que alguém fosse afastado por questões políticas ou afetivas. Nunca aceitei panelinhas. Nunca deixei que fosse usado como trampolim para interesses alheios. Se isso é bom ou ruim, não sei. Só sei que é assim que se constrói um festival respeitado – e que tem a sorte de ver seus convites aceitos pelas bandas.

Desde 2007, considero o Do Próprio Bol$o o ato mais cultural do Guará. Digo isso sem vanglória, apenas como quem guarda uma memória viva.

Articles View Hits
12756502

We have 1399 guests and no members online

Download Full Premium themes - Chech Here

София Дървен материал цени

Online bookmaker Romenia bet365.ro