Por
que?
Por
que Glauber não passa na tevê?
Por que Glauber não passa na tevê?
Por que Glauber não passa na tevê?
(Mário
Pacheco*)
Glauber
Rocha dizia de Brizola: "Devia vestir um camisolão,
e descer num candomblé como todo o povo brasileiro, fumar
um charuto, beber uma cachaça como todo o povo brasileiro.
Entrar num barato. Não pode ficar fazendo política
no Leblon".
Ou
de Gabeira: "Quando eu estava em Cuba ele me chamou propondo
a minha morte, vá assaltar um banco e morrer que a revolução
precisa do suicídio do cineasta Glauber Rocha".
Depois
de perambular pelos 7 cantos do mundo (Cuba, Europa, Estados Unidos,
Oriente Médio), o "brasileiro ilustre" volta
para ficar, quem sabe decidido a encontrar a paz que só
descobrimos na morte ou reencontar a paixão pelo cinema
descolonizado.
"Eu
vim para confundir...". Outubro de 1976, filma o velório
do pintor Di Cavalcanti, sob uma onda de indignação
familiar e olhar perplexo dos presentes.
"Filmar
meu amigo Di morto é um ato de humor modernista-surrealista
que se permite entre artistas nascentes. Fenix-Di nunca morreu.
No caso, o filme liberta de sua hipócrita trágica
condição...".
27
de março de 1977, morre sua irmã, Anecy Rocha, que
caiu acidentalmente no poço de um elevador. A família
Rocha se caracterizou pela força e pela tragédia,
mas essa dor foi demais para Glauber, recém chegado, deixando
o cineasta abalado e completamente transtornado, começava
seu isolamento e distanciamento do pensamento cinematográfico
e da realidade brasileira.
"Eu
e minha irmã não nos vendemos à corrupção
da tevê, mantivemos as nossas posições políticas
e ideológicas fora das posições dominantes.
Anecy era uma mulher livre e digna, que se recusava a fazer novela.
Estão dizendo que eu estou louco, pelo fato de não
poderem compreender a minha dor. Eu tenho um cadáver dentro
de casa e o próximo será o meu". Glauber Rocha.
Pulamos
para 1979. Local: dependências do Hotel Nacional, que aquela
altura, quase deserto, sequer dava sinais de que ali estavam hospedados
os convidados do XII Festival de Brasília do Cinema Brasileiro.
"Visionário, profeta Glauber Rocha perambulava por
acaso pelo hotel, já que não tinha sido sequer convidado,
quando avistou num canto o cineasta francês Jean Rouch.
Exaltando-se, rapidamente Glauber declarou aos berros: "Este
festival desmoraliza a cultura brasileira e virou um prostíbulo
da pornochanchada. A única coisa que esses cineastas fazem
é pegar o dinheiro do governo para filmar o traseiro da
Sônia Braga!". ("Dama da lotação").
Disse isto ao mesmo tempo em que acusou Jean Rouch de ser um agente
colonizador, deixando o francês sem ação.
Glauber havia acabado de concluir seu último filme, "A
Idade da Terra", que nos fica como herança reveladora
do que se passava na sua cabeça naquele tempo, último
meteoro arremeçado por Glauber nas telas antes de sua morte,
um filme que poucos assistiram até o fim.
"Foi
admirável que, praticamente morrendo, Glauber soube renovar
suas concepções, renunciar às ostentações
de vanguarda, para privilegiar antes de mais nada o prazer do
público. Pena que ele faleceu sem poder fixar numa película
essa sua nova visão hedonista do cinema". (Sylvie
Pierre).
Na
manhã do dia 22 de agosto de 1981, falece em Botafogo.
Causa mortis: septicemia embolias pulmonares múltiplas,
o choque bacteriano. O jornal francês "Le Monde"
anuncia em primeira página, o novaiorquino "Village
Voice" creditou-lhe "profunda influência no cinema
internacional por seus ensinamentos, seus escritos e seus filmes".
Francis Ford Coppola lastimou sua morte e a revista francesa "Cahier
du Cinéma" telegrafou à viúva, Paula
Gaetán. As homenagens e apreços confirmaram mais
uma vez, seu prestígio e fama internacionais.
Quatro
anos mais tarde esta data seria salutar. Sarney previsto por Glauber;
o artifície da Nova República, rende homenagens
com direito à discurso e tudo para um homem de cinema.
Atestando a importância que tinha Glauber para a vida cultural
e política do Brasil. Finalemnte essa era a imagem que
ele queria ter e não ser mais visto como: "o paladino
da revolução ou do 3º mundismo cinematográfico,
mas como um mestre da matéria sonora e visual, que realizou
belos e imensos afrescos num momento crucial da história
do cinema". (Sylvie Pierre).
A
pergunta se impõe: por que Glauber não passa na
tevê?
*Texto
originalmente publicado no fanzine Rock'n'roll News nº
19 - Ano VII - (Glauber Rocha Edição Especial) out./nov./dez-1989.
**Este
foi o último fanzine ... e espelhava o futuro... Eu havia
acabado de sair da folhas do JOSÉ (Jornal da Semana Inteira),
cursava Estudos Sociais e tinha acabado de entrar para o GDF.
Audaciosamente, eu sonhava com livros e outros tormentos utópicos...
ASSISTA
NESSA SEMANA!
Bad
movie ou saudades
do Maciel
Necrólogio
de um gênio (Rogério Sganzerla)